Interessante, há pessoas que são menos importantes do que seus traços fisionómicos: a boca, os olhos, o cabelo, as pernas torneadas, a voz... Pois bem, no quadro vivo da memória, tudo quanto ele pode relembrar daquela moça são os seus olhos. É como se, de repente, ela já não tivesse rosto, apenas os olhos saltando e dominando as visões do passado. E, como eram os olhos dela?
Olhos marinhos, sem dúvida, daquela cor que tem o mar profundo sob céu escampo e sol de estio. Cismadores, talvez, refletindo uma tristeza de etiologia ignota, marca indelével de pensamentos constantes sobre a vida.
E ele, criança, ficava imaginando as estações daquelas olhos, o que se passava com eles ao longo de um dia: nas brincadeiras, nos isolamentos, nas orações, nos estudos, nas descobertas.
Depois, um belo dia, ela sumiu. Nunca mais pode vê-la, rever aqueles olhos enigmáticos e belos.
Mas, no seu pensamento, vez por outra, perpassam visões daqueles olhos, mais importantes até do que sua própria dona.