Os sentimentos alternam-se nesse apavorante momento. Desproteção e medo. O pânico rejeita qualquer pensamento de sobrevivência e coerência. Animalesco o assalto, desumano, vampiresco, desalmado....
Assombrante o reconhecimento: o mesmo coração batendo, tenso e oscilante, o reviver de fatos ingratos, injustos, ousados, e no entanto tão banal... tão parte do nosso cotidiano. Criticado, enfadado... tantos “ ados”... e nada de resultados.
Ali estava eu, à espera de um elevador onde no lugar do botão indicador, havia um buraco. É isso onde ele está? Ali, um lugar meio que abandonado, precisando urgente de reparos, um prédio pedindo socorro. Cheguei até mesmo a escutar o barulho de suas paredes gritando e gemendo: “ Socorro, Doutor, estou enfartando!”...
Os meus acompanhantes sugerem: “Vamos de escada?”
Eu, meio abestatalhada: “Quantos andares?”
Um deles responde: “três”.
Fazer o quê? – Pensei eu : “Vamos!
Após os três andares, fomos informados que era no outro andar. “Vamos lá. Coragem garota!” . Subi decidida mais um andar, em cima dos meus saltos altos, cada vez mais tentada a fugir e deixar tudo para trás.
Chegamos. Um homem com olhar fixo nos meus, falava e falava... Sou o delegado tal, substituindo a delegada tal, que se encontra numa delegação tal”. Após os “tal” , pediu que me preparasse para olhar no vidro para a tal da identificação. Coitado do meu coração! Minha alma de poeta despedaçada. Novamente me vinha à memória a cena do assalto, da rendição, de correr para cá e para lá.: Debaixo da mesa, no banheiro, depois na copa em meio a copos e copos de água com açúcar. Olhos espichados, esbugalhados, apavorados. Será que chegava nossa hora? Acho que todos pensávamos igual...
Agora não tinha mais jeito. Ao mesmo tempo que minha justiça me pedia que fizesse reconhecimento, meu medo era mais forte. E a “tal” da proteção da testemunha? Ah!... acho que isso aqui não funciona... E na hora do julgamento, do cara a cara, do frente à frente? Minha coração pede justiça mas minha razão não estava escutando o coração...
Alguém dizia: “É aqui, está vendo? Nesse “olhinho” aqui que você deve olhar.”
Eu suspirava: “Jesus, Ave Maria!”.
Olhei. Ali estavam caras disformes, estranhas e zombeteiras, caras debochadas, desumanas...
Mas uma vez suspirei, só que de alívio, ele não estava ali. Estranhamente senti paz.
Ele não estava ali. Melhor para mim. Tenho uma família de poesias para olhar!.