Sempre procurei acreditar na força do trabalho honesto e devotado. Tirar o melhor da profissão deveria ser sinónimo de entrega total e absoluta ao que se faz, colocando-se em plano secundário até mesmo o ganho financeiro. Todavia, ao fazer tal afirmação, sinto-me um traidor de mim mesmo, ao reconhecer que não foi desta forma que agi durante a maior parte de minha existência até aqui. Abracei as mais diversas profissões levado exclusivamente pela necessidade financeira, tendo-a como o carro chefe de todas as entrevistas que fiz e de todos os contratos que assinei. Agi como a maioria, em busca da felicidade, tentando encontrá-la no número de zeros dos contra-cheques que percebia. E, não havia maior lógica, pois, maior o salário, maior o padrão de vida de uma pessoa.
Mas, esta questão de padrão de vida começou a me incomodar à medida que observava o mundo a minha volta. Como bom observador que sempre procurei esforçar-me para ser, via a fisionomia de, digamos, oito entre dez pessoas enquanto esperavam dentro de seus luxuosos automóveis, a mudança do sinal luminoso ou caminhavam em seus ricos ternos pelas ruas da cidade. Os olhos não conseguem esconder o que vai na alma. Gostar do que se faz é, sem sombra de dúvida, vital e indispensável a uma existência feliz. Não deve ser, jamais, objeto da escolha de um jovem candidato a uma carreira, determinada profissão, por estar ela na moda ou oferecer os maiores salários do mercado. Seguir este rumo é decretar a própria ruína e abrir caminho para a infelicidade. Não somos máquinas controladas por botões e teclas. Possuímos, acima de qualquer coisa, dignidade. Orgulhamo-nos de nossa condição de humanos e queremos continuar assim, necessitados de oito horas de sono a cada noite.
Trabalho é vida. Não conheço outra terapia capaz de aniquilar tão eficazmente nossas mazelas quanto o trabalho. Quando somos absorvidos nas tarefas que realmente gostamos, transformamos o trabalho na mais atraente diversão. E a consequência disto é a saúde e a felicidade. Infelizmente, não é o que vemos em nossa sociedade. O capitalismo tem lá as suas vantagens. Mas, como faca de dois gumes, reclama cuidados e, Ã s vezes, distància. Incontáveis foram as vidas que se perderam, vítimas dos regimes criados com objetivos louváveis de melhorar as sociedades no mundo. Porém, em muitos casos, a má administração destes regimes colocou tudo a perder. Restou o capitalismo, que outorga a cada indivíduo a liberdade da escolha. Eu posso decidir ser um rico cidadão se souber pór em prática as condições oferecidas pelo país onde habito; isto é capitalismo. Mas, tenho que ser cuidadoso e leal para não engolir financeiramente o meu próximo; e isso é democracia.
Inúmeras são as profissões no planeta. Encontrar a que nos cabe e nos completa é encontrar a razão de viver. E esta busca precisa ser constante e começa a se manifestar dentro de cada um de nós. Não serão as propagandas capciosas, tampouco o chamariz em forma de avisos para concursos, pendurados nos quadros das universidades ou em bancas de jornais, que irão fazer as nossas cabeças. Quem estará no nosso íntimo para ditar a alegria e a satisfação que sentimos ao tomar contato com determinado ramo da ciência que pode vir a ser a vocação e o futuro que tanto almejávamos? Precisamos fugir das imposições. Não existe o propalado negócio da China. Se não consegue gostar daquilo que está fazendo, caia fora imediatamente, não importa o tamanho do seu salário. Procure uma ocupação que traga alegria. Onde não veja o transcorrer das horas. Que possa envolve-lo até o arrebatamento.
Quanto a mim, encontrei, como professor de inglês, uma atividade que me traz prazer e satisfação. Nela posso criar, atuando de ricas e variadas maneiras. Mas, foi na literatura que entrevi minha paixão definitiva. Publicando ou não uma obra, o prazer de vê-la nascer e se concluir é, no meu caso, inigualável. Mas esta é uma visão pessoal, pode ser ou não compartilhada. E, exatamente aí é que se encontra o dinamismo da vida. Cada ser, sendo um universo, único e independente, tem o dever de realizar essa busca e o direito de usufruí-la. Toda grande caminhada começa com o primeiro passo.