Antes de tecer comentário quanto à motivação do tema tratado neste livro, gostaria de agradecer imensamente as críticas e sugestões dos leitores da USINA DE LETRAS e diletos amigos. Foram-me, no seu todo, encorajadores e sinceros.
O texto que ora apresento objetiva divulgar o tema ambiental e defender projetos preservacionistas da fauna e flora da vegetação do cerrado do Planalto Central brasileiro.
Neste contexto, nesta versão resumida do conto AGUA RASA DO RIACHO FUNDO, o tema central é a descoberta do peixe: SYNOBÉLIAS BOTINEI (pira-brasília), nas margens alagadiças do Riacho Fundo, em Brasília.
É sempre bom lembrar, que, ocorrência desta espécie de synobélias, somente foi registrada no Planalto Central Brasileiro, mais precisamente, nas margens da bacia do Lago do Paranoá.
Um achado da natureza local que se encontra em via de extinção.
Ao Autor, fica atribuído o incansável e ininterrupto trabalho de pesquisa documental e de campo, e o desejo de redescobrir e preservar a espécie.
A.V.A.
CAÇADA AO PEIXE PIRÁ-BRASÍLIA
PRIMEIRO
O Planalto do Centro-Oeste brasileiro é uma região entre cortada por pequenos rios e riachos de águas cristalinas que correm em direção norte, nordeste ou sudeste. A vegetação nativa, conhecida como cerrado, é esparsa e não lhe comum produzir vegetação de grande porte. Contudo, a diversidade da flora e fauna escondem do visitante pouco esclarecido riquezas de valor inestimável.
São riquezas ainda não reveladas; são riquezas que o progresso não destruiu. São tesouros da mãe natureza.
Num certo entardecer de um certo domingo de um certo janeiro, muito além das copas verdejantes das árvores nativas da mata ciliar, o sol se esconde por trás de uma nuvem negra e propicia que a brisa produza frescor na pele. Uma mancha escura pousa por sobre a cabeceira do riacho e pinta de sombras a vegetação ribeirinha.
A sombra da quaresmeira, a sombra do pau-d’óleo, a sombra do angico; tornaram-se mais intensas. Uniram-se num abraço intransponível ameaçando com seus tentáculos medonhos o intrépido trio que teimava desafiar seus domínios. Do alto da galha do crapiá, uma coruja advertiu aos visitantes que suas presenças já não eram bem vindas.
As crianças não deram ouvidos à aquela criatura enigmática e de olhos assustadores, tão menos, à iminente ameaça de profunda transformações climáticas.
- Vamos para casa, Rogério!
- Psiu... Fica quieta sua tagarela! Tô pegando outro peixe.
- Mas, Rogério! Já faz muito tempo que saímos de casa...
- Psiu... Fica quieta! É só mais um...
A menina ficou calada por alguns segundos. Com dos dedos da mão esquerda fez figa para o irmão ser feliz no seu intento e, que se desse por satisfeito.
Suspirou em profundos suspiros.
Pouco depois, começou a se preocupar com as conseqüências das traquinagens daquele dia. Um corretivo não ficou de fora de seus pensamentos. Consultou o relógio. Constatou que já eram altas horas do dia.
“Esse tal de horário de verão me deixa confusa; poucos dias atrás, já seriam noite... Que saco!”, resmungou, ela.
Enquanto tecia seus queixumes contra a adoção do horário de verão que ocorrera na última semana, um grito ecoou na pequena mata:
- Rogérioooo!
- Eduardo! – exclamou, Janaína. - Nós estamos aqui, Eduardo! - tratou de responder pelo irmão.
- Ainda bem... pensei que vocês estavam perdidos. Onde está o Rogério, Janaína?!
- Estou aqui, Edu!, do outro lado do rio...
- Você ficou maluco; que faz nesse buraco?!
- Já peguei cinco peixinhos... Você pegou algum?!
- Não... nenhum. – respondeu o outro.
- Também... você não sabe pescar! - interveio a menina.
- Onde estão os peixes, Rogério? – quis saber o primeiro, sem se importar para as palavras ríspidas da menina.
O amiguinho que chegara assustado ficara radiante de curiosidade. Esqueceu-se da sua principal preocupação: o lobo que rondava aquela mata. Pelo que lhe contaram, o lobo sempre aparecia quando a noite caía e o homem do campo abandonava o trabalho de lavrar a terra.
- Onde estão nossos peixes, Rogério? – quis saber.
- Estão com minha irmã!
- Me dá os peixes, Janaína. – ordenou, com ansiedade desmedida.
- Não e não! Não vou dar peixe para um molenga como você.
- Sua magricela...! Os peixes são meus e do Rogério. Nós somos sócios!
- Mentiroso! Os peixes são do meu irmão. E você não é sócio dele coisa nenhuma!
