Eu sou mais frio que aço
Tenho pouca paciência
Arrebento, bato e amasso
Sem nenhuma consciência
Em qualquer ato que faço!
Eu só deixo o bagaço
Faço tudo sem clemência.
02.
Matar tá na minha essência
Faço isso à vida inteira
Nunca fiz uma indulgência
Sou da família pereira
Já nasci com essa sina
Uma maldição malina
Meu trabalho é de primeira.
03.
Minha lei é minha peixeira
Eu ponho o fato pra fora
Se vem me falar besteira
Ou coisa fora de hora
Sou nervoso e violento
Já matei cabo e sargento
Sangro e depois vou embora.
04.
Não respeito nem senhora
Se minha bílis dissolve
A minha raiva estoura
Minha bondade remove
Fico por conta do cão
Enfrento até um dragão
Se duvidar venha e prove.
05.
Até uso um revolver,
Mas é só pra derrubar
Bala pra mim não resolve
De faca é que vou matar
Se o cabra corre de medo!
Fica cagando no dedo
Eu atiro e vou buscar.
06.
Gosto mesmo é de sangrar
Já despachei mais de cem
Depois parei de contar
O ultimo foi em Belém
Tanto faz homem ou bode
Vei pro meu lado se fode
Eu mando logo pro além.
07.
Eu não provoco ninguém
Não quero ser provocado
Bater boca com alguém
Prefiro ficar calado,
Mas se pisar no meu calo
Deixo o defunto no valo
Na calcada ali deitado.
08.
Eu já matei um bocado,
Mas não sou justiceiro
É da profissão que falo
Sinto-me como guerreiro
Numa guerra diferente
Onde só homem valente
Sobrevive e fica inteiro.
09.
Eu só mato por dinheiro
Também na minha defesa
Eu sempre ataco primeiro
Na manha e na esperteza
Sou matador profissional
Diplomado nesse mal
Eu só mato na certeza.
10.
Meu tiro tem à firmeza
De pontaria e qualidade
Eu nem estrago a beleza
Ajo com simplicidade
Eu gasto só uma bala
É minha faca quem cala
Sem fazer perversidade.
11.
Eu não gosto de maldade
Não deixo o cabra sofrer
Eu mato com brevidade
Digo porque vai morrer
Falo quem mandou matar
E mando o cabra rezar
Sem nunca me arrepender.
12.
Se você quiser saber
Onde pode me encontrar
Não me pergunte cadê
Que resposta não terá
Procure por ôi de gato
Pode gritar dentro mato
Quando quiser contratar.
13.
Sou mei louro e sarará
Olhos cor de gasolina
Sou baixo que nem preá
A compleição é franzina
Eu sou cria do nordeste
Um grande cabra da peste
Com essa sanha assassina.
14.
Meu frio olhar alucina
Ninguém baixa meu facho
Se bebo uma cagibrina
Logo encomenda despacho
Só não mato em dia santo
Para não causar espanto
E nem ser cara de tacho.
15.
Sou pequeno, mas sou macho!
Não tenho medo de nada
Esse fato d’eu ser baixo
Não me faz perder parada!
Eu brigo feito um leão
Ataco de supetão
Sou como cobra criada.
16.
Se recebo uma empreitada
Primeiro estudo a questão
Na estratégia traçada
Sigo minha intuição
Preciso odiar à pessoa
Se o cabra é gente à-toa
Sua vida não vale um tostão.
17.
Meu ídolo foi lampião
Meu santo foi um romeiro
Aprendi lá no sertão
Meu Padim foi conselheiro
Que a vida não vale nada
A pessoa é uma coitada
Se ela não tem dinheiro.
18.
Um dia fui boiadeiro
Eu gostava de aboiar,
Mas matei um companheiro
Que vei me desacatar
Fugindo nunca parei
No crime eu me encontrei
Depois passei a gostar.
19.
Um dia eu vou encontrar
Um cabra bem mais valente
Que vai tentar me matar
Se morrer, morro contente!
Minha morte é sem sentido
Sou apenas um bandido
Não vou ficar pra semente.
20.
Mas vivo sou insolente
Tô pro que der e vier
Na minha mira potente
Mato homem ou mulher
É só acertar o preço
Pagar-me o que mereço
Mato quem você quiser.
21.
Certo dia em Canidé
Chamaram-me na fazenda
Pertencente ao coroné
Que por ali era uma lenda
Queria me contratar
Por isso mandou chamar
Oferecendo-me uma prenda.
22.
Um cabra matou na venda
Num dia de bebedeira
Numa sangrenta contenda
Cumpadi Chico Vieira
Homem bom e generoso
Morto por João raposo
Por falar uma besteira.
23.
Coroné Pedro Nogueira
Homem rico e poderoso
Não era de brincadeira
Era um cabra reimoso
Tinha jagunços demais
Mas nenhum era capaz
De matar João Raposo.
24.
Por ser muito perigoso
João Raposo era temido
Deixava o povo nervoso
Por ser cruel e atrevido
Coroné mandou matar
Chamou-me pra liquidar
Aquele outro bandido.
25.
Aceitei o seu pedido
E me larguei na procura
Onde estivesse escondido
Seria a sua sepultura
Podia ser bem valente,
Mas comigo é diferente
Eu sou rei da amargura.
26.
Comigo é linha dura
Logo jurei o rapaz
João era grande figura,
Mas Ôi de bila era mais
Já tava na sua pegada
Ele não sabia de nada,
Mas iria vê satanás.
27.
No rastro eu tava atrás!
Sua hora tava chegando
Não o perderia jamais
Sabia que tava caçando
Deram-me uma notícia
Mandada pela policia
Onde João tava morando.
28.
Numa casa se amoitando
Escondido no serrado
Já estava me esperando
Por alguém foi avisado
O cabra era ardiloso
Tinha parte c´o tinhoso
E me esperava armado.
29.
Esse João era safado
Um bandido experiente,
Agora tinha encontrado
Um para arrancar seu dente
Ou matava ou morria,
Mas dali eu só sairia
Depois de matar serpente.
30.
De manhã ao sol nascente
O cabra vei no terreiro
O sol já estava quente
Quando atirei primeiro
Dei um tiro no joelho
O sangue desceu vermelho
João caiu num berreiro.
31.
Caído ali no barreiro
João Raposo chorando
Puxei a faca ligeiro
Sua goela fui sangrando
Depois a orelha cortei
Para o coroné levei
Prele ficar acreditando.
32.
Eu fui embora cantando
Como se fosse vaqueiro
Tangendo e aboiando
Um cantador seresteiro
Olho amarelo de gato
Eu me embrenhei no mato
Sumindo na catingueira.