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Contos-->DINHEIRO NA MÃO É VENDAVAL -- 08/09/2002 - 00:05 (Alexandra Blandy) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

“ Atenção! Agora vamos conferir o resultado da loteria! Quem sabe você aí que está assistindo não pode ser o grande sortudo que vai levar o prêmio de um milhão de reais? ” Assim que seu Pedro ouviu essa chamada, apressadamente apanhou seu bilhete e uma caneta e sentou-se na poltrona em frente ao aparelho de TV.

- Leonor! Vem cá muié que o moço já vai falá o resurtado da loteria!
- Ara... Pedro e ocê acha que vai adiantá de arguma coisa se eu ficá aí
Iscuitando cocê?
- Adiantá não adianta, mas se eu ganhá ocê comemora comigo e se eu perdê ocê
chora comigo também.
- Pois eu prefiro ficá aqui mesmo na cozinha fazendo meu trabaio, porque já
Tô cansada de chorá nessa vida!
- Mas e se nóis ganhá muié?
- Se nóis ganhá Pedro, eu vô aí e te dô um beijo na boca!

Seu Pedro riu-se com a resposta da sua mulher, eles já tinham mais de cinqüenta
anos de casados e seu Pedro já não sabia o que era um beijo na boca há muito tempo...

“Atenção... a primeira dezena sorteada é ... 45, número 45!”

- Ê Leonor! Saiu o 45!
- E aí véio? Tem esse número no bilhete?
- Não sei véia, cadê meus ócluo, não tô conseguindo enxergá!
- Vixi! Pelo amor de Deus Pedro, como ocê qué conferi o resurtado sem esses ócluo ome!

Os dois começaram a procurar pelos óculos de seu Pedro, dona Leonor não
podia ajudar a marcar o número no bilhete devido ao glaucoma que lhe havia tirado a visão. Enquanto dona Leonor tateava sobre os móveis, seu Pedro tentava desanuviar as vistas para tentar encontrar seus preciosos óculos.

- Achei, achei Pedro!
- Que bom que ocê achou meus ócluo muié, me dá aqui!

Seu Pedro já com os óculos começou a procurar o número 45 no seu bilhete.

- Véia! Tem aqui o número 45, já começamo bem!
- Verdade Pedro?
- É óia só aqui... Ah esquece ocê não consegue enxergá nada, mas deixa comigo
que agora com meus ócluo eu marco tudinho!

“E agora vamos para o segundo número sorteado... e o número é....03!”

- 03 véio, vê aí se tem esse!
- Carma Leonor, eu tô pricurando..... Tem! Tem esse também aqui Leonor!
- Vixi Maria, Pedro, nóis tá com sorte.
- É Véia e Deus permita que a sorte continue, já pensou se nóis ganha esse
prêmio?!
- Nossa Sinhora... nem quero pensá, nóis nunca ganhô nada dessas coisa
quando era jovem Pedro, por que ocê acha que vamo ganhá agora que tamo tudo com os pé na cova? Acho meió ocê não sonhá muito.
- Ô véia... pára com isso! Nóis tamo véio sim mas não tamo morto!
- Mas acontece que nessa idade que nóis tá, o que ocê acha que podemo fazê com
tanto dinheiro se nóis ganhá?
- Podemo ajudá nossos fio e neto, véia.
- Que fio? E que neto Pedro? Eles nem se lembra di nóis, ocê sabe quanto tempo
faz que nóis num vemo eles?
- Sei não véia, sei que já tem uns bom par de ano. – disse seu Pedro com lágrimas
caindo de seus olhos.