- Sou sim! Nós somos sócios de pipa, de bola de gude, de figurinhas..., e somos sócios de peixe também!
- Sócio...! Sou eu que estou ajudando o Rogério... Os peixes também são meus!
Percebendo que Janaína estava irredutível, o menino Edu tratou de ser mais amigável.
- Está bem, sua boboca... Deixa apenas eu ver; não consegui pescar nenhum.
- Quem manda você ser tão feio, meu filho... Quando você entra na água até os peixes fogem de medo! – balançou as cadeiras, como sinal de deboche.
O menino fez menção de dar um cascudo na Janaína. Ela mais que depressa, gritou exigindo a proteção do irmão. Sabia que ele não lhe faltaria.
- Rogério, esse moleque me bateu!
- Pô! Eduardo... Já te avisei mil vezes para não mexer com minha irmã!
- Eu não fiz nada! Ela está com manha...
- Fez sim! Ele me deu um cascudo, com força. - fingiu choro.
O irmão assumiu o papel de protetor. Com a feição carrancuda, saiu do riacho esbravejando contra o amiguinho. Seu manual de boa amizade não previa a possibilidade de tocarem num só fio de cabelo da irmã.
O outro bem o sabia.
- Vamos embora! – gritou, o menino Rogério. - Vocês espantaram os peixes! – esbravejou.
- É culpa da sua irmã, Rogério...
- Para de chorar, sua manteiga derretida! - gritou.
- Mas ele me bateu!
- Bati não, Rogério. - defendeu-se o outro, como medo de briga. - Essa boboca está chorando à toa!
- Para de chorar, Janaína... Se a mamãe vir seus olhos vermelhos ela vai querer saber o que aconteceu.
- Então, vamos embora que prometo que não choro mais.
- Onde está o resto da turma, Edu?! – quis saber, Eduardo.
- Foram embora... Estavam com medo do lobo aparecer.
- Que lobo que nada; aqueles maricas fugiram da aposta. E porque você não foi com eles?! – complementou.
- Sou teu amigo... se a gente veio junto, têm que voltar junto!
- Valeu amigo, faria o mesmo por você.
- Vamos parar de conversa e vamos embora gente... Já são quase dezenove horas! – advertiu a menina.
- Já é tão tarde assim, Janaína! – interveio, o menino Eduardo. - Se for assim, vou apanhar da minha mãe!
- Tá vendo, Rogério... nós também vamos apanhar! – insistiu Janaina, ainda mais chorosa.
- Deixa comigo; conheço um atalho que vai levar a gente em casa num passe de mágica!
- Ah, é! Me conta como vai ser essa sua mágica? – indagou, Eduardo.
- Vai ser assim: a gente corta o caminho pela trilha do morro, e, vai sair lá na rua da escola!
- E as bicicletas?! - gritou, Janaína.
- Bom..., a gente vai ter que carregar nas costas. Mas é só um pedaço... Depois, dá para montar!
A trilha escolhida era íngreme. O solo arenoso não lhes garantia firmeza às passadas. Era um obstáculo a mais naquela empreitada. O obstáculo obrigou o trio a contornar pela rocha de pedras pontiagudas.
E assim, lá foram eles de morro acima, um de cada vez, uma bicicleta depois, depois outra, serpenteando por entre rochas e arbustos. Pareciam umas trupes circenses em intrépidos marabalismo na corda banda.
Por diversas vezes, o menino Rogério teve que fazer uso da sua voz de comando para manter o grupo unido e solidário. Os conselhos do avô, senhor Biu, formam-lhe sua taboa de salvação. Sem eles, não teria atingido seu intento: conduzir o grupo a salvo até a cidade.
SEGUNDO
Três ciclistas com suas máquinas reluzentes desafiam os limites da velocidade. Transformam os pequenos obstáculos em plataforma de salto para as rodas de aro e raios cromados. Audazes, trafegam no asfalto, nas calçadas de cimento, de pedra portuguesa, de cerâmica, de marmorite ou terra batida.
O suor da testa que caí nos olhos provoca ardor embaçando a visão. As bocas entreabertas auxiliam as narinas no trabalho de inflar e desinflar os pulmões em exaustão. As musculaturas dos membros inferiores se retesam e se contraem para manterem o movimento circular dos pedais. O rítmo é constante, a alegria incontida.
Para alívio de todos, quando cruzaram o portão metálico de cor grafite, não formam recepcionados com a ladainha costumeira. Quem os aguardava não era a mãe, nem tão pouco o pai, com o cinto na mão. Uma pessoa mais compreencível para com as suas peraltices de criança, aguardava-os, como sempre, paciente e doce.
- Bença, vó! - gritaram e correram para guardar as bicicletas.
- E o beijo da vovó!!
