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Contos-->Um Conto Universitário -- 28/12/1999 - 12:38 (Fabio Almeida Lopes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ela veio andando e era impossível não admirá-la. Havia algo sobre ela… Não eram seus cabelos castanhos: muito comuns, apesar de belos. Talvez seu corpo, o movimento de suas curvas dançando como uma naja ao som da flauta de seu encantador. Não, não era bem isso. Seus olhos eram estonteantes, duas pequenas e misteriosas esferas negras, profundas como a noite, impenetráveis como o mais forte dos castelos, encravadas em seu rosto pálido. sim, seu rosto era impressionante, mas não o suficiente para causar todo aquele frenezi. Ainda havia algo sobre ela… Ou melhor, não havia algo: ela era algo. Ela—

— Rapaz, que monumento!
Com seu conciso comentário Gustavo interrompeu o devaneio de Daniel. Apesar de não apreciar o estilo direto do amigo, ele teve que admitir que tinha razão: ela era um monumento. Surpreso, Daniel permanece calado, seguindo a moça com o olhar por todo o corredor enquanto ela se perdia na pequena multidão que se espreme na direção da saída do prédio da Faculdade de Ciências Sociais. Novamente seu pensamento foi descontinuado por Gustavo:
— Quem será ela?
Diria que seu amigo lera seus pensamentos, se não o achasse estúpido demais para tanto.
— Você já a havia visto por aqui?
— Ahn? Não… Quer dizer, de quem exatamente você está falando? Diz Daniel, disfarçando como pode a atenção dispensada à garota.
— Aquele avião que deu um rasante bem aqui na nossa frente. Você não a viu?
— Vi, sim… Não, não vi… Responde, ainda pensativo.
— Viu ou não viu?! Exalta-se Gustavo.
— É claro que sim — responde o outro, saindo definitivamente do transe causado pela visão — e aproveitei para responder a outra pergunta: não a vi antes de hoje. Acho que é alguma nova caloura.
— Por quê? Pode ser uma veterana que não conhecemos.
— Elementar, meu amigo: ela é muito jovem para ter entrado aqui antes de nós; além disso, ela é mulher: você a conheceria, talvez já até tivesse ficado com ela.
— Faz sentido, mas pode ser que eu não me lembre do fato. Não dá para lembrar o nome de todas quando se tem tantas pretendentes como eu. Aliás, ela é até familiar…
A imodéstia de Gustavo não era exagero. Era um bonito garotão de 21 anos, bem apessoado, rosto másculo, corpo trabalhado não por academias mas pelos quilômetros de corrida, natação e bicicleta que o triatleta perfazia ao longo de sua semana. Não bastasse sua aparência para chamar a atenção do público feminino, Gustavo era simpático ao extremo, extrovertido e divertido, causando delírios em suas colegas de faculdade e ciúmes nos namorados destas. Ciúmes, aliás, bem fundados, pois era um inveterado conquistador: em um ano de vida acadêmica tivera incontáveis casos, inclusive com professoras e até alunas casadas. Só não fora descoberto porque tem a malandragem no sangue: Gustavo é filho de cariocas.
A miúda figura a seu lado contrastava Gustavo como as casas de um tabuleiro de xadrez: Daniel era alguns meses mais novo que seu amigo mas se lhe dava 16 ou 17 anos sem dificuldade. Pequeno e magro, os pêlos de seu rosto teimando em não nascer lhe conferiam uma aparência quase infantil, eterno efebo. Criado por sua avó, Daniel é de uma educação ímpar, porém seu tratamento é distante, sem envolvimento. Entristecido e reprimido, tornou-se tímido, tendo no colega dos tempos do Ginásio um de seus únicos amigos.
Se Daniel não encontrara muitos camaradas pela vida, tivera ainda menos amores. Porém, aquela pequena senhorita que vira agora há pouco o fez sonhar. Seu amargo coração permitiu-se alegrar, imaginando cenas de uma inocente paixão que pretende cultivar com ela. Mas, quem seria ela? Não importa, afinal ela era a pessoa que há tanto procura, disso tem certeza. Por isso—
— Ô Daniel, não está me escutando, não? Diz Gustavo, batendo no ombro de seu suposto interlocutor.
— Para falar a verdade, não. Estava pensando… no trabalho de sociologia — responde com uma desculpa esfarrapada.
— Estou dizendo que tenho certeza de não ter ficado com essa aí. Mas pode apostar que vou mudar esta situação em breve.
O outro jovem sentiu-se quase desmaiar. Não poderia ser: será que teria que disputá-la com Gustavo? Quem ele pensa que é para chamar a mulher de sua vida de “essa aí”?! Não, ele não a merecia. Por mais que tenha apreço ao amigo desta vez o enfrentaria. Até porque sabe muito bem que aquilo é fogo de palha, desejo de momento, não possui sentimento.
— Será mesmo? Ela tem cara de poucos amigos — continua após uma pausa perceptivelmente alongada.
— Tenho certeza, amigo. Afinal de contas, você ainda tem dúvidas se o meu charme é irresistível? Vangloria-se o rapaz, enrolando o braço em torno do pescoço de Daniel, por brincadeira.
Com o rosto comprimido contra o peito do amigo, Daniel apenas sorriu. Em qualquer outra ocasião concordaria, pois sabia mesmo do que Gustavo era capaz. Todavia, desta vez seria diferente pois seu opositor não seria a fraca força de vontade do sexo frágil nem algum namorado ou marido propenso a ser traído: desta vez seria ele, Daniel de Castro Faria, seu adversário.


