Como sempre, o relógio despertara à s 05:30 da manhã. Assustei-me, não com o estridente barulho, mas com a pressa em que a noite se fóra, mesmo gostando de despertar-me cedo, aproveitando melhor a manhã. Mas naquela, como em todas outras sextas-feiras, o pote de energia já se esgotara a tal profundidade que uma noite apenas não o reabasteceria.
Lembrei-me logo do "Rinoceronte bem-sucedido". Um livro de Scott Alexander. Daqueles que o mundo corporativo usa para escravizar paulatinamente a mente e o comportamento de suas marionetes. Daí, em pensamento, bradei: Eu sou um rinoceronte! Lavei meu espesso couro, escovei meu chifre, comi um chumaço de ervas e me preparei batendo e removendo a terra com minha grossa pata cascuda para ultrapassar as barreiras e desafios daquela selva. Os compromissos inacabados, as expectativas dos clientes, as pressões da empresa, a imperfeição dos coordenados.
Mal terminara a manhã e a dor ardia meus ombros e cacunda. Acelerava meu ritmo imaginando passar ligeiro o dia. Toda sexta-feira carrega consigo a pressa, como se nela o mundo acabaria. Mas em mim o que sempre está latente é a exclamação célebre do saudoso conterràneo Tancredo Neves: "Meu compromisso é com a liberdade!". Ao ideal da Inconfidência Mineira, gravado em sua bandeira, adiciono por conta de meu próprio ideal a paz, a tranquilidade, a serenidade, o vagar, o sossego. _ Um viva aos despachantes! Nesta sociedade que nos engole e aprisiona, pago com meus melhores e mais produtivos anos o preço de meu ideal. A motivação sem entusiasmo que ergue as toneladas do rinoceronte.
O safári acabava e o balanço era inevitável. Escapado das lanças dos invejosos, da flechas dos traidores, das balas dos ditadores, prepararia o próximo em minhas mensagens, planilhas, gavetas e arquivos. O duro e espesso couro do rinoceronte não se feriram. Mas seu cérebro parecia ter encolhido na capacidade de pensamento e raciocínio. Uma vitória apenas. O sucesso estaria por vir. Talvez no sábado e no domingo.