Com os braços estendidos no desejo de retribuir um abraço que recebera, a bondosa senhora estranhou a atitude dos netinhos. Eles sempre lhe foram muitos gentis e carinhosos. Que mal teria ocorrido... Será que fizeram alguma traquinagem que mereça um bom corretivo?!, perguntou-se, indecisa.
- O que aconteceu crianças?!
- Vó...! Não deixa a mãe passar corretivo na gente não, vó! - clamou a menina.
- Tenham calma, crianças... O que vocês fizeram de errado?
- Foi culpa do Marquinho, vó. - denunciou, abreviando o costumeiro interrogatório.
- Não estou entendendo nada... Quem é o Marquinho?!
- É o Marcos Paulo... Um amigo da escola. - informou o menino.
- O que foi que o Marquinho fez, Janaína?
- Foi ele que inventou a aposta, vó... A aposta de correr de bicicleta até o riacho! - falou, chorosa.
A vovó sorriu. Teve certeza de que havia alguma coisa mal contada naquela história. A experiência, levou-a a concluir que aquela não era a parte mais importante da história ou, pelo menos, não era toda a verdade.
Advertiu-se de que fato de mesma natureza já se passara com seus filhos. Eles também agiam da mesma maneira. Costumeiramente, o responsável era um coleguinha que morava distante. O quanto mais distante, melhor. E assim, ela não tinha como saber da verdade, e o tempo, encarregava-se de faze-la esquecer de procurá-la.
- Fiz um bolo gostoso crianças... Quem vai querer?! - todos aceitaram.
- Pode dar um pedaço pro Eduardo, vó?! - quis saber a menina.
- Claro! Onde ele está?
- Tá lá fora! Está como medo de ir para casa.
- Ora, mas porque?!
- Porque a mãe dele vai dar um surra e por no castigo. - respondeu o menino.
- Ele é seu amiguinho, não é, Rogério?
- É, vó... - respondeu, meio ressabiado.
- Então... – ela sussurrou, para que os demais não tomassem conhecimento de suas intenções.
Minutos depois, os dois amigos saíram correndo com a pequena vasilha de louça na não. Era um presente. Um mimo para abrandar um coração de mãe. As crianças ficaram tão felizes que esqueceram dos peixinhos e, pelo caminho, teciam planos para uma nova pescaria.
Do seu lado, vovó Antônia aproveitou para descobrir o que de fato ocorrera. A netinha era a pessoa mais indicada para lhe revelar a verdade.
Se bem, que, para proteger o irmão, ela fosse capaz de sustentar a veracidade das mais inventivas histórias. No entanto, também o sabia, que toda resistência seria quebrada com uma simples fatia de bolo. Uma simples, mas, enorme e suculenta fatia de bolo de chocolate branco.
- Quer mais bolo, Janaína?!
- Quero, vó... - falou com a boca cheia.
- Mas que gulodice, Janaína... Você não sabe que é feio uma mocinha falar com a boca cheia?!
- Estou com fome, vó...
- Fome? – interveio, de sobressalto.
- Fome de bolo, vó... Bolo de chocolate branco é o que mais gosto!
- Ah!, sua espertinha... Sua fome é maior que sua barriga. Mas não se esqueça que o bolo também é para o Rogério e a Jamilly!
- A Jamily é muito pequena, vó...
- Eu sei... Mas ela gosta de bolo tanto quanto você!
- Onde a mamãe foi, vó? – indagou, desconfiada.
- Ela foi ao supermercado com seu pai, mas logo volta.
- Ufa!, ainda bem...
- Agora... que minha netinha está de barriguinha cheia, senta aqui, no colo da vovó... E me conta direitinho está história da oposta.
- A corrida de bicicletas?!
- É...! E porque vocês chegaram tão tarde.
Janaína era uma menina amadurecida, sabia que mentir só traria maus resultados.
A mentira tem pernas curtas.
Mentir para vovó, nem pensar. Era ela que sempre atendia seus desejos, mesmo aqueles mais sovinas ou extravagantes.
Contou a verdade. Como tudo começou. E por causa de que, o menino Marcos inventou a tal aposta: INVEJA.
A competição compreendia uma corrida no percurso de ida e volta: da rua onde moravam até o riacho, e, do riacho até a rua onde moravam. Todavia, ninguém previra, que, quando lá chegassem, alguém lançaria idéia de tomar banho no riacho. E muito menos, aquela nova aposta de capturar peixinhos. Uma tarefa impossível ou quase.
Vovó Antônia não se satisfez com as explicações. Seus netinhos não costumavam faltar com as obrigações, principalmente, com as obrigações religiosas da matriz de Don Bosco. Deveria haver algo ainda não revelado.
- Foi só por causa da pescaria, Janaína?
- Não, vó... O horário de verão também foi culpado!
- O horário de verão, menina?!
- É vó... ele faz o dia ficar diferente...