O dia seguinte trouxe à Faculdade um Daniel muito menos confiante. Por sorte às quintas-feiras Gustavo não estava matriculado nas mesmas classes, pois até o mais desatento dos mortais perceberia o desânimo do jovem.
A mudança de humor deveu-se à reflexão noturna que fizera sobre a situação. Ainda que pretendesse se enganar, sabia que seu oponente levava vantagem em praticamente todos os aspectos considerados no jogo da conquista: beleza, simpatia, lábia, experiência. Seu grande trunfo, a inteligência, era de seu conhecimento que não se tratava de ponto crucial. O mesmo valia para o fato de seu sentimento ser verdadeiro. A única arma que lhe sobrara era a paciência.
Porém, concluiu, caso se demorasse, Gustavo tomaria a frente e aí não haveria a menor chance. Nenhuma mulher que tivesse alguma esperança com seu amigo lhe daria atenção. Sua opção se resumia a partir para o ataque, o que ia contra suas próprias características.
Daniel ainda meditava sobre esse impasse quando alcançou a porta da sala de sua primeira aula da manhã, vinte minutos antes do horário. Invariavelmente chegava cedo a seus compromissos. Como quisesse buscar ainda uma resposta para seu dilema, largou seus materiais sobre uma cadeira e retornou ao corredor, dirigindo-se ao bebedouro. De cabeça baixa sentiu a aproximação de uma pessoa. Esta tocou em seu ombro e disse:
— Com licença, você pode me infor—
Ao ver que se tratava de ninguém menos que a moça que vira na véspera, Daniel começou a tossir, engasgado com algumas gotas de água que desviaram de direção no justo momento em que ele pôs os olhos naquela figura angelical. Recompondo-se, conseguiu erguer-se e um sorriso surgiu-lhe sem perceber.
— Você está bem? Perguntou a moça, sem muita convicção em uma resposta positiva.
— Estou, sim. Está tudo ótimo — conseguiu dizer, ainda tossindo. Você havia perguntado…?
— Estou procurando algo para comer, mas a lanchonete está fechada. Não quero entrar comendo na sala. Você sabe onde pode ter algum quiosque aberto por aqui?
— Você é caloura, não é? Pergunta Daniel, quase involuntariamente.
— Sou. Estou dando muito na cara, né? Responde, acanhada, a jovem.
— Não quer chegar atrasada, está com vergonha de comer dentro de sala e nem sabe onde comer… — enumera Daniel, meneando a cabeça negativamente — Acompanhe-me, tem uma barraca aqui perto onde você poderá comer algo.
Após um rápido petit déjauner entremeado pela apresentação recíproca dos dois universitários, Daniel ficou surpreso ao notar que, no caminho de volta, manteve uma conversa animada e aparentemente interessante com sua nova amiga. Luciana, esse era o seu nome, era tudo o que imaginara: simpática, meiga, educada. Os quinze minutos em que estiveram juntos foram suficientes para transformar em paixão arrebatadora a chama surgida no dia anterior.
A jovem também gostara da conversa. Fez várias perguntas sobre Daniel, agradeceu-lhe a presteza e a companhia e despediu-se com um singelo beijo no rosto à porta de sua sala.
O jovem com aparência de poeta romântico permanecera olhando para a pesada porta metálica mesmo depois de Luciana fechá-la atrás de si. Quando percebeu o ridículo da situação, enrubesceu. Olhou primeiro para os lados para ver se ninguém o vira daquele modo e depois, aliviado, conferiu o relógio de pulso. Atrasado! Quinze minutos, considerando o tempo até sua turma.
Naquele dia não se incomodara em perder o horário. Entrando na sala, percebeu os olhares espantados de seus colegas, mas nada o aborrecia. Aquele acaso acontecido aqui acabava de restabelecer sua confiança. A sorte lhe dera a oportunidade que precisava e, naquele momento, sentia-se capaz dos feitos mais ousados. Ainda assim, um apenas lhe bastava: conquistar o coração daquela que o seu roubara.


