Sentiu-se como uma pluma levada pelo vento, arrastada sem rumo e sem destino. Sem saber onde iria parar, parou de se preocupar. Nada mais fazia sentido, não detinha o controle, nada podia. Só sentir a umidade do ar e os primeiros raios do dia que nascia.
Seu olhar perdia-se na multidão que passava e não notava que, logo ali, uma pequena pluma transmutada em gente se encolhia, medrosa, diante do imenso vazio de sua vida. Procurava nos olhos fugidios algum resquício de humanidade, de solidariedade, de amor. Só o que via era um vazio maior e mais triste encoberto pela ignorância das razões reais. Tudo o que buscavam era a sobrevivência de mais um dia, sem notar que isso de nada valia, pois já não viviam.
Pensou no tempo em que a sua própria ignorância a fez acreditar ser possível continuar a busca por uma vida mais feliz. Felicidade? Oras, como podia ter sido tão estúpida! Nada a levaria a esse encontro, nunca, nunca. Desesperada, percebia que, de cima daquele prédio, tudo parecia menor e mais bruto, estúpido. O vento soprou e trouxe até ela o cheiro fétido da cidade que crescia e se perdia, para sempre, dentro do seu próprio crescimento. Percebia também que a noite caía e as pessoas voltavam para suas casas, tristes, sombrias, esperando que o próximo dia fosse mais feliz, mesmo sabendo que não seria.
Dessa vez o vento foi mais forte e passou zunindo e fazendo voar seus longos cabelos e passou novamente e mais forte e cada vez mais zunindo mais e mais alto e encobrindo-a de poeira e lágrimas, de soluços e medos, de esperanças perdidas e perdidas palavras. O vento soprou, agora fraco, e ela pode então tirar os cabelos do rosto molhado de tristeza e dor. Olhou os carros que escasseavam lá embaixo, as luzes refletindo as gotas de chuva que começavam a cair, o silêncio quebrado pelo seu coração pulsante e pernas trêmulas. Como uma pluma levada pelo vento, voou. Sentiu-se leve, respirou profundamente o ar da madrugada e fechou os olhos. Mas dessa vez sabia onde o vento a levaria.