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Contos-->O FIM DE UM SOSSEGO -- 08/07/2003 - 20:43 (Edmar Guedes Corrêa****) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O FIM DE UM SOSSEGO

Havia um camponês que vivia numa casinha bem simples ao lado de uma cachoeira. Era um homem solitário, sem esposa e filhos. Mas era um homem feliz assim mesmo.
Seu pequeno pedaço de terra lhe dava quase tudo que precisava para viver. Quase nada precisava comprar na cidade. Na verdade, odiava a cidade. Só ia mesmo quando precisava comprar ou vender seus produtos. Dizia que a vida na cidade não era vida.
Próximo à casa, havia muitas árvores e pássaros. Durante todo o dia era uma cantoria sem fim. Era uma mistura de sons que deixava o coração daquele homem cheio de contentamento.
Durante muitos anos ele viveu na sua casinha, levando aquela vidinha simples, a qual não trocaria por nada nesse mundo.
Não era de muitos amigos. Raramente aparecia alguém a lhe procurar. Às vezes, passavam-se meses sem que visse alguém. Mas isso não o incomodava. Se não tinha com quem conversar, conversava com seus animais e até com as plantas. Falava com os pássaros como se eles fossem capazes de entender tudo que dizia. Dedicava seu amor, que deveria dedicar a um semelhante, às plantas e aos animais.
Era um homem tão bom que até os pássaros vinham comer junto com ele. Quando estava tomando o seu café da manhã, almoçando ou tomando o café da tarde estava rodeado por pássaros a comer as migalhas de pão ou grão de arroz. Divertia-se atirando colheres de arroz para seus amigos e vê-los em arrolhos disputar os grãos.
Certo dia apareceu no seu pequeno pedaço de terra um estranho. Nunca havia visto aquele homem gordo, de barbas longas, usando terno e exalando um perfume forte. Vestia-se tal qual os moradores da cidade.
Ele chegou num carro preto, muito bonito. Perguntou pelo dono daquelas terras e o camponês disse que eram dele.
Depois de algumas trocas de informações, o homem disse:
-- Eu estou interessado em comprar suas terras. Por quanto o Senhor quer vendê-las?
-- Mas eu não quero vender elas – respondeu o camponês surpreso. – Essas terras são a minha vida. Estou feliz aqui. Por que eu ia querer vender elas?
-- Ora, Senhor Francisco! O senhor já não é mais um homem moço. Está na hora do senhor descansar e levar uma vida melhor. Com o dinheiro da venda da terra poderá comprar uma casinha na cidade e viver de sombra e água fresca – explicou o homem.
-- Mas eu já levo a vida que pedi a Deus. Não preciso de mais nada.
-- O senhor está enganado!
-- Não, não estou!
-- Mas eu gostaria de comprar as suas terras – insistiu o homem.
-- Mas eu não quero vender nada – foi categórico.
Os dois homens ficaram discutindo ainda por muito tempo. O estranho querendo a todo custo lhe comprar as terras e o senhor Francisco não querendo vender.
Finalmente o homem decidiu ir embora, mas deixou uma proposta tentadora para o Senhor Francisco pensar e disse-lhe que o procuraria dali a um mês.
O estranho cujo nome era Teotônio de Oliveira foi embora, mas aquela proposta ficou a tirar o sossego daquele homem simples, que nunca teve muito com que se preocupar.
Ao passar dos dias, Francisco ficava mais e mais remoendo aquela proposta. E ela o obrigava a fazer uma série de conjecturas. Será que realmente era um homem feliz? E o que era a felicidade? Uma vida tranqüila na cidade não seria melhor do que ter que levantar cedo todos os dias para ganhar seu pão? Essas e tantas outras interrogações passaram a ocupar seu pensamento. E ele que nunca fora um homem de esquentar a cabeça com tais ninharias, agora não estava preparado para elas.