— Ora, ora, ora... Se não vejo meu amigo Daniel papeando pelo corredor com uma caloura.
De longe Gustavo avistara o colega conversando animadamente com a garota que viram dias antes. Logo percebeu que aquela não era uma conversa de pessoas que acabaram de se conhecer, principalmente tratando-se do seu tímido camarada. Estranhou que Daniel não comentara nada sobre ela desde a primeira vez que a viram. Além disso, notou comportamentos diferentes nele ultimamente. Juntando os fatos, a conclusão lógica lhe surgiu como uma faísca.
— Cantando a moça na frente de todo mundo, hein? Que coisa feia! — disse, em tom de brincadeira, aproximando-se de ambos.
— Que é isto, Gustavo? Até parece... —protestou o outro, sem graça.
— E o que era tão divertido para você sorrir o tempo todo? — retorquiu, com o olhar já dirigido à outra presente.
— Só estava sendo simpático — desculpou-se — E você? O que faz aqui hoje?
— Precisava passar pela biblioteca, pegar uns livros. Aí resolvi passar por aqui para matar o tempo, um pouco. Foi então que peguei você com a boca na botija. — e continuou, emendando, sem permitir qualquer resposta — Aliás, onde está sua educação que ainda não nos apresentou?
— Gustavo, esta é a Luciana, uma caloura de Economia; Luciana, meu amigo Gustavo, terceiro período de Administração. —resmungou Daniel, como que entregando o cordeiro ao lobo.
— Muito prazer, Luciana.
— O prazer é meu, Gustavo — disse simplesmente a jovem, que conservara-se muda até aquele momento.
— Tenho certeza disto — falou, com um sorriso enigmático.
— De quê?
— Do prazer que minha presença causou em você — completou, explicitando.
Gustavo sabia que aquela frase causara irritação em Daniel, mas este teve que se conter, pois antes que pudesse entrar novamente na conversa com uma resposta à sua investida, Luciana e ele haviam caído em risadas após alguns outros gracejos seus. O diálogo que travou com a recém apresentada desenvolveu-se apenas entre eles, excluindo o outro rapaz, que limitava-se a sorrir de vez em quando e a concordar quando lhe perguntavam algo. Porém, menos de cinco minutos depois de chegar, Gustavo anunciou sua partida.
— Por quê? Perguntou Luciana.
— Tenho que ir treinar. Dez quilômetros de corrida ainda antes do almoço.
— Nossa! Que disposição!
— Como é que você acha que eu mantenho este corpo? Sentado estudando é que não dá, né? — e com mais esta frase pouco modesta, virou-se e foi embora.
Passados alguns instantes, depois que o atleta se afastou, a garota retomou a conversa primeiro:
— Simpático esse seu amigo...


— Alô? Gisele? É o Daniel, tudo bem?
— Tudo. Quero dizer, mais ou menos… Estou com um problema.
— Lembra aquela menina de quem lhe falei?
— Isso, isso mesmo. Pois é, acho que vou desistir. Não tenho a menor chance.
— Um outro pretendente, não. O pretendente.
— Gustavo Alves Barbosa, quem mais?
— Não, não sabe. Óbvio que não contei a ele.
— Porque não fará a menor diferença: você não o conhece como eu. Ele iria rir e dizer a ela na primeira oportunidade.
— Até ontem, não. Mas hoje o Destino fez com que ele me visse conversando com a Luciana. E você conhece o Gustavo: gavião como ele, tendo uma oportunidade, dá o bote.
— Não, foi bem rápido, mas já foi o suficiente para se tornar o assunto de nossa conversa em seguida.
— O de sempre: de onde nos conhecemos, de como ele é simpático, se ele é um bom atleta. Só faltou perguntar se tinha namorada…
— O Gustavo? Ah, ele ficou com aquele jeito dele, soltando piadinhas, abraçando-a, elogiando-a e se vangloriando.
— Ela achou o máximo, pelo que pude perceber. Eu acho que—
— O quê?! Perdeu o juízo, Gisele? Claro que não!
— Porque eu não tenho a menor chance. Simples, não?
— E se eu tentar eu vou apenas me frustar e, no máximo, perder a amizade do Gustavo.
— Deixa. É melhor que tenha sido agora. É a vida: quem nasceu folha não deve sonhar com a flor.
— Não se preocupe, Gisele. Só queria conversar com alguém. Obrigado.
— Tchau.


