Prá quem não conhece as cidades do sul do Espírito Santo devo explicar que a cidade de Muqui é pródiga em amabilidades com seus visitantes. Na verdade eu não conheço gente mais acolhedora do que aquela. Aliás a afirmativa não é só minha, mas tantos e tantos que se encantaram e se encantam até hoje com o tratamento fidalgo que sempre receberam daquele povo amigo.
Pois é... e foi respaldado nessa fama que certa vez pintou por aquelas bandas um tipo excentricamente original. Muito falante, finíssimo, e que se dava alo luxo de trajar casimira inglesa. Sim casimira inglesa porque a historia se passou há algum tempo atrás. Portava uma mala alinhadíssima de couro de jacaré que devia que devia pesar, no mínimo, uma tonelada... e foi o homem saltar do trenzinho prá começar a receber as honras devidas à s altas personalidades que a cada cem anos aportam na Cidade-Menina, cognome que até hoje não sei de onde saiu. Alvoroço total, com os mais entusiasmados dando pulinhos de alegria.
-Pega a mala do doutor. Providenciou um diligente cidadão. A dita acabou indo de carroça porque o que tentou sozinho baixou hospital com torção na coluna...
-Leva o homem prá casa do Prefeito. Atalhou outro que devia ser, no mínimo, do partido contrário porque imediatamente alguém chiou: - Prá casa do Prefeito uma ova! Tá pensando o quê? O homem é importante e tem de ser bem tratado...
- Pró hotel, então. Consertou. Leva pró Hotel Santa Terezinha que é Hotel de classe e pode receber até rei.
Era mesmo o melhor da cidade... E único...
E foi chegando autoridade. Delegado, Vereadores... Até o santo pároco veio.
-Cadê a banda? Perguntou um garotinho que tava grudado no homem.
Teve até um outro, mais eufórico, que assanhou carregar o dito no colo. Levou a maior bronca.
-Tá maluco ó cara? Num tá vendo o tamanho do bruto? Emendou um magricela que parecia o organizador oficial desses eventos.
E a coisa tava nesse pé quando o visitante resolveu se apresentar, encorajado por tanta prova de reconhecimento... E veio a farta distribuição de cartões bordados a fio de ouro: "DR GODOFREDO LINHARES- Pesquisador Cientifico"
Acercou-se o Prefeito prá entregar a chave da cidade.
-Tem de benzer... Tem de benzer... Era o padre.
Vai daí que o Dr. Linhares, muito do compenetrado já perfeitamente entrosado, quis apresentar a carta de recomendação do Presidente da República. Foi impedido veementemente. Ainda insistiu. Não muito, mas a verdade é que esboçou o gesto.
-De forma alguma Dr. Num precisa mostrar nada que a sua palavra aqui é lei.
Aí, já identificado, idolatrado e respeitado, providenciou um pequeno discurso dando conta dos motivos de sua visita à quela encantadora cidade. É que a região fora escolhida pelo governo para ser a sede de pesquisas de plantas raríssimas que existiam nas redondezas... O novo satélite americano Vivaldus I é que descobrira...
-Taí, eu sabia que o cara era um missionário. Disse logo o magricela- o tal organizador oficial -.
Houve até quem insinuasse que o sujeito tinha sido assistente do Dr. Osvaldo Cruz... É... Aquele mesmo...
-Então esse cara não é o Dr. Linhares, é o Dr. Matuzalém. Emendou uma professorinha, muito da gostosinha, que olhava tudo muito desconfiada e muito na gozação... É, porque as menininhas de lá também são muito amáveis, mas muito vivinhas...
O magricela quase teve um troço.
-Cala a boca que você num entende dessas coisas. Vai ver as plantas do homem são rejuvenescedoras...
Voltou o garotinho: - "Ué, vai ver fez plástica. Papai num fez? De saída levou um bufetinho pela observação.
E a coisa ficou nesse diapasão durante um bom par de semanas. Enquanto o Dr. Linhares procurava a fonte da juventude ia achando a fonte do colesterol, através dos frangos amanteigados que exigia dos diligentes hoteleiros e aproveitava para vender seus produtos naturais e infalíveis aos pacatos e atenciosos moradores.
Se ele achou as plantas?
Bem, achar plantas rejuvenescedoras eu tenho absoluta certeza de que o Dr. Linhares não achou. Muito menos a fonte da juventude, mesmo porque certo dia de manhãzinha o "cientista" saiu prá pegar amostras silvestres e acabou foi pegando o trem das 5 horas e deu linha...
O final é esse mesmo porque até ontem o "pesquizador"não tinha aparecido prá completar seu trabalho, embora tenha entrado para os anais da historia da cidade.