- Como diferente? - quis saber, aos sorrisos.
- Não sei... Só sei que fica.
- Esta história está mal contada, explique-se melhor!
- Foi assim, vó: o Rogério mandou eu vigiar as horas para a gente não se atrasar... como estava claro, eu confiei no sol. Fui confiando, confiando; até que cansei de confiar: olhei no relógio e vi que já eram 19:10.
- 19:10... Que jeito mais complicado de falar das horas, menina. Quem te ensinou isso?!
- Está no relógio, vovó... A hora do relógio é assim! O pai falou que é digital.
Percebendo que a vovó estava desconfiada, mais que depressa, Janaína tirou o relógio do pulso, e exibiu seu mostrador reluzente. Tá vendo, vó!, disse, então.
Dona Antônia conferiu o relógio. Ele não possuía ponteiros; um ponteiro sequer. No seu lugar, havia um mostrador luminoso no qual podia ser lido horas e minutos. Não conseguiu esconder seu desassossego.
“Isso é modernice boba!, pensou. No meu tempo era mais fácil. Era só escutar os sinos da igreja para saber que hora eram...”
- Que horas são essa, Janaína?
- São 19:32... - como Dona Antônia fez cara de desentendida, apressou-se em explicar melhor. - São 07 horas e 32 minutos, vó!
- Ah! Bom... Agora entendi.
A menina sorriu entre os dedos, sabia que a avó não gostava daquelas coisas modernas. Das modernices como ela falava. Preferia o velho relógio de parede ou então, os sinos da igreja. A mordenice que a avó mais apreciava era o fogão. Este sim era de grande serventia. No seu tempo, era um contratempo preparar o cafezinho que ela tanto adorava; primeiro teria que ir no mato cortar lenha.
Ao contrário de Dona Antônia, seu Biu, apelido familiar do senhor Virgilio, patriarca da família, adorava as invenções modernas. Seu robe era construir máquinas copiando modelos que encontrava nas revistas técnicas. O fundo do quintal era o local predileto para montar suas invenções.
Um certo dia construiu uma máquina de debulhar milho. Enfiava a espiga de um lado e ela saia do outro já debulhado. Os caroços para um canto e o sabugo para o outro.
A invenção do vovô Biu era tão simples e prática, que até as crianças podiam operar aquela engenhoca.
A máquina de fazer milho de galinha, aquele foi o melhor divertimento que o vovô já inventou. Os meninos aprovaram. Quando chegavam as férias, passavam as manhãs ocupados naquela brincadeira benéfica para os habitantes do galinheiro. Enquanto um alimentava a máquina com espigas, o outro rodava a manivela, e o milho saía debulhado.
- Vovó... vovó... cheguei! - gritou o menino Rogério.
- Ainda bem... pensei que não ia voltar!
- Vó... não deixa a mãe por a gente de castigo não, vó... Eu prometo que não chego mais atrasado. - implorou, com cara de choro.
- Está bem crianças... Se prometerem que serão obedientes e estudiosos; a vovó vai ajudar seus netinhos queridos.
- A gente jura, vó... A gente jura! - pularam no pescoço da Dona Antonia, e foi abraços e beijos pra todo lado.
- Já chega crianças... Vocês vão derrubar a vovó! - implorou ela, sorridente.
- Vovó... você é a maior! A maior vovó do mundo!
- Está bem... Mas onde estão os peixinhos?
- Ih!, nossa! Esqueci dos meus peixes! - o menino saiu na disparada.
Dona Antônia aproveitou para separar uma grossa fatia de bolo para os netinho. Como a menina não tirava o olho da fatia de bolo do irmão, não teve como não dar outro pedaço para ela.
Janaína comeu como da primeira vez: com gulodice.
- Os peixes estão vivos, vó. Estão vivos! – gritava o menino.
- Ainda bem... Mas do jeito que você balança o cantil, acho que não vai ser por muito tempo... Quem teve essa idéia?
- Fui eu, vovó. - informou a menina. - Eu não queria que os peixinhos morressem de sede.
- Você teve uma ótima idéia, Janaína. Mas agora, precisamos de uma vasilha muito maior para colocar os peixes... O cantil não tem espaço suficiente!
Os meninos compreenderam a preocupação da vovó. Foram até a área de serviço e voltaram com o balde de fazer faxina cheio de água.
Dona Antônia aprovou aquela solução. Enquanto não fosse possível arranjar um recipiente mais aconselhado, teriam que improvisar um aquário. Despejou o conteúdo do cantil e os peixinhos ficaram nadando em circulo, procurando uma fuga ou esconderijo.
As crianças fizeram tanta algazarra ao verem aquela cena que acordaram a irmã mais nova.
Lá do quarto, ela gritou pedindo companhia:
- Mãeeeee!
- Ih, vó! A Jamilly acordou...