Vários dias se passaram e Daniel continuava firme em sua decisão de não mais se aproximar de Luciana. Contudo, quis o Destino que se encontrassem novamente, apesar do jovem evitar passar pelos locais em que pudesse encontrá-la. À saída do refeitório foi abordado pela protagonista de seu pequeno drama pessoal.
— Oi Daniel. Faz um tempo que não lhe vejo...
— É verdade. Sabe como é: trabalhos, provas. A vida de quem não é mais calouro já não é tão doce.
Apesar da frieza do comentário, a garota insistiu:
— Vamos sentar para conversar um pouco.
— Não dá... É que tenho uma reunião com um grupo para um trabalho de sociologia — desculpou-se. Odiava sociologia: talvez por isso sempre lhe vinha à cabeça quando precisava se dizer ocupado.
— Por favor, Daniel. Você não acha deselegante deixar uma dama sozinha? — perguntou com tom indistinto: deboche ou admiração? E continuou, um pouco mais séria — Onde foi parar toda a sua educação e cavalheirismo que lhe fazem tão peculiar?
Diante dessas perguntas, o rapaz, apesar de uma estranha sensação lhe dizer para se afastar, não pôde negar. Sentando-se, iniciou o diálogo, mais polidamente desta vez:
— Desculpe a pressa, Luciana. É o fim do período que se aproxima e as avaliações começam a se sobrepor. Mas, e você? Com está?
— Bem, mas preocupada com um assunto…
— E o que seria? — questionou Daniel, com uma ponta de esperança.
— Foi uma certa pessoa que conheci. Ultimamente tenho pensado bastante nele, mas não o tenho visto. Não sei direito as intenções dele, mas começo a desconfiar que as minhas não são apenas de uma amizade — disse a moça, com timidez em cada palavra.
Nesse momento, Daniel foi tomado por uma suprema angústia. Sabia que as frases que ouviria a seguir o magoariam, assim como também era de seu conhecimento que aquela doce senhorita ali sentada, a seu lado, estava caminhando rumo a um precipício: estava se apaixonando por Gustavo.
— Estou me apaixonando por Gustavo. Pronto! Agora já disse. O que eu faço, Daniel? Ele é um sonho de rapaz, lindo e simpático. Queria conhecê-lo melhor, mas ele está sempre tão ocupado… Nem sei se tem tempo para um relacionamento — disse com o alívio de quem se livra da mais pesada das cargas.
“Realmente ele não tem tempo para um relacionamento: ele sempre tem vários, simultâneos. Que o digam as duas moças com quem ele ficou o fim de semana passado, uma das quais foi parar num quarto de motel.”, lembrou Daniel, querendo revelar o que Gustavo havia lhe contado sobre suas aventuras da última sexta-feira. Pensou melhor e preferiu omitir: ela parecia estar muito convicta das qualidades de Gustavo para ser alertada de seu lado canalha—
— Daniel? Você está aqui?
— Ahn? Desculpe. Estava pensando na sua pergunta — respondeu, se livrando da situação com uma meia-verdade.
— Que pergunta?
— Se Gustavo tem tempo para namorar.
— E…?
— Acho que sim. O final do semestre está próximo, e nas férias vocês dois terão bastante tempo livre para se conhecer melhor.
— Mas ainda faltam três semanas!
— É um bom tempo para vocês irem se tornando próximos. — explicou e pensou: “e uma esperança de eu conseguir lhe convencer a sair dessa fria e esquecer esse canalha. Além do quê, se vocês não começarem nada nas aulas, provavelmente vão perder contato nas férias, pois é quando acontece a maioria das competições dos triatletas.”


— Que cara é essa, Gustavo?
— Nada, Bruno.
— Pra cima de mim? Você nunca fica sério, a não ser que seja algo muito grave.
— Não sei se devo dizer…
— Confie em mim.
— Promete que não vai contar para ninguém?
— Já disse, pode confiar em mim. Não vou dizer nada.
— É o Daniel. Olha, você jurou, hein?
— Eu sei. Continua, rapaz.
— Ele é um dos meus melhores amigos, mas está me atacando pelas costas…
— O que ele fez?
— Está dando em cima de uma garota em quem eu cheguei primeiro.
— E você está com medo de disputar com o coitado do Daniel?
— Não, se ele estivesse jogando limpo. Mas acontece que ele conversa mais com ela que eu e fiquei sabendo de umas coisas chatas.
— O quê?
— Ele mentiu, dizendo para a tal moça que eu estaria livre só nas férias, que é exatamente meu tempo mais ocupado.
— Não acredito!


— Como a gente se engana com as pessoas, não é Marcelo?
— O que é que você disse, Bruno?
— Que as pessoas nos enganam.
— Por quê você disse isso?
— Sabe o Daniel do terceiro período?
— Sei.
— Com aquela cara de santo, é o maior sacana.
— O que ele fez?
— Dando em cima da garota que outro viu primeiro e ainda mente pelas costas.
— E quem são as vítimas?
— Ela eu não conheço, uma tal de Lúcia, eu acho. Mas o mais revoltante é que ele está fazendo isso com o melhor amigo dele.
— Com o Gustavo?


— Eu tenho uma para lhe contar que você vai cair de costas, Fernanda.
— Fala logo, Marcelo!
— Sabe aquele Daniel que você acha tão “santinho”?
— O que é que tem?
— Está usando o golpe mais sujo conhecido.
— O que ele fez?
— Cantando uma garota que outro cara está a fim e fazendo a caveira dele para ela.
— Esse não pode ser o Daniel que eu conheço!
— Acho que ele se desesperou porque sabia que não teria chances com o outro garoto na disputa.
— E quem seria?
— Simplesmente o Gustavo.
— E o que ele disse exatamente?
— Não sei, quem me contou foi o Bruno. Mas eu conheço o tipo: deve ter dito que ele é um canalha, mulherengo, que vai colocar chifres nela…
— Nossa! Vocês são todos iguais. Não se salva um!


