(RELÓGIO NÃO MARQUE AS HORAS, de Antonio Miranda. Oitava crónica da série*)
8
AERÓBICA
Vicente é um fisiologista desportivo, com doutorado em sua especialidade. Está sempre sorrindo. Somos vizinhos nas Residências, vivemos no mesmo bloco. O meu apartamento fica no último andar e não tem telhado. A laje recebe todo o sol do dia e transpira um bafo quente, africano, das savanas.
A avenida interna é um verdadeiro parque tropical com palmeiras, unhas-¬de-vaca, flamboyants e buganvílias. Numa dessas caminhadas para a Universidade, Vicente ofereceu-me carona. É uma pessoa comunicativa, prestativa. Fez questão de convidar-me para uma festa com o seu grupo de ginástica e para participar dos exercícios. Trabalha com assistentes que o auxiliam nas caminhadas e na tomada da pressão arterial e do pulso. Minha pressão deixou Vicente muito preocupado: 14 por 10. Muito alta. Fiquei um tanto deprimido por participar, pela primeira vez, de um grupo da "terceira idade", embora os exercícios estejam abertos a pessoas de todas as idades.
O corpo é um instrumento sujeito à ação do tempo e a saúde é funda¬mental para manter o organismo em funcionamento. Vicente garante que vou rejuescer dez anos com a continuação dos exercícios.
- Por las dudas me voy a pintar el pelo ... disse-lhe em tom de brincadeira: - Mas ele falava sério.
A gente Pensa em juventude como fonte de energia, de prazer, mas Vicente, provavelmente, associa a bem estar e equilíbrio com a natureza. Ficou muito feliz ao saber que não fumo nem sou aficionado das bebidas alcoólicas. Que levo uma vida saudável, regrada, embora excessivamente sedentária.
-------------------------------------------------
Próxima crónica da série: (9) OLDIES
Para ler toda a sequência inicie pela crónica (1) VÓO NOTURNO.
Iremos publicando as Cronicas que vão constituir uma espécie de romance,
paulatinamente.Semana a semana... o livro impresso já está esgotado...
Sobre a obra e o autor escreveu José Santiago Naud: "A agudeza do observador, riqueza do informe, sopro lírico e sentido apurado do humor armam-no com a matéria e o jeito essenciais do ofício. É capaz de apreender com ternura ou sarcasmo o giro dos acontecimentos e deslizes do humano. Tem estilo, bom senso e bom gosto, poder de síntese e análise assim transmitindo o que vê e o que sente, nos transportes do fato ao relato, para preencher com arte o vazio que um vulgar observador encontraria entre palavras e coisas".
Crónica do livro: Miranda, Antonio.Relógio, não marque as horas: crónica de uma estada em Porto Rico. Brasília: Asefe, 1996. 115 p.