“Número 18”.......”número 27”

Os dois números seguintes também constavam do bilhete de seu Pedro, seu coração disparava, só faltava um único número para que ele se tornasse o novo milionário da loteria. Dona Leonor ao lado dele não se continha de alegria.... agora ela já se dava ao luxo de sonhar e acreditar que apesar de já estar no fim de sua vida a sorte enfim batia a sua porta. Pensava não nela e no marido, pois já não tinham muito tempo para desfrutar de tudo que o dinheiro podia lhes oferecer, mas pensava em seu filho Jorge que aos dezoito anos saiu de casa para ir morar na cidade grande, já faziam mais de quinze anos que eles não viam Jorge e não tinham notícias dele, nem da mulher e dos filhos. Pensava também em Rita, a filha mais velha, que depois de casada também foi morar longe e já haviam se passado bem uns vinte anos que a filha não os visitava e nem se quer lhes dava um telefonema. Apesar de ter os filhos distantes e de nem ter conhecido os seus netos, dona Leonor sempre pensava neles, tinha vontade de vê-los, mas não tinha o endereço, nem telefone, nenhum contato e pensava em como encontrá-los para poder lhes entregar o dinheiro que estava quase certo de ser dela e do marido.

Seu Pedro aguardava atencioso e em silêncio o último número a ser sorteado. Suas
mãos tremiam de emoção....

“ Atenção! Agora o último número que vai revelar o grande ganhador do prêmio no valor de um milhão de reais.....” O globo com as bolas numeradas girava... a moça então pôs suas mãos sobre o globo e acionou a alavanca da qual sairia a última bola com o número.... “ Aqui, tenho aqui em minhas mãos a quinta e última bola.... e o número sorteado é...... 16!”

Seu Pedro caiu para trás na poltrona e deixou cair o bilhete no chão...

- E então Pedro? Nóis ganhomo ou não? Pedro? Pedro?

Seu Pedro não respondia, dona Leonor com sua cegueira não sabia o que tinha
acontecido a seu marido, dirigiu-se até a poltrona onde estava sentado e começou a chamá-lo e sacudi-lo. Ele não respondia, tomada pelo desespero dona Leonor foi chamar os vizinhos que vieram prontamente socorrer, levando seu Pedro para o hospital mais próximo.

- Lamento dona Leonor, mas nada pudemos fazer, seu esposo sofreu um infarte
fulminante, já chegou ao hospital sem vida. – disse o médico cuidadosamente à velha senhora.
- Não... meu véio.... – disse dona Leonor caindo aos prantos nos braços de sua
vizinha e amiga, dona Aurora.

No dia seguinte, dona Leonor que não conseguira encontrar os filhos para avisar da morte do pai, muito triste, foi ao enterro de seu marido. Somente ela como única parente, porém cercada de amigos e vizinhos que tinham então se tornado a família do casal ao longo dos anos.

Poucas horas do enterro, dona Aurora foi ver sua comadre Leonor....

- Comadre Leonor, desculpe tocar nesse assunto agora, mas como é que isso foi
acontecer com o compadre? Ele sempre foi tão forte....
- Ai, nem ti conto Aurora...- dizia dona Leonor em lágrimas. – O que me conforta
é que meu véio morreu feliz.
- É mesmo comadre? Por quê?
- É que ele tava conferindo o resurtado da loteria ontem e foi bem quando o ome
da televisão disse o úrtimo número que meu véio infartou. Ele deve de tê ficado muito emocionado porque só fartava aquele úrtimo número pra compretá o biête da loteria.
- Virgem santíssima! Comadre, vocês ganharam na loteria, foi?
- Óia, cumadre Aurora, eu não sei onde tá o biête, nessa coisa toda da morte do
meu véio eu nem pensei em pricurá.
- Mas comadre, precisamos achar esse bilhete, se ele estiver premiado, ao menos
o compadre Pedro pode ter um velório bem bonito em sua homenagem.
- É comadre, meu véio bem que merecia isso.

As duas então se puseram a procurar pelo tal bilhete em todos os cômodos da casa.
Dona Aurora chamou a filha caçula, Mariana, de 13 anos para ajudar na busca. Reviram tudo, tiraram os móveis todos do lugar e nada do bilhete. Até nas latas de lixo foram olhar, mas de nada adiantou.

- Comadre, não está aqui mesmo esse bilhete, será que alguém roubou?
- Não, ninguém sabia desse biête Aurora, só contei pra ocê!

Acabaram desistindo da busca, já estava na hora de irem para o cemitério e
infelizmente seu Pedro não teria aquele belo velório e nem seria teria enterrado com grandes honras, mas dona Leonor não estava preocupada com isso, sua tristeza pela morte do esposo ainda lhe era muito latente.