— Meninas, vocês não sabem da novidade!
— Que novidade, Fernanda?
— Aquele Deus grego que atende pelo nome de Gustavo está atrás de uma nova vítima!
— E onde está o fato novo?
— Ah, Gisele, você vai ser uma das maiores interessadas nessa estória…
— Quer dizer que nossa amiga Gisele estava de olho naquele gato?
— O quê?! Ora, poupe-me, Roberta.
— Não é isso, Roberta. O problema é que o Gustavo tem um desafiante.
— E…
— E…, Gisele, esse competidor é um grande amigo seu.
— Não tenho a menor idéia de quem você está falando.
— Tem certeza? Posso abrir o jogo, então?
— Fala logo, Fernanda!
— Calma, Roberta. É o Daniel.
— Há! Agora conta outra.
— É sério. Mas nossa amiga aqui pode confirmar.
— Eu não sei de nada, Fernanda. Os dois são amigos há muito tempo.
— O pior vem agora, Gisele: não só ele está tentando disputar com o Gustavo, como está tentando convencer a tal moça de que ele não presta.
— Eu mesma já ouvi dizer que ele não é flor que se cheire nesse assunto.
— Possivelmente você escutou isso do seu próprio amiguinho Daniel, Gisele.
— Olha aqui, Roberta: eu conheço o Daniel e sei que ele jamais faria isso.
— Está bem, Gisele. Vamos fingir que acreditamos. Mas, Fernanda, quem é a corda desse cabo-de-guerra?
— Uma caloura. Não lembro o nome. Sei que cursa Economia.


— Alô? Sim, é ele.
— Oi Gisele. Tudo bem?
— Por que “mais ou menos”?
— Sei. O que tem ela?
— Ela disse o quê?!
— Quem contou isso para ela?
— Deve ter sido aquele Marcelo. O que exatamente ela disse?
— Eu não acredito! É óbvio que eu nunca fiz isso. Apesar de tudo, o Gustavo é meu amigo. Ele bem que merecia que eu falasse um por cento das coisas que ele faz, mas eu não fiz isso.
— Que bom que pelo menos você acredita em mim. Mas acho que não há problema, quase ninguém da nossa turma conhece a Luciana.
— E o que há de mais em a Roberta conhecê-la?
— E agora? A essa altura ela já deve saber! Mas como essa estória se espalhou?
— Que hipótese?
— Será? Olha, Gisele, eu agradeço mas ainda acho que ele não seria capaz.
— Tudo bem você me convenceu: ele seria capaz. E, pensando melhor, ele seria o único interessado em divulgar isso por aí. Que Raiva! Meu melhor amigo apunhalando-me pelas costas! Ah mas isso não vai ficar assim, não. Ele pode ter acabado comigo, mas dessa vez ele não sai ileso, por mais ginga e molejo que ele possa ter.
— Ainda não sei ao certo. Mas com certeza vai ser algo forte o suficiente para tirar as chances dele.
— Eu serei cuidadoso. E paciente, claro. No momento certo Gustavo Alves Barbosa será atingido com tamanha força que passarão dias até que compreenda o que o acertou.
— Planejarei melhor, mas eu conheço seus pontos fracos, não se preocupe.
— Muito obrigado, Gisele.
— Tchau.


Nos dias que se seguiram, Daniel planejou e pôs em prática sua vingança.
O primeiro passo foi definir como atingir mais duramente seu futuro ex-amigo: optou por fazê-lo fracassar em sua conquista, trincando assim para sempre seu orgulho de cristal.
Em seguida, arquitetou a maneira de fazer chegar ao conhecimento de Luciana as estórias de conquista de Gustavo, através de uma rede de contatos para que seu nome ficasse o mais distante possível dos ouvidos da destinatária de sua mensagem.
Por fim, contando com a ajuda de Gisele, espalhou pela faculdade alguns dos casos mais inacreditáveis do colega, como aquele em que foi tirar dúvidas com a professora de psicologia na casa desta e, com a desculpa de que estava muito tensa, aplicou-lhe uma “massagem” com tamanha eficiência que toda a turma obteve notas excelentes na prova do dia seguinte.
Ao contrário do que esperava, porém, seus esforços em desmascarar Gustavo não surtiram efeito em sua crédula pretendida. Luciana escutava horrorizada todas aquelas conversas e recusava-se a dar-lhes fé, o que era bastante compreensível, pois o jovem atleta a cercava de delicadezas e, quem diria, até cavalheirismo, algo inimaginável para aqueles que já o haviam visto desprezar várias garotas aparentemente mais interessantes de maneiras às vezes até pouco polidas.
Apesar de não obter o sucesso esperado, as ações de Daniel não foram desperdiçadas pois, se não conseguiu que Luciana perdesse o interesse em Gustavo, ao menos fizeram com que ela mantivesse uma certa desconfiança das reais intenções daquele que lhe povoava os pensamentos. Para o astuto Daniel seria uma questão de tempo desmascarar o colega.
Infelizmente para ele, tempo era justamente o que não mais estava à sua disposição. Em comemoração ao fim do período os alunos de administração programaram uma festa na boate da moda. Seria em uma sexta-feira, após o último dia de aula. Certamente seu rival estaria lá, o local ideal para a investida definitiva.
Contudo, na tarde seguinte, Gustavo partiria rumo ao litoral carioca, onde disputaria uma competição nacional com chances de vitória. Por motivo algum ele deixaria de viajar, mesmo com uma mulher em jogo. “Logo”, pensou o esguio rapaz, “se eu impedi-lo apenas por aquela noite, ganharei tempo suficiente para convencê-la a desistir. Talvez até a decepção faça com que ela venha para os meus braços”. Sua esperança estava acesa novamente.