Francisco, homem tranqüilo e calmo que enfrentava as adversidades como se fossem provações, como estas fossem formas de lembrar ao homem que a felicidade é uma dádiva de Deus, agora já não era mais. Perdera todo o seu sossego. E isso o tornou um homem irrequieto e até impaciente.
E seu desassossego foi refletindo no seu dia-a-dia. Aos poucos, seus pássaros passaram a não lhe fazer companhia durante as refeições. Era como se uma força invisível os tivessem afugentado. Agora até as migalhas de pão sobravam espalhadas pelo chão. E aquele lar feliz tornou-se lúgubre.
De um momento para outro tudo principiou a dar errado com ele. Primeiro foi uma forte tempestade que destruiu boa parte de sua colheita. Dias depois, um incêndio atingiu as pastagens de seu vizinho e acabou queimando também parte das suas. Durante todos aqueles anos, nunca isso havia acontecido; agora duas desgraças de uma só vez. O que seria aquilo? Uma provação de Deus? Ele não sabia. Havia dúvidas demais em seus pensamentos.
Teotônio de Oliveira retornou no dia combinado. Francisco nem conseguira dormir na noite anterior e estava em péssimo estado. O visitante chegou a pensar que ele estava doente.
-- O Sr. não anda se sentindo bem? – indagou o visitante.
-- Não é nada não! – respondeu ele.
Durante alguns minutos os dois homens trocaram algumas palavras como forma de arrumar um jeito de tocar no delicado assunto. Mas tanto um quanto o outro não viam a hora daquilo acabar. Por isso, a pergunta que destruíra o sossego daquele homem simples do campo finalmente foi feita.
-- E o Sr. pensou na minha proposta? – Inquiriu o visitante.
-- Pensei! Mas resolvi não vender a minha propriedade. Acho que, se eu ficar longe dela, eu acabo morrendo. Durante toda a minha vida eu vivi nesse pequeno pedaço de terra. Ele faz parte de mim assim como eu faço parte dele. Portanto eu não poderia vender ele de jeito nenhum. O senhor me desculpa, mas terá que procurar outro pedaço de terra para comprar. Há muitos por aí que estão querendo ver...
Teotônio de Oliveira ouvia de cabeça baixa, como que pensativo, as justificativas do proprietário. Não o interrompeu de deixou que ele finalmente terminasse de falar.
-- Entendo seu lado. Suas terras despertaram-me um interesse muito grande, mas não vou persuadi-lo mais. E me desculpe por ocupar seu tempo e vir importuná-lo – disse por fim, como que preparando para partir.
Francisco sentiu-se aliviado ao ver que o visitante entendia seu ponto de vista.
-- Então tenha boa sorte, amigo! – despediu-se o Senhor Teotônio de Oliveira, indo em direção ao carro.
-- Até mais – disse o outro.
E assim aquele homem que só apareceu na vida do Sr. Francisco para atrapalhá-la foi-se embora de vez. “Agora não há mais com o que se preocupar”, pensou ele, ao voltar para dentro de casa.
Mas não foi isso que aconteceu.
Os dias foram passando, e aquela dúvida não saia de seu pensamento. Será que aquela vida na cidade não lhe seria melhor? Já não estava na hora de parar e tentar viver o resto dos anos que ainda lhe faltavam? Mas deixar tudo isso? Tudo que construiu durante toda a vida? Essas e outras perguntas continuavam a importunar todos os dias.
Sua vida não foi mais a mesma. Os pássaros não voltaram e o prazer de conversar com as plantas desapareceu. Em pouco tempo, ele passou a não zelar mais pela sua propriedade e o mato começou a tomar conta. Quem visse aquela propriedade, certamente diria que estava abandonada. Em sua cabeça só pairava aquela dúvida, mas ele não tomava nenhuma iniciativa.
Cerca de um ano depois da última conversa com o Senhor Teotônio de Oliveira, Francisco foi dormir, como fazia todas as noites, e não acordou mais. Terminavam ali aquelas dúvidas que o consumiram por longos meses.

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