Chico era um tímido. Seu jeito encurvado de andar, a fala mansa, o medo de desagradar, tudo nele revelava a profunda timidez.
Um dia, pensativo, resolveu confidenciar com o Almir:
- Cara, estou apaixonado.
Almir, incrédulo, indagou:
- Verdade? Contra quem ?
Entâo, coçando o queixo, o encabulado confessou:
- A Maria Odília...
-Não acredito, rapaz, é mesmo? E ela está correspondendo.
Fez um risinho abafado, pondo a mão cobrindo os lábios, balançou afirmativamente com a cabeça:
- Acho que sim...
- Acho? Você não tem certeza?
- Ainda não. Hoje a noite vou tirar a prova dos noves. Vou fazer uma serenata para ela...
- O pai dela, dizem, é uma fera. Você tem muita coragem!
Chico ficou pensando naquilo que o amigo lhe dissera: "O pai dela, dizem, é uma fera". Realmente, o pai da moça era um senhor muito enfezado, turrão. Ficou com as mãos geladas. Um suor vindo do ignoto umedeceu o seu corpo. Na sua mente, o medo imperava. Mas, não tinha como cancelar o compromisso. Ninguém tinha telefone.
Haviam combinado o encontro depois das 10 horas, em frente à igrejinha de São Benedito, onde ensaiariam mais uma vez as músicas do repetório.
Nove e meia, violão debaixo do braço, Chico foi indeciso para o encontro com os outros seresteiros.
Tremia. A voz saía estranha. Pigarreava, mas não havia jeito de colocar melhor a voz.
Hermano, que tocava o cavaquinho, perguntou:
- Chico, o que está havendo?
- Não sei, Hermano, nem sequer estou gripado.
Perto de meia noite saíram dali no rumo da casa da primeira namorada. ERa exzatamente a casa de Maria Odília.
Chico começou a dedilhar o violão, tirando acordes de uma valsa dolente. Quando soltou a voz, a porta da frente abriu-se bruscamente e o pai da moça vociferou:
- Vagabundos, até você, filho da D. Alda, não tem o que fazer? Perturbando a gente deste jeito. Vão procurar o que fazer, fora!
Chico, tremendo de medo, pegou o violão, colocou mais uma vez embaixo do braço e, sem dar nenhuma explicação ao resto do grupo, correu para casa, onde se escondeu por mais de uma semana.