Em meio às ondas sonoras que estremeciam o escuro chão da boate e ensurdeciam as quase duas centenas de pessoas que lá estavam para festejar o início das férias de inverno, quatro palavras chegaram aos pequenos ouvidos de uma certa jovem.
— Eu te amo, Luciana.
Aquela frase a abalou. Em nenhum momento esperava aquilo. Muito menos na forma de uma declaração direta. Não podia acreditar que alguém tão próximo esconderia algo tão importante, deixando-a cega à verdade manifesta.
Pois era certo que era verdade. Não havia a menor dúvida. Como não percebera antes? Agora tudo se tornava tão simples: a educação, a presença mesmo em momentos aparentemente improváveis, os olhares das pessoas sempre dirigidos aos dois, como estranhando o comportamento dele.
— O que houve? Fale alguma coisa, por favor.
O que havia? Emoções. Palavras não as traduziriam. Ele ali, parado à sua frente, indefeso como um menino, esperando uma resposta. Sua decisão.
— Não sei o que dizer. É inesperado para mim — começou Luciana, meio sem jeito.
— Você não percebeu nada?
— Nunca.
— Não é possível. Todos vinham comentar comigo que estava sendo muito direto.
— Mas… eu achei que fosse apenas amizade. Jamais desconfiei.
— Quer dizer que de sua parte é só isso?
— Sim, ou melhor, não. Desculpe, não sei bem. Está tudo confuso aqui dentro, — disse, apoiando a cabeça entre as mãos e sentando-se em uma das mesas próximas, num dos pontos mais distantes da pista de dança.
— Perdoe-me — disse e, colocando-se a seu lado num abraço protetor, continuou — eu não quero que você tome uma decisão precipitada. Pense um pouco a respeito.
— Não sei… eu não esperava. Não quero lhe dar esperanças de algo que posso não ser capaz de cumprir… — e sua consciência não permitia um relacionamento sem a certeza de que corresponderia ao sentimento da outra pessoa.
Ouvindo aquelas palavras o rapaz levantou-se, olhou profundamente em seus olhos e disse, com a voz incapaz de esconder o tom de decepção:
— Tudo bem. Acho melhor deixá-la um pouco só. Estarei perto do balcão, caso queira falar comigo mais tarde.
— Está certo. Eu o encontro lá daqui a pouco.
— Não tenha pressa — e, dirigindo-se para o local combinado, virou-se.


Ao ver Gustavo afastar-se da mesa onde Luciana estava sentada, Daniel respirou aliviado. Ele acompanhou todos os movimentos do casal desde que chegaram ao recinto. Foi tomado pelo ciúme quando o amigo tirou o casaco, revelando sua avantajada musculatura pouco escondida sob a blusa baby-look, e puxou a garota, num curto, colado e decotado vestido preto, para dançar.
O ciúme tornou-se tensão quando, após cochichar algo em seu ouvido, saiu com ela da pista de dança, dirigindo-se a uma mesa. Enquanto estavam em pé ele os podia ver melhor. Sentiu-se gelar quando os dois se sentaram, mas em seguida percebeu que o clima não estava bem entre eles, e acalmou-se ao ver Gustavo deixá-la só e ir em direção ao bar.
Daniel ficou em dúvida sobre o que fazer a seguir: ela estava lá, sozinha e aparentemente não muito satisfeita com seu concorrente, um ótimo momento para ele abordá-la e contar a verdade sobre seu concorrente e revelar seus sentimentos; por outro lado, não era seu intuito expor-se ao perigo de ouvir uma negativa direta.
Enquanto meditava sobre este impasse, notou que, no balcão, Gustavo estava tomando seu chope quando Roberta se aproximou dele. Ela teve um relacionamento curto com o rapaz: estiveram juntos por um fim-de-semana no semestre anterior, quando ela ainda era caloura. Em princípio não deu importância ao fato, e voltou-se para sua dúvida imediata, se devia ou não partir para uma conversa franca com o alvo de sua admiração secreta.
Todavia, apenas alguns minutos depois, passando o olhar novamente pelo balcão percebeu que a aproximação ali em breve se tornaria mais quente: a aquela altura, Roberta estava afagando os cabelos de Gustavo, ainda cabisbaixo, mas já ensaiando levantar-se. Do outro lado, Luciana estava começando a inquietar-se. Mesmo assim, Daniel, usando ao máximo sua paciência, resolveu esperar.
E sua atitude foi recompensada pois, no segundo seguinte, Gustavo roubara um beijo de Roberta. (Ou fora o contrário? Pouco importava.) Ao ver Luciana se levantar, dirigiu-se para interceptá-la.
— Olá Luciana.
— Daniel? Você por aqui?
— Às vezes eu também me divirto.
— Eu sei, é que… você viu o Gustavo por aí?
— Para falar a verdade, vi sim.
— Onde ele está?
— Acho melhor você não ir lá.
— Por quê?
— Para não se decepcionar.
— Como assim?
— Não negue, Luciana. Você está apaixonada por ele.
— Como? Você enlouqueceu, Daniel?
— Não minta.
— Olha, eu sinto lhe desapontar, mas… — fez uma pausa devido à duvida, e prosseguiu — como confio em você, vou lhe contar: Gustavo acabou de se declarar para mim.
— O quê?!
— Isso que você ouviu. Agora você vai me ajudar ou vou ter que encontrá-lo sozinha?
— Luciana, o Gustavo não é como você está pensando.
— Não entendi, Daniel.
— Ele é um canalha, sem coração. Ele não lhe ama. Eu o conheço, ele diz isso a todas e sempre as abandona depois.
— Mas ele tem sido diferente. Comigo ele revelou sua verdadeira face, Daniel. Ele mesmo sentiu isso, disse que fiz surgir algo de diferente dentro dele.
— Ele está te enganando. Isso não pode ser verdade.
— E por que não?
— Porque, neste exato momento, aqui mesmo nessa boate ele está “amando” uma outra pessoa.
— Eu não acredito. Você está mentindo!
— Eu posso provar. Venha comigo.


