MÃE, ENGOLI A CHAVE
Diz que era um menininho desses que a mãe deixa na escola período integral, porque não quer tê-lo por perto por mais de quatro horas por dia. Mais do que isso, só se ele estiver dormindo (uma judiação) e a professora tem sempre uma desculpa para faltar à s aulas porque quer vê-lo menos que a mãe.
Tiago, o nome do menino. Foge da sala, invade as outras salas, mexe com as outras crianças, uma relíquia!
Corre pelos corredores, ganhando a liberdade podada pela professora, mas que, exausta, desiste da dura tarefa de colocar Tiago sentado prestando atenção à aula. Cinco anos apenas, que rendem à professora e à mãe cinco anos a mais acrescentados em seus rostos cansados e derrotados.
Invencível, este é o melhor adjetivo para meu personagem.
Mas, vamos à história. Lá estava Tiago brincando no quintal com os primos - e nem precisa dizer como eram as brincadeiras - um empurrão ali, outro puxão de cabelo aqui. Uma priminha chorando, outro correndo para a mãe dizendo ter perdido um brinquedo para aquela belezinha de primo. Um doce de fato.
Eis que depois de minutos brincando, Tiago agarra-se à saia da mãe relatando calmamente:
- Mãe, engoli a chave.
Mas a mãe nem prestava atenção na conversa do garoto que insistia:
- Mãe, engoli a chave - silêncio ainda.
- Mãe, engoli a chave.
A mãe impaciente retruca:
- Já chega, Tiago, você sempre inventando histórias. Vá brincar com seus primos.
Ele, percebendo que a mãe não estava mesmo interessada, voltou a brincar e a história da chave morreu ali.
Horas depois, já no fim do dia, a mãe de Tiago resolveu levar as crianças para passear no parque da cidade. Todo mundo pronto. A euforia era grande. O passeio prometia. As crianças já esperavam no portão, mas Dona Ilza, mãe do Tiago, demorava-se além do esperado. Eis que nosso garotão, já impaciente, grita:
- Vamo, mãeeee. Que demora!
A mãe aparece na janela revirando a bolsa e diz:
- Filho, você não viu a chave do portão? Não consigo encontrá-la!
- Ah! Mãe, eu não disse que engoli?
Cleo Piva
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