A CASA NO ALTO DA MONTANHA - FINAL
Quando finalmente abriram a porta o que surgiu diante de seus olhos foi algo inacreditável para aqueles homens simples do campo, acostumados a uma vida regada aos preceitos da religião cristã. Aquilo não poderia ser coisa de um ser humano, dotado de razão e consciência; aquilo só poderia ser coisa de um monstro ou de uma aberração da natureza.
Do outro lado da porta havia um portão de grades. Era um portão de grossas barras de ferro trancado com um enorme cadeado. Quem o colocou ali, queria ter certeza de que o que fosse trancafiado não tivesse a menor possibilidade de escapar. Mas não foi isso de chocou tanto os invasores.
Aquele compartimento do subsolo parecia mais com uma prisão. Era envolto por resistentes grades por todos os lados. O espaço era amplo, quase do mesmo diâmetro da casa. Via-se num dos lados três colchões estendidos no chão, forrados com lençol verde-musgo; um travesseiro e cobertas em cada um deles. Ao meio, havia uma mesa retangular de madeira, dessas que encontramos em bares e restaurantes. Na outra extremidade havia um banheiro improvisado com chuveiro. Não havia divisão alguma naquele salão. A iluminação era a única coisa que não deixava a desejar.
De pé, diante da grade de ferro, estavam três crianças: um menino de aproximadamente dez a onze anos e duas meninas um pouco maiores. O menino vestia somente uma sunga e as meninas uma camiseta branca cuja medida não correspondia ao porte físico das mesmas. Devido a longuidão da camiseta, não era possível saber se elas usavam outra peça de roupa. Ambas as crianças estavam descalço.
Aquela cena chocou profundamente aqueles homens. Como alguém poderia prender crianças assim como se fossem animais. Ainda mais aquelas crianças tão belas. Apesar de estarem despenteadas, via-se que a beleza foi um fator preponderante na escolha daquelas vítimas. Mas, mal sabiam aqueles homens que as histórias que as crianças tinham para contar eram bem mais estarrecedora.
A primeira providência foi tentar encontrar a chave para abrir o portão de ferro. Tentaram todas as chaves e nenhuma delas serviu. Quem as trancou não quis correr risco algum e preferiu levar a chave consigo. Essa foi a primeira constatação.
Ao se darem conta de que os dois homens poderiam salvá-las, as crianças entraram num estado de euforia tão grande que não paravam de implorar que as tirassem dali. Por mais que o Sr. Francisco e o Sr. Zé Pedro pedissem calma, elas pareciam não ouvi-los. “Por que seqüestraram os três juntos? Será que é para pedir um regate maior?”, pensou o Sr. Zé Pedro. Até aquele instante achavam que aquilo se tratava tão somente de um seqüestro.
-- Vamos ter que arrombar este portão – disse o Sr. Francisco.
-- È, não tem outro jeito! – volveu o outro. – Eu sabia que tinha algo errado com essa casa desde o começo.
-- Fiquem calmos que já vamos tirar vocês daí – pediu o Sr. Francisco. – Vá até lá fora e vê se acha alguma coisa para arrombar esse portão, homem!
-- Não é melhor chamarmos a polícia em Juiz de Fora?
-- Depois a gente faz isso. Vamos tirar essas crianças daqui primeiro.
Enquanto o Sr. Zé Pedro foi procurar uma ferramenta para quebrar a fechadura do portão o Sr. Francisco tentava acalmar as crianças.
Quando ele voltou com um pedaço de madeira na mão, viram que não conseguiriam nada com aquilo.
-- Não achei nada que sirva. O jeito é voltar lá em casa e trazer a caixa de ferramentas – sugeriu.
-- Então faça isso! – disse o outro. – Eu vou ficar com as crianças para acalmá-las e tentar descobrir mais alguma coisa sobre os seqüestradores. Aproveite e peça a Dona Rosalva para chamar a polícia na cidade.
O Sr. Zé Pedro saiu e o outro ficou com as crianças.
Após conseguir acalmá-las, ele conseguir interrogá-las. Elas contaram tudo o que havia se passado. As narrativas eram as mais chocantes possíveis. Lágrimas corriam de seus olhinhos assustados enquanto descreviam os momentos terríveis vividos desde o dia em que foram seqüestradas.
Então ele ficou sabendo de tudo que precisava saber. As crianças foram seqüestradas em dias e locais diferentes. Não se conheciam até se encontrarem prisioneiras no subsolo daquela casa.