O caixão de seu Pedro descia rumo a cova e apesar não poder ver, dono Leonor sentia que era momento da despedida final. Enquanto lhe doía o coração ouvia por toda sua volta os cochichos e rumores das pessoas comentando sobre o bilhete premiado. Sentiu cólera naquele instante, pois pouco se importavam com a vida daquele homem à quem ela tanto amou, mostrando tamanha mesquinhez, pois à eles o assunto do prêmio era muito mais importante do que o momento da última despedida de seu Pedro.

Num determinado momento, dona Leonor tomada pela emoção, desequilibrou-se escorregando um dos os pés na beira da cova, sua vizinha e comadre Aurora que estava ao seu lado, a segurou, trazendo-a de volta , quando então as pessoas ali começaram a soltar gritos eufóricos: “ Olha lá o bilhete!” “ O bilhete em cima do caixão!” “Peguem o bilhete!”.

No momento em que dona Leonor escorregara, descolou-se de seus sapatos o bilhete que estava ali grudado à lama junto a sola, caindo por sobre o caixão de seu Pedro. As pessoas ali em volta queriam descer à cova para apanhar o bilhete e um tamanho alvoroço ali se fez, pois o coveiro não queria permitir que ninguém adentrasse a cova, enquanto o padre que ali rezava pedia silêncio.

Dona Leonor ouvia tudo e decidida deu a ordem:

- Por favor sinhor padre, faça com que o coveiro apanhe o biête.

E o pedido foi atendido... o coveiro desceu até a cova e apanhou o bilhete e o
entregou nas mãos de dona Leonor.

- Agora faz favor sinhor padre, veja aí se tem o número 16 nesse biête.
- Tem sim senhora. – respondeu após alguns segundo e intrigado.
Seu padre, esse biête aí vale um mião de real. Se Deus fizesse negócio eu ia dá todo esse dinheiro pra trazê meu véio de vorta, mas eu sei que Eu sei que esse dinheiro aí padre, não pode comprá minha felicidade não, porque minha felicidade tá sendo agora enterrada e foi por causa desse dinheiro aí que meu marido tá dentro dessa cova. Por isso padre, que esses um mião não me serve de nada, então eu deixo com o sinhor, use na igreja, para ajudar os pobre, use para o bem padre, porque eu não quero esse dinheiro não!

- O quê?! Nada disso! A senhora tá maluca? – falou a mulher que surgiu da
multidão tomando o bilhete das mãos do padre.

O povo todo entrou em gritaria, afinal uma mulher estranha havia se apossado do
bilhete premiado.

- Como a senhora pode cometer uma loucura dessas? – disse a moça já ao lado de
dona Leonor.
- Fia? Rita, é ocê? – Falou reconhecendo a voz da filha que há muito não ouvia.
- Sou eu sim, mamãe...

Dona Leonor abriu os braços na intenção de receber o abraço da filha que tantos
anos não via , mas nada recebeu nos braços...
- Ainda bem que eu cheguei em tempo, mãe! A senhora deve estar esclerosada
para jogar um milhão de reais pela janela.

Dona Leonor começou a chorar, sentiu que a filha não havia aparecido ali para
despedir-se do pai, esta estava ali pelo bilhete, quem a teria avisado?

Acalmados os nervos, o enterro de seu Pedro finalmente terminara e o tumulto que ali se fizera dissipou-se. Rita levou a mãe para casa, ali mesmo lhe fez as malas dizendo que a levaria para a cidade a fim de que conhecesse os netos. Dona Leonor, apesar dos desgostos que sentira, ficara contente em poder viajar com a filha...enfim poderia olhar os netos enquanto a filha e o genro fossem trabalhar, ela não se sentiria tão sozinha agora que estava seu marido ao lado.

