Pegou o telefone na internet.
Pensou um milhão de vezes antes de ligar. E ficou perseguido quando finalmente pegou o telefone no gancho e discou:
-Alô, De onde fala?
-O que deseja? -respondeu uma voz seca do outro lado.
Hesitou, respirou fundo e tentou novamente:
-É que eu peguei o seu telefone na internet…
Silêncio do outro lado da linha.Retomou a coragem:
-Então… vi uma página sua na internet e me interessei pelos seus serviços…
Mais silêncio. Ele pensou em desligar.Mas o último fio de coragem o ajudou na última hora:
-Alô, você está me ouvindo?
-Não me chame por você.
-Ah, desculpe… como você, digo, a senhora quer ser chamada?
-Acho que você não é o tipo de cliente para mim. Tem certeza de que entendeu direitinho o que estava escrito na página? Não tenho paciência para gente como você.
-Mas, minha senhora, não estou entendendo…
-Sabe o que? Você está parecendo um bundão!
E desligou em seguida.
Alfredo ficou enlouquecido. Tentou ligar de novo, mas desta vez a coragem lhe faltou. Saiu andando e foi trabalhar.Alfredo trabalhava como contador em uma empresa de médio porte. Era um tipo metódico e esforçado, mas era sempre preterido na hora das promoções. Definitivamente não fazia parte da turma.
Foi trabalhar naquele dia com muito esforço. Nao conseguia tirar a voz daquela mulher da cabeça. Titubeou na hora de pegar o telefone, mas não desistiu.
-Alô!
-A-Aa-alô, tudo bem?
-Ah, não…você de novo? Olha, isso aqui não é brincadeirinha para iniciantes. Eu sugiro que você vá procurar alguma casa de massagem.
-Não, por favor, não desligue! É que eu estou louco com essa história…não consegui dormir, estou ficando transtornado!
-Vá procurar um médico então! E não me ligue mais!
E bateu o telefone. Alfredo sentiu o sangue fugir .Isso nunca tinha acontecido. Não era muito dado a essas farras e a única vez na vida que saiu com uma prostituta acabou brochando. Explicou-se muito, disse a ela que andava muito cansado ,estressado mesmo. Ela foi muito compreensiva, disse que isso acontecia com muitos clientes, para ele não se preocupar e não sei o quê.
Depois disso Alfredo não voltou a se aventurar. Tinha um sexo esporádico com uma namorada de anos, com a qual nunca tomava coragem para se casar. E já estava chegando na casa dos quarenta.
Mas depois daquele anúncio, pela primeira vez em anos sentia-se renovado. Sua libido, que nunca o acompanhou fielmente, resolveu aparecer como um rojão. Subitamente entendeu o porquê de todo aquele falatório sobre sexo no trabalho, com os amigos, na tv e tudo o mais .Tudo aquilo ficou interessante. Lembrou-se então da página da moça, quer dizer, da rainha: entrou meio sem querer, através de um site de busca. Deu de cara com aquelas informações sugerindo coisas que não entendia bem: ela falava de dominação e submissão, fantasias e humilhações em um tal de um calabouço. Dizia fazer loucuras em matéria de ordens, que era impossível não obedecê-la. No final havia um aviso dizendo que agressões físicas de qualquer natureza não eram bem vindas em hipótese alguma. Alfredo gostou dessa parte. Estava adorando tudo mas tinha fobia de dor, machucados em geral e sangue, de modo que se a tal da coisa fosse mesmo para valer ele não poderia participar. Desmaiava invariavelmente.
Ligou novamente na saída do trabalho. Ela devia ter um detector de chamadas, porque não atendeu no início.
Ele então desesperou-se. Telefonou umas trinta vezes. Às tantas ela respondeu:
-Fala,bundão! Você é teimoso, não?
-Alô., por favor não desligue. Eu preciso muito estar com você.
-Não me chame de você. Somente de minha rainha.
Ele nao hesitou:
-Sim, minha rainha!
E ela continuou:,
-Outra coisa : só atendo aqui no meu calabouço. E recebo adiantado. Faça um depósito daquele valor especificado na página na minha conta.
-Mas o que é um calabouço?
-Olhe, estou desistindo. Detesto principiantes e ignorantes.
-Mas é que eu não sei…andei tendo umas fantasias e quando vi o seu site…é que eu tenho um pouco de medo dessas coisas.
Ela bufou e respondeu:
-Olha, a coisa comigo é mais na base da encenação mesmo. Não chega a ser perigoso. Se você estiver atrás de algo mais hardcore posso te indicar uma amiga que é da pesada! Pelo jeito você ia adorar.
Ele fez que ia se ofender , mas respirou fundo e prosseguiu. Não tinha condições de se impor naquela hora.
-Então…eu andei comprando umas roupas diferentes e queria usar…fantasias para mim…tudo bem?
-Desde que você me obedeça e seja meu servo aqui no calabouço.
Alfredo tinha que admitir que aquela história de calabouço estava um pouco misteriosa. Não estava entendendo exatamante, mas algo lhe dizia que ele havia nascido para aquilo.
-Rainha…posso ir então?
-Olhe, venha para eu ver a sua cara. Tô te achando tão tonto que não sei se você é confiável. Só atendo clientes selecionados e só tenho hora para quinta feira da semana que vem às 4 da tarde.
Era horário de trabalho . Ele parou, respirou fundo e respondeu com um fio de voz:
-Eu vou…
Mas não conseguia esperar pelo dia combinado. Dois dias depois já estava impossível sobreviver. Destratava a namorada constantemente. Até a mãe, a quem tratava com todo o carinho e dedicação, não escapou. Ele, que nunca na vida havia levantado a voz para a mãe , sofreu uma grande transfomação: conseguiu se impor, respondeu umas três frases com respostas atravessadas e disse que estava prestes a sair de casa.
Ligou de novo:
-Olhe, rainha, não estou conseguindo esperar. Se eu pagar bandeira dois, será que a senhora não poderia me atender um pouquinho antes?
-Só se você suplicar.
Alfredo descontrolou-se:
-Eu suplico, eu te imploro, eu quero lamber o chão onde você pisa! Não, quero também que pise em mim como em um capacho velho! Não! Um cachorro vira-lata sem utilidade! Eu sou a última das criaturas! Sou execrável, só sirvo mesmo para cumprir os seus caprichos! Eu imploro!
-Pode vir hoje. Agora você entendeu o espírito da coisa!