O objetivo dos seqüestradores não foi um resgate, como chegaram a pensar os dois homens, mas usa-las na produção de material pornográfico. Tanto é que as crianças tiveram manter relações sexuais entre si e com os mesmos homens que as raptaram enquanto eram fotografadas.
Segundo a narrativa das crianças, um homem vinha a cada três dias para saber se estavam bem e trazer comida. (“Por isso havia tantas embalagens de bolachas e refrigerantes no lixo do lado de fora da casa”, pensou Sr. Zé Pedro.) Não tinham certeza do horário, mas tanto ele como os outros chegavam sempre no horário em que estavam dormindo. Por isso, era o momento mais terrível do dia. Ficavam apavorados só de imaginar que seriam acordados com a presença daqueles homens.
As crianças contaram que, quando vinham para fazer alguma coisa com elas, vinham sempre quatro homens: um era um homem meio velho, gordo e que fumava um charuto. Ele devia ser o chefe de todos, porque foi o primeiro a manter relações sexuais com as duas meninas; outro também era um homem não muito novo, era magro e gostava de obrigar as meninas a fazer sexo oral, e era também o que mais as machucava. Os outros dois eram rapazes mais novos. Um gostava ficar só brincando com as meninas, era delicado com elas e procurava não machuca-las. O outro não gostava de meninas, o negócio dele era o menino.
Segundo o menino, cujo nome era Daniel, o rapaz levava-o para um dos quartos da casa e fazia de tudo com ele; desde fazer de conta que o menino era sua namorada até fazer de conta que o menino era seu namorado. Segundo seu relato, quando o rapaz fazia de conta que o menino era o homem não era muito ruim, mas o contrário era a ruim demais. Apesar de trata-lo com delicadeza e fazer o possível para não machuca-lo, doía muito quando era a mulherzinha do casal.
Rafaela, a menina mais velha, disse ter 13 anos e segundo ela, em uma das oportunidades, foi obrigada a se deitar com os dois homens mais velhos de uma só vez. Foi o pior momento que passou naquela casa. Chegou a pensar que ia morrer quando foi obrigada a se deitar de bruços e, enquanto o homem gordo mantinha relações com ela, o outro a obrigou a fazer sexo oral consigo. Eles se divertiam enquanto ela sentia vontade de vomitar com aquela coisa grande e horrorosa na boca. Mas quando o deleite de sabor horrível foi parar entre seus lábios ela não pode conter o vômito. Por causa disso, levou umas bofetadas.
As crianças contaram também que faziam isso uma vez por semana e que depois ficavam tão machucadas que sentiam dores durante três dias. Nesse ínterim mal conseguiam caminhar e ir ao banheiro era uma tortura. Descobriu-se também que as crianças não eram de Juiz de Fora. As duas meninas eram da capital fluminense e o menino de Três Rios.
Quando as crianças ainda faziam o relato das atrocidades por que passaram nas cinco semanas aprisionadas naquela casa, o Sr. Zé Pedro chegou com as ferramentas para liberta-las.
As crianças foram levadas para Santa Paula até que a polícia chegasse. Quatro horas depois do chamado, duas viaturas cruzaram a rua principal do distrito. Então as crianças foram interrogadas novamente, para se descobrir os responsáveis por aqueles atos indignos de qualquer ser humano.
Horas depois os quatro acusados eram presos em suas próprias casas. Na casa do rapaz homossexual foram encontradas as provas definitivas: centenas de fotografias mostrando a violência com as crianças, CDs de computador e aparelhos para cópias de gravação desses CDs. Além disso, uma lista contendo dezenas de nomes de pedófilos espalhados por vários países também foi apreendida.
O incrível de tudo isso era que os acusados eram pessoas pertencentes à alta sociedade de Juiz de Fora e do Rio de Janeiro. Os dois homens mais velhos eram empresários bem sucedidos e pais de família. Dr. Albérico, o proprietário do imóvel, o senhor gordo, o mais velho de todos era um médico pediatra e administrador do maior hospital de Juiz de Fora. Além disso, era pai de quatro filhos e avô de nove netos.
A prisão dos acusados causou tamanha comoção na cidade, que tiveram que ser transportados para uma prisão no Rio de Janeiro para não serem linchados.
Atualmente os acusados aguardam julgamento e as crianças foram devolvidas às suas famílias. Devido ao trauma, fazem tratamento psicológico duas vezes por semana.
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