Gustavo chegou ao balcão arrastando-se. Jamais vivera situação semelhante. Vencido por uma mulher! Pior, quase uma menina, uma menina que entrou em sua vida por acaso e foi dominando seus atos aos poucos, ao ponto de ele estar aqui sentado, ao invés de caçar sua última vítima do semestre.
Enquanto refletia sobre este revoltante dilema, pediu ao garçom uma tulipa de chope. Ah! O álcool, uma das maravilhas da humanidade. Não foi inventado ainda nada mais eficiente e sem contra-indicações que o etanol. Capaz de ludibriar os sentidos e entorpecer as mentes, transportando o usuário para uma região sem tristezas. Era justamente o que ele precisava para esquecer Luciana.
Já havia tomado um drinque, e o efeito da mistura nele que raramente bebia foi imediato. O mundo rodou à sua volta, luzes e sons da boate se misturando, obscurecendo seus pensamentos. Estava incapaz de reconhecer sua própria pessoa, que dirá a dos outros. Estava só. Só e feliz.
Permaneceu naquele estado por mais alguns minutos. Quando o efeito passou um pouco percebeu que alguém estava conversando com ele. Uma mulher. Luciana? Não, não. Um rosto conhecido. Roberta!
Ela fora caloura de administração no período anterior, e uma de suas presas. Bonita, sem dúvida, mas também fútil e infantil. Estivera com ela por três dias, prolongando-se dessa maneira na intenção de levá-la à cama, mas frustrou-se. Motivo suficiente para o fim do relacionamento.
Não estava compreendendo bem o que ela dizia, apenas respondia. Com certeza estava se oferecendo para ele. Há seis meses ela não faz outra coisa. Mas Gustavo não se rebaixava a ir atrás de mulheres que poderiam pisar nele: havia outras mais fáceis.
Entretanto, Luciana não era uma delas. Negara ficar com ele, mesmo tendo se declarado. Não que ele a amasse: era apenas uma manobra para deixá-la atordoada, mas o efeito maior do que o imaginado. Nunca compreendera as mulheres, seus sentimentos complicados. Mas, quem se importaria?
Num outro momento um pouco mais lúcido percebeu a mão de Roberta sobre sua cabeça. Novamente ela se oferecia para ele. Estava cansado. Estava só. Acima de tudo, estava revoltado com o sexo frágil. E, pensando bem, talvez ela estivesse mais acessível hoje do que alguns meses antes. Ficaria com Roberta.
Passar do pensamento à ação demorou quinze segundos. Segurou a mão da jovem que estava sobre sua cabeça e ergueu-a, fitando-a diretamente nos olhos. Estava paralisada. Passou o braço esquerdo por suas costas e puxou-a para si. Sem dizer uma palavra, beijou-a ardorosamente.
Não soube quanto tempo ficara ali: alguns segundos, ou foram minutos? Sua recordação seguinte era a de Luciana parada a dois metros dele, com o olhar cheio de lágrimas.
Acompanhada de seu amigo. Daniel.


