O Rio de Janeiro é pródigo em folclore e casos interessantes, lembrados da infància. Melhor dizendo: o Brasil é riquíssimo em folclores e casos, que constituem uma parte de seus encantos. Mas também somos os criadores do folclore, de tal maneira o correr de nossas vidas vai fazendo brotar casos e coisas que servem para o enriquecimento da história e das histórias.
Por volta dos anos entre 1850 e 1920, o Estado do Rio de Janeiro começava a sua efervescência política e social. E os portugueses, que mais se concentraram no Rio, deram ensejo para a criatividade carioca, surgindo as velhas "piadas do português".
A Cidade ainda não tinha sofrido a devassa do operoso Prefeito Pereira Passos, empossado em 1903, homenageado justamente com o nome da conhecida Rua Passos, no Centro da Cidade. Portanto, o Rio era um caos, com seus quiosques nada higiênicos, com suas ruas mal calçadas, mas tomadas de um burburinho causado pelos "negociantes" portugueses, com trouxas à s costas, ou puxando seu carrinho de mão contendo as mercadorias que pretendiam vender.
O carrinho de mão não era empurrado, como os carrinhos de hoje, mas puxado, como se fossem carroças. Daí os cariocas apelidarem os portugueses, puxadores desses carrinhos, com o humor que os caracteriza: "burros sem rabo".
Lembrei-me dessa passagem folclórica quando escrevia meu livro "A CULTURA DA BURRICE, E as Questões Político-Sociais", onde analisei a maneira como o Brasil vem sendo governado até hoje, a ponto de, potencialmente rico, viver dependente, submisso ou subserviente, com a estima abaixo do fundo do poço.
Não é para lembrar dos burros sem rabo?
O Rio de Janeiro foi um dos Estados que mais recebeu a imigração portuguesa, por óbvias razões. Afinal, era ali que ficava o Paço, de onde D. Pedro fingia que governava; era ali que se situava a Capital do Brasil, deslocada, desde cedo, da velha Bahia; era ali que o movimento comercial marítimo era mais intenso; e era em seu porto que desembarcavam muitos dos imigrantes, vindos de todos os lados, especialmente do País colonizador.
Cedo, os cariocas (nome indígena que significa, segundo alguns, "a casa do europeu ou a casa dos brancos"), como são conhecidos os habitantes da Cidade do Rio de Janeiro, cismaram com os portugueses, pessoas de modo geral com pouca ou nenhuma instrução, mas que, para viverem, tinha que "se virar", na linguagem chula. E se viraram bem, participando ativamente do comércio, como açougues, quitandas e armazéns "secos e molhados". Mas, ao lado do tratamento amistoso, dos anos mais recentes, surgiram as implicàncias manifestadas pelas "piadas do português".
Pois não é que a puxada do carrinho de mão ensejou o apelido de burros sem rabo?