- Eu sei, crianças... a vovó vai cuidar da Jamilly.
- Vovó! Os peixinhos estão com fome.
- Com fome? Como você sabe disso Janaína?
- É porque eles estão com a boca aberta vovó... Tão comendo água!
- Mas que boboca... - interveio o menino. - Peixe é assim mesmo... eles ficam abrindo e fechando a boca para respirar. Não é vovó?
- É isso mesmo, Rogério!
- E peixe não tem nariz? - quis saber, desconfiada.
- Nariz até que têm, Janaína... Mas os peixes respiram pelas guelras...
- Ah!, bom... Pensei que eles não respiravam...
Enquanto a vovó foi buscar a irmã caçula, os meninos ficaram matutando uma solução para um problema: onde arranjar um aquário. Imaginaram, que, para viverem, os peixes precisavam de aquário. Já tinham visto alguns na loja do shopping. E todos eles, tinham pedrinhas, plantas e uma máquina que fazia bolhas de ar.
O balde não possuía nenhuma dessas coisas. Ficaram preocupados. Os peixes precisavam da máquina de fazer bolhas de ar. Não esperaram por mais tempo...
- Vovó, vovó! Os peixinhos precisam da máquina de fazer bolha de ar! - gritaram.
Dona Antônia desceu a escadaria correndo, apavorada com aquela confusão.
- O que foi meninos?! Aconteceu alguma coisa com os peixinhos?
- Eles vão morrer, vovó... os peixes precisam da máquina de fazer bolha de ar!
- Ora Rogério... Sua vovó nunca criou peixe para saber disso... Quem te contou coisa tão espantosa?
- Foi o homem do Shopping, vó! Ele falou que a máquina de fazer bolhas de ar é muito importante... Ela faz oxigênio para os peixes.
- Se é assim... A única coisa que nos resta fazer é aguardar que seu pai encontre uma solução...
Para felicidade de todos, os pais das crianças não tardaram a chegar. Foram recebidos no portão com aquela novidade e pedidos de uma pronta solução.
Dona Antônia, por sua vez, exigiu que o filho arrumasse uma saída para o problema. Os peixes não podiam esperar um novo dia.
Ciente do ocorrido, o pai tratou de arranjar uma solução que resolvesse o drama dos filhos. Obter um aquário. No entanto, não conhecia os rudimentos da arte de criar peixes; precisava do auxílio de alguém com experiente.
Naquele dia os meninos presenciaram dois extremos de uma mesma história: de um lado, o pai, orgulhoso da capacidade inventiva e determinação os filhos. E não era para menos, ele também já tivera seus bichinhos de estimação. De outro, a mãe, apreensiva. Não entendia por qual motivo as suas frágeis criancinhas foram fazer um passeio tão arriscado. Jamais permitiu que se afastassem de casa sem a companhia de um adulto. Aquela brincadeira nunca mais poderia se repetir. O riacho estava repleto de cobras, de monstros enormes e de perigos que duas crianças não sabem como enfrentar. Deu uma reprimenda nos filhos.
- Rozéio... me dá um pece... - pediu Jamilly, com vozinha infantil.
- A neném não sabe cuidar de peixinho... - acudiu o menino.
- Sei, sei, sei... Num sei... mamã...
- Sabe filhinha... A mamãe vai dar um peixinho para sua Jamilly...
- Tá vendo... ganhei um pecinho... seu bobo!
Todos sorriram. E a menina começou a bater palminhas e a cantar que ganhou, que ganhou, que ganhou um peixinho. Ainda fazendo graça, ela correu com seu jeito desengonçado e foi até a sala dar a boa noticia ao papai. Ele estava ao telefone, confirmando um encontro. Informando a quem estava do outro lado da linha que não iria demorar. Dez minutos eram o suficiente.
- Crianças! Já tenho a solução. O amigo Oinotna vai cuidar dos peixinhos até nós resolvermos o problema do aquário.
- Esse moço sabe cuidar de peixe, papai! - quis saber o menino.
- Claro, meu filho! Ele possui uma criação de peixes exóticos.
- Exóticos? - perguntou, desorientado.
- Sim... Criação de peixes raros.
- Será que ele tem o peixe que o Rogério pescou, papai?
- Não sei, filha... Mas tenho certeza que ele irá nos prestar todas as informações.
- A gente pode ir com o senhor, papai?
- Podem sim... Vão buscar o balde que o Oinotna nos espera.
Todos concordaram com a solução que o pai prepusera. Se aquele moço criava peixes exóticos, era bem possível que pudesse cuidar dos peixinhos das crianças, e quem sabe, ensina-los a também como o fazer. Era um bom começo...
