Ela vem se aproximando lentamente, sem que nos apercebamos pois, ingênuos e prepotentes, não acreditamos na sua chegada ainda que certos de que virá. Mas por tão indesejada, acabamos por ignora-la. E é então que quase de repente a sentimos. E a temos frente a frente. Vem para ficar. Não há retorno. Não há como exorcisa-la. Alguns de nós tentam oculta-la, outros diminuir sua força destrutora. Uns fingem que não a sentem. Mas ela lá está, cada vez mais próxima, fazendo-se presente, irónica, feia, anti-estética. Cutuca-nos aqui e ali, machucando-nos. Provoca desconforto. Tapa-nos os ouvidos, embaraça nossos olhos, enevoa nossa mente. Priva-nos de nossa força e de nossas ambições. É perversa com nossa vaidade. Interrompe o caminho para cima e aponta-nos o sentido inverso. Posta-se como cruel muralha entre nós e os outros. Mas de tudo o pior é que cobre-nos com uma lamentável sombra, tornando-nos quase invisíveis, reduz o som de nossa voz conduzindo-nos aos limites da mudez. Atira-nos aos recantos da insignificància e nos condena à solidão. Só a morte lhe opõe.
Fevereiro de 2004
Daniel Carrano Albuquerque
E-mail: notdam@bol.com.br