Tempos modernos e cada vez mais as pessoas moram ou trabalham em edifícios. Por conta disso, dizem que é difícil não conhecermos alguém que nunca tenha ficado preso no elevador. Mas meu caso beira o ridículo, pois tenho um amigo que não faz outra coisa a não ser ficar preso em elevadores. Das que me lembro, já passaram de meia dúzia.
Só não vou falar que é um azarado para não nivelar o caso por baixo, não lhe dando a devida importância. Acho mesmo que este caso seja mais profundo, talvez transcendental. Talvez alguma relação divina há na vida deste meu amigo. Pombas! Humanamente é impossível alguém ficar tantas vezes preso.
Caso a divindade seja procedente, o que me intriga, no entanto, é o porque da dádiva: benção ou maldição? Ora, seja ela qual for, aparentemente, não lhe traz nenhuma vantagem ou desvantagem perante os outros mortais. Bem, quando Deus está no jogo, nota-se um diferencial.
Se ao menos em alguma das vezes ele ficasse preso com alguém interessante, ou sei lá, o tempo trancafiado o livrasse de apuros... Mas que nada, geralmente ele fica só e acaba se aquietando à medida que a rouquidão vai surgindo em sua garganta desesperada.
Começo a concluir que a razão da maldição ou benção talvez esteja no fato de Deus ter um excelente senso de humor e, porque não dizer, apiedar-se de mim, que de quando em vez preciso de inspiração para escrever meus textos.
Brincadeiras à parte, o que mais chama a atenção é que este meu amigo desconhece toda e qualquer atitude a ser tomada em momentos assim. Ora, isso passa a ser algo impraticável, pois uma vez que alguém tenha passado por tantas experiências, já era para ter adquirido, no mínimo, um pouco de traquejo. Advertências como: “Mantenha a calma. Os elevadores de hoje em dia e suas normas de manutenção garantem um alto nível de segurança”, ou: “Os freios funcionam mesmo se a energia for cortada”, entre outras, são deixadas de lado para dar espaço a um sonoro: Socorro! Socorro! acompanhado de murros e pontapés.
Enfim, e aqui aparece o motivo desse texto, dia desse ele veio aqui em casa – moro no 25º - e ficou preso mais ou menos no 24º ou 23º por cerca de 20 minutos. Foi a maior gritaria, o maior vexame, e graças a isso, todos do 23º para cima, já sabem que no 25º mora um cara chamado Anderson que sabe ligar para o 193 como ninguém.
Ele é gente boa, não é alto, tem estatura mediana, pele parda e usa óculos. Se ele estiver em seu destino, caia fora, não entre junto com ele no elevador. Uma dica para identificá-lo: pergunte sobre o Edifício Manhatan no Itaim Bibi. Se começar a suar e a tremer pode ter certeza de que é ele.
Mas, se não notá-lo, se as circunstâncias passarem despercebidas – e já que falamos de dádivas divinas lá no inicio desta história – recomendo ter em mente o episódio de Jonas, o profeta, que ia para Társis e levava, como era o caso, uma maldição junto daqueles que iam com ele:
“Então, os que estavam com Jonas, clamaram ao Senhor e disseram: Rogamos que não pereçamos por causa desse homem! E levantaram a Jonas e o lançaram ao mar; e cessou o mar de sua fúria”.