— Seu, seu… Seu canalha!
— Calma, Luciana, eu posso explicar tudo.
— Explicar o quê, Gustavo? Você se declara para mim e dez minutos depois sai beijando outra.
Roberta riu.
— Eu fiz isso porque você me dispensou.
— Eu não o dispensei: pedi alguns momentos para pensar, pois fiquei com medo de magoar você.
Roberta e Daniel riram.
— A culpa é sua, não é Daniel? Você é um traidor!
— Não sou eu quem anda difamando os colegas pelas costas.
— Como assim?
— Dizendo que eu estava falando mal de você para a Luciana.
— Realmente, ele nunca fez isso.
— Não, mas estava enganando você, Luciana.
— Olha aqui, seu… Não venha difamar os outros só porque sua farsa foi descoberta.
— Farsa? Ele é o especialista no assunto — disse Gustavo apontando para Daniel. — Afinal de contas, ele fingiu para mim não estar não se importando com você, passou por amigo seu este tempo todo, sendo que na verdade ele está apaixonado e ainda mentiu, dizendo que eu estaria livre nas férias, o tempo em que quase sempre estou viajando.
— Calma. Calma. Estou ficando confusa. Daniel, isso tudo é verdade?
— É claro que é Luci—
— Eu estou falando com ele, Gustavo.
— Bom, sabe, Luciana,…
— Por favor, alguém aqui seja sincero apenas desta vez!
Ao ver sua honra denegrida, o pequeno jovem exaltou-se:
— Não vamos tão longe assim! Esse aí engana você, promete amor eterno e fica com essa outra, fere minha reputação na faculdade, fica cheio de más intenções e você tem coragem de me comparar a ele? Só porque eu, para protegê-la dele, adulterei um pouco os fatos?
— “Adulterou”? Você admite que mentiu para mim para afastar o Gustavo?
— Ele não teria chance contra mim.
— Cale-se, seu idiota.
Gustavo riu.
— Está vendo? É desse traidor, machista, infantil que eu estou—
Daniel jamais terminara aquela frase. Nem houve tempo para maiores explicações de nenhuma das partes. Ao ouvir aqueles insultos, Gustavo, ainda um pouco alterado pelos efeitos do álcool, acertou um soco no rosto de Daniel, que quase foi ao chão.
Vendo-o ainda de pé, o forte triatleta partiu para uma nova investida, desta vez tomando o cuidado de segurar o outro pelo braço para evitar um nocaute antecipado. Bruno e Marcelo que estavam por perto no justo momento agarraram Gustavo para impedir um massacre. Segurando com dificuldade os dois braços deste, conseguiram apartar o embate.
A trégua não durou muito tempo, pois Daniel, com o nariz sangrando e o corpo dolorido, aglutinou o pouco de forças que lhe restava e, aproveitando-se da posição indefesa do antigo colega, acertou-lhe dois murros no estômago e começou a apertar seu pescoço com suas mãos.
O outro revidou como pôde: um chute conseguiu fazer Daniel aliviar a pressão e retroceder um metro. Desvencilhando-se momentaneamente de seus captores, estava prestes a reiniciar a pancadaria quando os seguranças da boate intervieram e dominaram-no definitivamente, tomando o cuidado de também segurar o outro envolvido na briga.
Enquanto eram arrastados para fora do estabelecimento, passaram ao lado de Fernanda e Gisele, que dançavam animadamente, sem se dar conta dos últimos acontecimentos. Ao ver seu amigo sangrando, a primeira reação desta foi acudir, porém, ao perceber que a outra pessoa arrastada era Gustavo, decidiu procurar por Luciana antes de abandonar a festa.
Assim, no momento em que os truculentos leões de chácara batiam a porta após expulsarem os dois oponentes, Gisele batia no ombro da origem do conflito para perguntar a razão de tudo aquilo.


Com os ânimos esfriados, dois colegas de longa data tentaram reiniciar uma conversa adulta à porta da boate da qual acabaram de ser expelidos.
— A culpa é sua, seu covarde — disse Gustavo, sentindo os pontos doloridos em seu pescoço causados pelo aperto do rapaz à sua frente. — Por que não me disse que estava atrás dela?
— E adiantaria? — Respondeu Daniel, terminando de secar as gotas de sangue que desciam de suas narinas — Você riria de mim e espalharia para todos os nossos colegas. Isso se não contasse diretamente para ela.
— O que é isso, Daniel? — retomou a palavra o outro, em tom de ironia — Assim você me ofende: nos conhecemos há quase cinco anos e é esta a impressão que você tem a meu respeito?
— Justamente por isso é que sei o que você faria. Ou você vai ter coragem de negar? — desafiou.
— Absolutamente. Você está certo. Eu queria dizer uma coisa…
— Que se arrepende? Vai pedir desculpas?
— Não, eu queria dizer que, apesar de não representar risco aos meus domínios, você é um adversário razoável.
— Ora, seu…
Antes de concluir qualquer ofensa, Gustavo envolveu o pescoço de Daniel, com seu braço, como sempre fizeram. Ambos começaram a rir. Logo em seguida, Gisele saíra pela porta e correra na direção da dupla, pensando que a desavença ainda existia. Ao perceber que se tratava de diversão, sorriu e começou a falar:
— Bonito, hein? Todo mundo preocupado com vocês e os dois garotões às gargalhadas?
— Ô Gisele, não é bem assim. Não é todo dia que se é espancado pelo melhor amigo — falou Daniel, ainda preso.
— Pois bem, eu vim para saber como você estava, mas parece que está tudo bem. Além disso, vim trazer uma notícia chata para ambos: fui conversar com a tal Luciana e ela me disse para vocês esquecerem-na e sumirem da vida dela.
— Ah, duvido! Elas sempre dizem algo assim quando estão bravas, mas quem consegue resistir ao meu charme? — questionou Gustavo, retornando à sua habitual falta de modéstia.
— Quer que eu enumere? — retrucou a garota, com uma leve irritação.
— Sinto muito, Gustavo, mas acho que aquela não tem jeito.
— Eu aposto que, no reinício das aulas, eu conquisto a amizade dela de novo.
— Não antes de mim — adiantou-se Daniel. — eu conseguirei primeiro.



FIM

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