Sôdade! Doce ilusão
Que não se pode intendê!
Só quem sabe é o coração
O quanto ela faz sofrê!
Prantada na mininice,
Cresce pula vida intêra
P ra fulorá na veíce,
Dando fruto e simentêra.
Quanto mais se passa os ano
Mais a sôdade viceja.
Na quadra dos disingano
É quando ela mais safrêja,
Rimuendo as isperança
Qui o tempo carregou...
Quando tudo era bonança,
Felicidade e amô.
Cada quá traz uma dita
Mode cumpri nêste mundo.
Mas quando a sorte é mardita
Tudo se vai num sigundo.
Cai pru terra as aligria,
O gosto de se vivê,
E tudo é malinculia
Inté a gente morrê!
Um véio qui nem eu sou,
Disgastado pulos ano,
Dê pru visto uma fulô
Pintada in riba dum pano,
Qui o tempo vai apagando
Pouco a pouco, sem se vê
E a fulô vai dismaiando
Inté disaparicê.
Quando eu falo do passado
Boto a mão no coração!
Pruquê nele tá gravado
O nome de Cunceição!
Pornunciando êsse nome
Sinto a voz istremecê
Um má istá me consome...
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E choro sem vê de quê!
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Oios preto, cativante,
Cabelos qui nem viludo,
Cunceição tinha um sembrante
Qui pr a mim valia tudo!
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Finarmente, um belo dia,
Nós resorvemo se amá...
Nas jura qui nós fazia
Prometemo se casá!
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A mãe dela era uma santa,
O pai, um home de bem.
Minha aligria era tanta
Qui pr a juntá uns vintém,
Trabaiava o dia intêro
Na luta da prantação,
Mode arrumá o dinhêro
Pr a casá no São Juão.
Minha vó, uma véinha,
(Qui Jesus te chame lá),
Certa vez dixe que tinha
Um consêio pr a me dá.
Sigurou na minha mão
E dixe, quaji a chorá:
"Meu fio, cum Cunceição"
"Vancê não deve casá"
"A moça que vancê qué"
"Cum tanta sastifação"
"Tem o corpo de muié"
"Mas não pissue coração".
"É farsa cumo ninguém!"
"Não tem um tico de amô"
"Pru vancê, qui lhe qué bem".
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Dixe isso e se calou.
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Jurgando sê caduquice,
Coisa munto naturá
Nas condição de veíce,
Dexei o causo passá.
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Teve razão, minha vó,
In falá daquele jeito...
Um gorpe munto pió
Iscurraçou o meu peito!
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Cunceição me dispresou
Pru um ricaço de fóra!
Cum pouco tempo casou,
Dispidiu-se e foi-se imbora,
Dexando a dô da sôdade
No meu triste coração!
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Hoje eu me jurgo um cadarve,
Um solitáro infiliz...
Eu sou qui nem uma arvre
Apartada da raiz!
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A mágua de tantos ano
Inda veve a me afogá
No lago dos disingano
Sem qui eu possa me sarvá!
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E quando, na solidão,
Dêste meu triste pená,
Me alembro de Cunceição...
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Eu canto pr a não chorá!