É domingo, tarde morna de outubro, estou em casa, dedilhando o teclado do computador, enquanto minha mulher, sentado no sofá do nosso dormitório, lê Shakespeare citado no livrinho que lhe foi ofertado há um ano atrás, quando estivemos em Brasília, aconselhando os leitores a tomarem certas precauções para não se decepcionarem nos embates da existência.
A um só tempo, recordamos os dois aqueles momentos agradáveis no Planalto Central.As pessoas simples e boas que nos serviram, as horas alegres que marcaram os árduos dias de trabalho durante minha convocação. Sentimos saudades, que adquirem proporções gigantescas porque hoje é domingo, estamos em casa, estamos sozinhos os dois e o telefone não tocou, ninguém nos procurou durante o dia, trazendo aquela sensação de solidão que só não nos incomoda mais porque estamos juntos, um apoiando o outro para espantar os pensamentos desgarrados por páramos inquietantes de abandono e desprestígio.
Construímos diariamente o nosso mundo, cujas fronteiras se alastram ou encolhem na proporção em que os nossos desejos e sonhos se expandem ou se recolhem em dimensões cambiantes que interferem até no nopsso equilíbrio emocional.
Seguramo-nos as mãos, passamos energia um para o outro. Olhos nos olhos repartimos as nossas inquietações, abraçamo-nos, sentindo cada um o calor que vem do outro e, aos poucos, readquirimos a confiança abalada.
Cai a noite suavemente. Um sino distante anuncia para os fiéis a hora da missa domingueira. Passa um jato barulhento cortando o céu de Fortaleza.
O cordão de luzes da Beira Mar ilumina a noite recém-chegada. Há velas enroladas e barcos dormitando sobre a areia morna da praia.
O sono vai chegando lentamente...Amanhã, bem, amanhã,apesar de toda a monotonia, será um novo dia.