TERCEIRO
O velho casarão de telhas enegrecidas que se escondia por trás da cerca viva de flamboiantes, era a residência do senhor Oinotna, o homem que criava peixe exóticos. Dois pastores alemães guarneciam a construção principal e o pomar de árvores frutíferas. Do terraço avarandado, podia-se observar o tráfego de veículos de carga ou passageiros que tomavam o rumo da sede da fazenda Sucupira. Do pomar, colhia-se caju, carambola, goiaba, jabuticaba, abacate e outros frutos de árvores diversas.
Aquele oásis de fartura, sabores, perfume e cores, já rendera, no passado, ao seu bem feitor grande e pequenas inimizades. Mas no dias de hoje já não lhe causavam tantas desavenças e intrigas. Não quem não saiba: não se deve invadir os domínios do velho lobo.
Quando lá chegaram, mal cumprimentaram o dono da casa, os meninos correram para o grande aquário que enfeitava a sala. Seus olhinhos brilhavam de encantamento. O aquário estava repleto de peixes de várias cores e formas. Alguns possuíam caldas coloridas. Outros, calda tão pequena que pareciam ser rabicós. Em outro recipiente, havia um que de tão cumprido parecia ser uma cobra. Mas não era. Era um peixe muito especial para o dono da casa. Ele o chamava de peixe da boa pescaria.
O menino Rogério analisou o aquário central durante vários minutos. Teve certeza: aquele homem sabia criar peixes.
O recipiente tinha pedrinhas, plantas e duas eficientes máquinas de fazer bolha de ar. Uma luz tênue fazia os peixes rebrilhar na transparência da água.
Tudo era impecavelmente organizado e limpo. Era lindo.
- Papai... Os peixinhos vão ficar neste aquário?
- Não sei, filho... o senhor Oinotna é quem sabe.
- Felizmente não, meu rapaz. – interveio o dono da casa. - O tio tem um mais apropriado para eles... Eles precisam de um berçário!
- Berçário? Berçário não é para bebê? - quis saber a menina.
O senhor Oinotna sorriu. E foi um sorriso profundo. Um sorriso que fez sua alma ficar mais suave. Com passadas largas, foi até um canto da sala e retornou com um cubo de vidro na mão.
- Dê uma olhada neste crianças...
- Um aquário de peixe bebê!
- Isso mesmo, minha menina... Somente quando seus peixinhos ficarem forte e crescidos eles podem conviver com os maiores.
- Quando eles vão ficar grandes, tio? - quis saber o menino.
- Foi você que os pescou, meu rapaz?
- Foi sim, seu Oinotna. Pesquei lá no riacho!
- Bom... Primeiro precisamos descobrir a qual espécie e família eles pertencem.
- E peixe também tem família? – quis saber a menina.
- Têm, crianças... É por meio das espécies e famílias que os estudiosos classificam e dão nomes aos peixes...
À medida que o senhor Oinotna ia explicando, as crianças ficavam ainda mais boquiabertas. Jamais imaginaram que criar peixes fosse uma atividade tão complexa e bonita. E, quanto mais aprendiam, quanto mais queriam aprender com ele.
Tudo transcorria tranqüilamente até o momento em que os peixes foram transferidos para o aquário. Quando a luz refletiu nos peixes, revelando-lhes suas cores e formas, houve um silêncio. Ninguém creu no que via. As crianças ficaram hipnotizadas. Os homens pasmos.
- Chegue mais perto... meu rapaz. – pediu Oinotna, com brandura.
- Eles são bonitos, tio...
- São... São muito bonitos...
- Aqueles dois são diferentes, papai!
- Estou vendo, filha... São os mais bonitos.
- Meu rapaz... Em que parte do riacho você os encontrou?
- Encontrei num riozinho que tem lá!
- Que riozinho?
- Um riozinho que tem no meio do mato, tio.
O senhor Oinotna ficou pasmado.Não conhecia a localização daquela nascente que o menino lhe falava. Se os peixes foram colhidos num regaço, aumentava em muito a chance de suas suspeitas estarem corretas.
- Amigo Oinotna! – interveio o pai. - Que diferença faz se os peixes foram encontrados no riacho ou num regaço?
- Muita, amigo... Muita! - e sorriu de contentamento.
- Se é assim, essa descoberta é importante?
- Bem... Não posso afirmar com toda certeza. Mas, creio que as crianças encontraram um peixe raro.
- É por esse motivo que o amigo está tão sorridente?
- É!, preciso fazer alguns estudos e consultar algumas pessoas. Mas tudo me leva a crer que é o peixe pirá-brasília.
- Pirá-brasília... Eu nunca ouvi dizer que existisse um peixe com esse nome!
- Existe... – confirmou o outro. - Ele foi descoberto por volta de l959.
- Imagine você... Em 1959, foi quando meu pai mudou-se para cá.
- Para você vê... Foi exatamente no ano em que o peixe foi descoberto.
- E qual a importância da descoberta do meu filho? O riacho deve está cheio desse peixe!
