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Contos-->O homem sem rosto -- 21/06/2000 - 03:43 (Marcia Lee-Smith) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Foi num dia de verão. Um dia destes, mornos, lascivos. A preguiça me invadia como se tomasse conta de meu corpo, minha mente, e eu apenas queria estar ali, na rede, olhando as folhas do coqueiro balançando levemente com a pouca brisa.
Nem o apelo do mar conseguia fazer com que eu saísse do meu estado de torpor, que na certa me levaria a uns instantes de sono.
E eu dormiria naquele momento se uma sombra não houvesse coberto meu corpo na rede.
Uma sombra que não procurei saber de quem, naquele momento.
A pessoa estava contra o sol, e eu não conseguiria mesmo ver quem era.
Era um homem, o que pude ver quando ele se sentou na areia, junto à rede.
Ainda num estado entre o sono e a vigília eu tentei dizer:
―Quem é você?
O estranho, cujas feições eu não via, parecia sorrir. E não respondeu.
Começou a embalar a rede suavemente, e a acariciar meus cabelos que caiam quase até ao chão.
E dos cabelos passou ao rosto, e então deixou-se ver.
Era um homem sem rosto.
Não sei porque não me assustei, acho que pensei ser parte de um sonho, já que eu quase dormia quando ele se aproximou.
O homem sem rosto não podia falar, já que não tinha boca, nem me ver, sem olhos.
Suas mãos desceram para meu corpo e fizeram com que milhares de centelhas elétricas o percorressem.
E aos poucos foi chegando mais e mais perto, e deitou-se junto a mim.
As folhas do coqueiro começaram a se agitar como se um temporal estivesse por chegar, e notei que o céu mudava de coloração, ficando entre violeta e dourado.
O mar começou a ficar agitado, ondas enormes fustigavam a praia e a maresia jogava milhões de pequenas gotinhas de água em suspensão sobre nós.
―Quem é você, insisti.
E por algum fenômeno eu o ouvi dentro de minha cabeça.
―Sou aquele que esperavas.
Mas eu não esperava ninguém, desiludida dos amores dos homens, eu só queria estar só.
Então aconteceu, e foi como se os céus e o oceano e a terra estivessem se misturando numa explosão de cores, cheiros e sensações.
Aos poucos o mundo foi voltando ao real.
O homem tinha desaparecido.
Pensei que houvera sonhado, mas ele deixara marcas evidentes de sua presença.
Procurei esquecer, evitei sair da pequena casa na praia.
Um dia eu caminhava pela beira da água, e vi que alguém estava me seguindo. Virei-me rapidamente e o vi.
E num segundo não estávamos mais na areia, mas nadando no fundo do mar, amando-nos entre algas e corais, e ele finalmente levou-me para a praia e deitou-me na areia.
Pensei ter enlouquecido. Eu não poderia ter ficado tanto tempo submersa sem respirar.
Um dia tive que ir à vila comprar mantimentos. Já estava fechando a porta da tapera quando ele chegou, carregando uma quantidade infinita de cestas cheias.
Perguntei-me onde ele teria conseguido aquilo, se nem podia ver ou falar.
Mas entramos na tapera, e guardamos tudo, e ele cozinhou. A melhor comida que já vi neste mundo.
Ele parecia ler meus pensamentos, vivia fazendo tudo para me agradar, balançava a cabeça demonstrando satisfação quando eu ficava surpresa ou contente.
Um dia mergulhou e me trouxe pérolas. Com cuidado fez um colar e colocou em meu pescoço. Parecia que estava querendo algo como quem dá uma aliança.
Deixei o colar em meu pescoço.
Os dias e noites foram rolando. Seu corpo era insaciável, sua necessidade de me fazer feliz era maior, e ele sabia fazer amor como eu jamais houvera experimentado antes.
Noutro dia trouxe-me uma enorme concha exótica, o que me fez perguntar se ele seria um habitante das águas.
Respondeu, fazendo amor.
"Não me pergunte mais nada, ou irá perder-me.
Realmente não gostei da ameaça.
Começamos a não nos dar bem. Ele, telepaticamente, sabia que eu queria fazer perguntas.
Levou-me a mais um passeio sob as águas. Amamo-nos no fundo do mar, e eu não precisava respirar. Era fantástico.
Mas minha mente não me deixava em paz, e comecei a temê-lo.
Um dia, quando ele nadava longe do alcance de minhas vistas, fugi.
Abriguei-me na casa de uns conhecidos, depois peguei um ônibus, e voltei para a minha vida normal.
Anos depois, recebi a visita de um casal amigo. Ele era um biólogo marinho, e viu, numa prateleira da sala as pérolas e a concha.
Interessadíssimo, perguntou-me se eu emprestaria aqueles objetos por uma semana, para uns testes.
Uma semana virou duas, virou um mês, virou dois anos.
Eu já nem pensava mais naquilo quando ele voltou com a resposta.
Queriam saber, ele, os franceses, e os americanos que tinham examinado as pérolas e a concha, onde eu as tinha conseguido.
Eu contei mas omiti o homem sem rosto. Perguntei a razão da pergunta.
―Você vai achar tão estranho como nós achamos. É que não existem pérolas ou conchas como estas catalogadas em todo o planeta. Dentro de cada pérola há um diamante perfeito, e a concha é ouro revestido de madrepérola, em todas as suas reentrâncias. isto foi fabricado por alguém cuja especialidade transcende tudo o que já ouvimos dizer. Qual a verdade?
―Não sei, respondi. Já disse, foram achadas naquela praia onde vivi por seis meses.
Ele abanou a cabeça.
―Simplesmente impossível. Isto parece ter vindo de outro planeta !
Eu guardei minhas relíquias, não pelo valor material, mas pelas lembranças que me traziam, e ainda faziam meu corpo tremer de gozo ao lembrar aquele estranho homem sem rosto, que talvez nunca tenha existido.
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