Neblina, água que passa, rasa em seu longo leito. Muitas árvores, espalhadas, antigas. A boca da grande gruta, escura.
Caminho na água e vejo o reflexo da luz na neblina, por trás da grande gruta. É o medo, o anseio frente ao desconhecido que sinto, fremente em mim.
Muitos morreram nessa busca. Seus corpos jazem dependurados em cordas gastas pelo tempo. Restaram apenas ossos com restos de carne seca e podre, carcomida pelos vermes.
Contorno a grande gruta e tento vislumbrar a luz desconhecida em um local invisível aos meus sentidos. Pode ser o espaço indefinido ou um nicho escondido.
Caminho perdido em um trajeto sem sentido que esbarra em meu ser, que luta dentro de si na volta sem fim do desabrido.
Há muito percorro esse caminho pedregoso, seja nas águas ou entre as árvores.
O que sei de mim? Muito pouco para decifrar o enigma da luz detrás da grande gruta.
A luz muda de tonalidade e se reflete nas árvores e arbustos ao meu redor, e no espelho d água, que, de transparente passa a escuro e depois a esverdeado, azulado...
Nessa atmosfera multicor, perco a noção do espaço. Não sei se caminho entre a luz ou se sou levado por ela.
O meu próprio ser parece decomposto em seus múltiplos aspectos pelos tempos sem fim e perco a noção do meu próprio eu que parece transbordar e se expandir em múltiplos universos descomunais e sem limites, desdobrando-se no espaço-tempo.
A pequena flor amarela me chama a atenção. Ela é, em si mesma, um mundo com sua identidade própria, mas mutável também junto comigo e tudo que me cerca, árvores, animais, a grande gruta. Esta última se revela um imenso buraco-negro que dá acesso à inúmeros mundos, tão múltiplos quanto a diversidade da natureza.
Sou, ao mesmo tempo, o cavaleiro-herói e o mendigo-trapeiro, dependendo da tonalidade da luz que me alcança e me multiplica.
Estou contornando a grande gruta, atraído pela luz, que tem sua própria vida.
À medida que me aproximo, sinto que não poderei chegar à fonte da luz pois serei esmagado pela sua intensidade.
Percebo que a luz se origina de um nicho, que mal consigo divisar, atrás da grande gruta, em um ponto inacessível.
Parece provir de um cálice, que, em certos momentos se destaca, dentre as emanações da luz - o Graal!