- Aí que você se engana, amigo. Para os pesquisadores, ele encontra-se extinção.
- Extinção? Então essa é uma descoberta fenomenal! Se for confirmada, é claro.
- Possivelmente. E se for; será um final feliz para uma história triste.
- Estão conte-nos! Estamos todos ansiosos para conhecê-la. Não é crianças?
Todos concordaram. E não era para menos. A possibilidade da descoberta de um peixe raro estava muito além das suas expectativas.
Se a captura dos peixinhos já fora uma aventura inesquecível para as crianças. Imagine a euforia quando descobriram que poderia se tratar de um peixe raro. A emoção era indescritível.
Após revirar seus arquivos à procura de notas científicas, o senhor Oinotna pôs-se a contar como se dera a descoberta. Disse ele então:
“ - Foi por volta de 1955, que o então administrador do Jardim zoológico, senhor José Boitone, encontrou o peixe no córrego do Guará, próximo à área do Zôo. Na primeira descrição científica o peixe ficou registrado com o nome de Synposonchtys. Posteriormente, o Dr. Eduardo Kunze - biólogo e professor da Universidade de Brasília, constatou ser um Cynobelias. A partir de então, ganhou o nome científico de Cynobelias Boitonei e nome vulgar de pirá-brasília (peixe de Brasília).”
A partir daí, a voz do narrador ganhou um tom melancólico:
“- Daquele tempo para cá, o habitat natural do peixe sofreu terríveis depredações. O crescimento desordenado da cidade, a poluição dos riachos e a drenagem que vem sendo feita na região dos brejos; são as principais causas apontadas para explicar o desaparecimento do peixe”.
- Mas, tio! Quer dizer que o peixe que tinha morrido ressuscitou? – indagou o menino.
- Espero que sim, meu caro Rogério. Se for verdade, a descoberta que vocês fizeram me é de grande importância. Por isso mesmo preciso da colaboração de todos para fazer um mapeamento da região...
- Eu quero ajudar, papai! – interveio a menina.
- Eu quero capturar mais peixes, papai! – o menino.
- Vamos com calma, crianças. Amanhã é dia de escola... Primeiro precisamos conversar sobre o assunto com a mamãe!
- Se o senhor for com a gente... ela vai concordar!
- Que posso fazer, Oinotna. Acho que entrei numa enrascada!
- Acho que o amigo não vai ter como se sair dessa. De qualquer maneira, podemos marcar para o próximo final de semana. Assim, as crianças poderão participar sem ter que encabular aulas.
- É uma boa idéia, senhor Oinotna. Fica combinado; no domingo pela manhã nós vamos procurar o peixe.
- Então, fica combinado... Enquanto isso, vou me aprofundar mos estudos e fazer uma visita preliminar ao local.
A reunião terminou festiva. A proposta de no próximo final de semana o grupo efetuar uma expedição fora aprovado por todos.
O objetivo maior era coletar dados que revelassem os pontos de desova. Se possível, novos levinos.
EPÍLOGO
A semana mal havia começado e o senhor Oinotna convocou uma reunião de emergência. Precisavam conversar e fazer planos para uma ação imediata. Os últimos acontecimentos não poderiam esperar o próximo final de semana. Tudo poderia estar perdido até lá.
No dia e hora marcado, toda a família se fez presente. Todos queriam saber do ocorrido e ajudar no que fosse preciso. O futuro estava nas mãos deles.
- Amigos!... – palestrou Oinotna, procurando esconder a emoção. - Convoquei esta reunião para informar que o local onde o menino Rogério encontrou o peixe vai se transformar em área de plantio. Conversei com o responsável pelo trabalho de drenagem do terreno e, a muito custo, prometeu-me adiar o início da obra por um dia. Só temos um dia para vasculhar toda a área e encontrar o peixe! – gritou, em tom dramático.
Ante o anúncio daquela sentença, a sala ficou em silêncio. Cada qual, desejoso de que alguém pudesse anunciar uma pronta solução para o caso. Todavia ninguém, por mais encorajador que fosse seu desejo de salvaguardar o peixe pira-brasília, não se atreveu a quebrar aquele silêncio mórbido.
Foi então que a menina Jamilly largou a chupeta e gritou:
- Quelo pece, quelo pece!! - e todos sorriram.
Vovó Antônia foi a segunda a falar; ofereceu-se para preparar lanche e refresco.
Por sua vez, as crianças sugeriram pedir a colaboração dos coleguinhas.
Os adultos aprovaram a sugestão; ficaram de obter autorização dos pais daqueles que se dispusessem a ajudar naquela empreitada.
O último passo, era organizar uma expedição de forma ordeira. Esta era a tarefa do senhor Oinotna, o mais experiente.
