-Cá estamos nós neste mundo maravilhoso e colorido. Que lindas cores, não? Olha aquele azul ali. É a primeira vez que eu o vejo nesta tonalidade. Que sensação estranha me causa este vermelho-sangue! Este roxo também não gostei. Chega a me dar calafrios. Agora, sim, estou vendo uma cor digna: o amarelo! Sabe que essa cor me incentiva muito? Olha só quem está aqui: viva o grená! Há quanto tempo não o via! E justo quem está ao seu lado: o lilás! Eu já desconfiava que vocês eram parentes...
-Corta! Por hoje chega, pessoal.
-Então, o que você achou, meu bem?
-Hã?
-Eu perguntei, o que você achou.
-Era justamente sobre isso que eu estava pensando.
-E qual a sua opinião?
-Com relação à sua encenação ou ao tema?
-Claro que estou perguntando sobre a minha encenação.
-Ah, bom! Não resta a menor dúvida de que você estava ótima, querida.
-Obrigada, benzinho. (Beijos)
(EM CASA)
-Amanhã, irei bem cedo, pois, à noite, será a estréia.
-Isso!
-Querido, diga-me uma coisa: no teatro, o que você quis dizer com encenação ou tema?
-Quando você me perguntou o que eu achei?
-Sim.
-Bem, é porque eu tinha respostas distintas.
-Por quê?
-Porque, do jeito falado na peça, parece que as cores nos trazem a realidade. No entanto, é totalmente o contrário.
-Como assim?
-Veja bem, querida: qual a cor da parede de nossa casa?
-Marfim.
-E, no entanto, não tem nada a ver. Não passa de uma camuflagem. O que realmente suporta a parede não aparece, porque é feio.
-Não entendi nada.
-Pois bem. Vou te dar outro exemplo: qual a cor do céu durante o dia?
-Azul, lógico!
-E, por sinal, um azul muito atraente, não?
-Quanto a isso, não resta dúvida.
-Você acaba de ser dominada pela cor e não pela realidade. À noite, não temos a mesma vontade. De dia, criamos uma outra imagem sobre o mesmo referencial, pois está camuflado por uma cor maravilhosa. Entendeu agora?
-Para falar a verdade, não.
-Vou te dar um exemplo mais explícito, tá?
-Certo, benzinho.
-Na época em que namorei e casei com você, qual era a sua cor?
-Morena-jambo.
-Mais uma prova de que a cor engana a todos. Casei com você por causa da sua linda cor e não percebi que era um bronzeado artificial. Hoje, tento conviver pacificamente com os capilares que afloram a sua pele branca...
Obviamente, depois de uma resposta dessa, você não pensou que o maridão fosse ficar impune. Ou você não entendeu?