Em posse do bilhete de um milhão de reais, Rita já havia pensado em tudo. Iria largar o emprego, comprar uma casa nova, um automóvel importado e renovar o guarda-roupas da família, mas antes mesmo de trocar o bilhete pelo prêmio, seu irmão apareceu em sua casa, exigindo a metade do valor. Dona Leonor ouvindo a discussão foi até a sala procurar saber o que passava, quando entendeu que era seu filho que brigava com a irmã por causa daquele bilhete.

- Jorge meu fio, é ocê?

O rapaz nem deu ouvidos à mãe que insistiu:

- Jorge, é ocê fio?

Não obtendo resposta, dona Leonor foi se aproximando dos dois que brigavam,
quando então tocou nos ombros do filho, ele enfurecido a empurrou:

- Sai daqui velha!- fazendo com que a mãe caísse sentada no chão.

Dona Leonor em lágrimas lastimava-se pela amargura no coração dos filhos e
maldizia aquele infeliz bilhete que apesar de ter feito com que revisse sua família, lhe trouxera muito mais sofrimento do que felicidade.

Deixando os dois ainda ali discutindo, levantou sozinha, foi até a cômoda onde
sabia que se encontrava o bilhete, tomou-o nas mãos e o rasgou em mil pedaços.

- Mamãe, mamãe! A vovó rasgou o bilhete! – veio contar ás pressas um dos netos
de dona Leonor.
- Essa velha tá mesmo maluca! – disse Jorge.

Em desespero cataram todos os pedaços do bilhete e decidiram de comum acordo,
que dona Leonor estava fora de controle e trataram de largá-la num asilo.

Naquele mesmo dia foram os dois irmãos buscar o tão almejado prêmio de um milhão de reais , foi quando receberam o que não esperavam: Nada.
Não havia prêmio, pois o único número dos cinco sorteados que coincidia com o bilhete era o número 16, todos os outros quatro número estavam errados.

Os dois inconformados, maldiziam o pai que não marcou os números corretos no bilhete enganando à todos. Seu Pedro, pobre homem na ânsia de ganhar o prêmio e com sua dificuldade de visão marcara erradamente todos os números.

Jorge voltou para casa e para sua vida de sempre, sem se importar com a mãe que deixara no asilo. Rita, irritada por não ter recebido prêmio algum, esbravejava porque tinha mais uma conta pra pagar, que era o aluguel do asilo onde havia deixado a mãe. Vendou a casa onde a mãe morou toda a vida e usou o dinheiro para comprar um carro novo. Simplesmente deixou de pagar o asilo e dona Leonor teve que ser transferida para um asilo público. Abandonada pela família e longe de todos aqueles com quem conviveu durante toda a vida: seus vizinho e amigos. De tristeza, já não se alimentava direito, ficando franzina e doentia. Já nos seus últimos momentos, uma moça que ali estava fazendo visita a sua avó, vendo o sofrimento e a solidão daquela senhora ao lado, compadece-se dela, segurando em sua mão. Dona Leonor deixou rolar algumas lágrimas de emoção, porque tudo que não queria era partir sozinha...tirou do bolso da camisola um pedaço de papel e deu à moça, em seguida deu então seu último suspiro.

A moça vendo aquela senhora desfalecer ao seu lado, chorou e gritou pelas enfermeiras que chegaram prontamente.... a moça abriu aquele pedaço de papel e leu o que estava escrito em letras trêmulas e simples: “Sonhei que um anjo ia aparecer na hora da minha morte e que eu ia dá pra esse anjo uma coisa muito importante, se esse anjo aparecê eu vou entregá pra ele, mas se não aparecê vou ser enterrada com essa coisa comigo. Se está lendo esta carta é porque ocê é o anjo, pegue o meu travesseiro e leve ele cocê, despois na sua casa troque o forro dele.”

E assim a moça fez, achou delicado demais aquela senhora lhe ofertar seu travesseiro, que por sinal era grande e bem pesado. Ao chegar em sua casa a moça então preparou um outro tecido para forrar aquele travesseiro e começou a descosturar aquele tecido já velho e mofado, quando de repente em meio aos pedaços de espuma começaram a aparecer notas de dinheiro, várias notas , muito dinheiro! Ali estavam exatos um milhão de reais.












Alexandra Blandy
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