E foi assim, que na manhã seguinte, a comitiva partiu logo cedo. O sol mal havia nascido e eles já estavam procurando o peixe. Passaram o dia naquela caçada. Nada encontraram. Nem um vestígio sequer.
Quando o dia acabou e a noite se fez presente, o senhor Oinotna anunciou o fim da expedição. Disse que não havia mais o que fazer. Que fora um trabalho inútil.
A alegre comitiva retornou emudecida. Estavam exaustos e decepcionados com o resultado.
No portão, vovó Antônia os aguardava para uma suculenta ceia. Café, leite, suco de frutas e um saboroso bolo de chocolate que ela mesma preparou. Prevendo que a comida no estômago não seria suficiente para afastar a tristeza do semblante de cada um, procurou levantar a moral da equipe dizendo:
- Nada estão perdido, crianças! Os peixinhos do aquário são a prova de que o pirá-brasília ainda vive! - previu, semeando esperanças naqueles corações tristes.
O senhor Oinotna concordou com ela. E todos ficaram mais animados. Esperançosos de que, numa outra expedição, eles pudessem ser mais felizes. Havia outras áreas a serem visitadas. O próximo final de semana era o dia mais indicado. E todos foram de acordo.
- Amigos... hoje foi um dia cansativo... quero agradecer a todos pelo empenho e dedicação; nunca imaginei que encontraria tantas pessoas preocupadas com a preservação de nossa fauna. No entanto!... – continuou ele, meio enigmático. -...preciso neste momento dar duas notícias: uma não muito confortante... mas de esperanças...
Um silêncio de atenção preencheu a sala. As crianças ficaram esperançosas. E os adultos, preocupados com a reação dos filhos.
O senhor Oinotna continuou:
- ... posso afirmar que os peixes maiores não são o pirá-brasília... Os três maiores são Ruvulídios. Uma espécie muito comum na região. No entanto, quanto aos menores...
A platéia ficou ainda mais emudecida. Cada qual, à sua maneira, remoendo seus presságios. Ninguém previu um resultado negativo.
- ...considerando que ainda são pequenos e, considerando que não desenvolveram as barbatanas de maneira a possibilitar um julgamento preciso; temos de aguardar alguns semanas para chegarmos a uma conclusão...
- Quantas, tio? - quis saber o menino Rogério.
- Duas... Duas semanas são suficientes.
- Qual a importância das barbatanas? - quis saber o pai.
- Bem... as barbatanas dorsais do pirá-brasília possuem certas particularidades que nos permitem fazer uma identificação precisa...
- Como assim? - gritaram todos, em única voz.
- As barbatanas do macho são maiores, possui um maior número de raias. Este é um detalhe muito significativo na sua identificação.
- É só isso? - perguntou uma mãe, preocupada.
- Claro que não! Existe outro detalhe também importante... No entanto, que me lembre, esse é o mais marcante na sua espécie.
- E se não for o peixe que procuramos? - insistiu ela.
- Não posso afirmar com toda certeza... Mas, se não for o pirá, certamente será uma espécie ainda não catalogada.
- Tio Oinotna... Se o peixe não é catalogado, como o senhor fala; posso ficar com ele?
- Claro, meu rapaz! Não só pode, como deve escolher um nome para ele.
- Quer dizer que ele pode se chamar pirá-rogério-brasília?
A platéia sorriu e bateu palmas. O peixe poderia se chamar Synobelias-Rogério ou, Synobelias- amigos do pirá-brasília. Uma homenagem a todos. Todos mereciam reconhecimento por tamanho esforço e dedicação para com a causa do peixe pirá-brasília.
Voltaram para casa aliviados. A esperança não morrera. No aquário do senhor Oinotna viviam duas esperanças. Possivelmente, um casal de pirá-brasília.
Duas semanas passam rápido. Não custa esperar. A lição daquela aventura não será esquecida tão cedo.
Para alegria de todos, o grupo manteve-se unido. Uma semana depois, fundaram uma Organização de proteção ambiental, tendo como metas: lutar pela preservação do meio ambiente, proteger a fauna e flora do cerrado, e transformar a bacia hidrográfica do Riacho Fundo no parque ecológico da cidade.
RESERVA ECOLÓGICA DO PIRÁ-BRASÍLIA, era o nome mais festejado.
NOTAS DO AUTOR:
1) A região, onde, supostamente, o pirá-brasília foi reencontrado, encontra-se em avançado processo de devastação ambiental. Como sempre, a civilização é a principal causa.
2) Se no todo, esta é uma história fantasiosa, não posso afirmar o mesmo do peixe pirá-brasília, há quem o diga que ele é uma lenda. Outros, como eu, que uma lenda não rebrilha na transparência do aquário.
CONSIDERAÇÕES DO AUTOR:
1) Este livro esta em processo de revisão; críticas e sugestões serão bem vindas.
ANTONIO VIRGILIO DE ANDRADE
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