Sempre preferi as noites em que não me lembro de nada ás noites inesquecíveis. Provavelmente nas noites em que nada lembro a emoção e aventura tomou conta, foi essencial, natural. Agora as noites inesquecíveis parecem monótonas, sem graça, calmas e tranquilas, inofensivas. Louvo os bêbados, que despedaçam a madrugada destilada em movimentos largos, alvoroçados, bruscos e mágicos, como a dança de um cisne manco e alcoolizado. Companheiros de bar, de bebedeiras insanas, aqui vos agradeço por tantos momentos; esses sim inesquecíveis. Troco o pór do sol na praia com fogueira, violão, papo cabeça por horas num bar sujo e despedaçado, repleto de artistas comuns, populares, que sonham a vida simples, movem-se torpes, dizem maluquices, dizem forte. Se formos analisar friamente as diferenças a luta se torna injusta, e tudo que é desgraça se torna vida.
Identifico-me com os humanos, aqueles verdadeiros, que vivem no limiar do desespero, pronto sempre a se jogar, a pular no abismo do momento, do segundo, do instante. Louvo as putas nas ruas, damas tóxicas repletas de maquiagem e olhar distante. Louvo os miseráveis, com sua sinceridade extravagante e pureza quase santa. Louvo os mendigos, com seus olhos esbugalhados diante da beleza do instante. Louvo os bêbados, com sua intensidade vulgar e quase dramática. Louvo a vida simples, aquela em que amantes da mesma se jogam em arriscadas jornadas sem volta, apenas uma estrada de mão única, prontos sempre pra luta, pra derrota. Meu corpo abriga o desespero, a desgraça, a grosseria inocente, sempre com uma làmina na mão pra rasgar o tempo e abrir no mesmo grandes rios de sabedoria popular, sem intelectualidade, só conhecimento construído apenas por uma incoerente observação descontrolada.
Cansei de pedir, esperar. Hoje meto o pé na porta e mato inocentes, usurpo tronos, canto á morte, sagaz e inquieto, sequioso, descrente, perigoso e atroz, distante dentro, quase uma doença, jogando pra todos lados uma coisa nova, uma coisa intensa. Não tenho tempo pra meios termos; sempre só quis o limite, a ponte, a linha tênue que separa a insanidade completa da caretice mórbida. Desculpe se te magoei, mas a probabilidade de se magoar ao meu lado é praticamente total. Não gosto da calma, tranquilidade, serenidade, sempre busquei e vivo no limite. Ou morro ou mato!
Procuro fazer as pessoas que me rodeiam viver no limite de si mesmo, sempre me arriscando a perder amizades, simpatia, pra poder fazer algo grande, valioso, não somente ombro amigo, palavras confortantes, bobagens inúteis. Arrisco-me a ser odiado por um certo tempo, mas logo percebem que não estou aqui pra pouca coisa. Não suporto o meio termo, não aceito a vaguidão lànguida de uma vidinha plena, satisfatória, burocrática. Luto, brigo, grito, xingo pra poder proporcionar em minha vida, em nossas vidas um instante de paixão, de explosão, e quem convive comigo sabe que o limiar se encontra em cada esquina de minhas borbulhosas palavras atómicas.
Se não suportas, que pena, afaste-se que realmente sou mais perigoso que podes imaginar.