Certo dia, na loja de flores de sua mãe, Jorge Lima, ainda com 8 anos, ficou penalizado com a poda que sua genitora realizava sobre os diversos vasos, cortando as folhas que começavam a ficar amareladas e tombadas. Cada tesourada que ela desferia sobre a indefesa planta, lhe cortava o coração. Passou a recolher tais folhas do saco de lixo. Usando guache verde, pintava-as e as enterrava nos fundos do quintal, longe dos jardins que sustentavam a família. Inexplicavelmente, estas folhas perduravam erectas por mais algumas semanas, antes do suspiro final. Sua mãe incentivou seu gosto pelas plantas, ervas e assemelhadas. Ele começou a criar arranjos em vasos pintados em casa. Ofertou vários às colegas de escola. Formou-se em Botânica e casou-se com Margarida.
Após diplomado, participou de concurso público para a área de defesa ambiental. Foi trabalhar no interior do Estado, onde após 5 anos, comprou um razoável sítio e deu vazão ao seu amor pela Natureza, cuidando de todo tipo de vegetação e várias espécies de animais silvestres. Sua casa passou a ser atração turística, tal a beleza e harmonia do local. Com o dinheiro arrecadado nos ingressos, ajudou a embelezar vários jardins de vizinhos de menor poder aquisitivo. Nas horas vagas, dava aulas na escola pública do município, onde incutia nas crianças, o espírito de preservação da flora e da fauna. Com ajuda de seus alunos, recuperou diversas árvores pelas praças e estradinhas da região. Criou uma entidade de defesa das espécies vegetais. Congregou milhares de pessoas, inclusive de localidades vizinhas. Tornaram-se fiscais contra desmatamentos e queimadas criminosas. Na coluna do jornal local, denunciavam, cobravam e pressionavam as autoridades, que não tinham como evitar de penalizar os infratores. Tal atitude começou a incomodar fazendeiros e derrubadores de árvores. Jorge foi jurado de morte.
Em certa noite chuvosa, ao sair da escola, Jorge pegou sua bicicleta e iniciou o trajeto para casa. Não se deu conta do furgão que passou a segui-lo pela estrada barrenta. Após se afastarem do centro da cidade, o motorista do furgão se ajeitou no banco, guardou a folha com o mapa onde estava indicado o ponto do “acidente” a ser consumado. Apagou a luz da cabine e fechou o cinto de segurança. Acelerou o veículo com a intenção de abalroar a bicicleta na próxima curva e lança-la no precipício de quase 200 metros.
Quando estava a menos de 30 metros do alvo, um potente raio iluminou o vale e atingiu uma das árvores que fora recuperada no último mês e se oferecera como voluntária para defender seu protetor. Ela desabou imponente e heróica sobre o caminho, fazendo com que o utilitário se precipitasse pelo espaço vazio. Jorge não ouviu o som da queda do veículo, pois o estrondo do ruidoso trovão, envolveu a região por quase 5 segundos.
Haroldo P. Barboza – Andaraí – março / 2000