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Cronicas-->Café Árabe -- 02/11/2006 - 19:25 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Na xícara, pousa o pó do café e eu leio nas dobras dos grãos o futuro de meu tempo. Não sou versado nas artes da leitura de café árabe, mas dizem com certo fundamento que esta é uma arte respeitada e eu penso, sim, que os grãos devem conter a matéria dos sonhos, a matéria de nossas vidas. Como Borges, sei da sabedoria dos espelhos e suas faces múltiplas, minha personalidade feita de cacos de vidro, na superfície da xícara onde pousa o pó aromático da Coffea arábica ,pousam meus dedos nodulosos, meus dedos cheios de sinais da temporalidade e do medo.

Dedos que se surpreendem tabulando dados, dedos que se vêem amarelos de tanta nicotina, dedos que sabem o gosto de tua intimidade. Dedos que são meus ou são assim como que independentes, meio andarilhos em teu corpo suave, em teu corpo aromático cor de café, de água perfumada e cristalina. Dedos que se sabem úteis, mas que incomodam nos cantos da boca ou nas quinas dos móveis, dedos angulosos de meias verdades, mãos que te apalpam e sorvem de tua boca o que resta de ti.

Na xícara a independente verdade angulosa, ébria de medo e estranheza, tíbia verdade, doce incerteza dos espelhos francos que me devolvem ao mar da serenidade, aos globos de seus olhos brilhantes de espera e paciência, às pupilas de teus serenos mares internos. No interior da xícara todos os sumos de teus encontros e desencontros, de teus enganos e quimeras, de tuas esperas e sonhos abortados, são as mensagens que eu leio, não sendo versado em fazer previsões, sonhando em ter o dom das profecias, sonhando ter a presença do inefável, onírica lembrança de todos os teus pequenos movimentos noturnos, balançando nas redes eternas do Inconsciente, sabedora de tua presença elétrica, sideral e perpétua em meus dias de adivinhador. Quem somos, para onde vamos, de onde viemos, as pequenas letras dizem em quantidades infinitesimais de verdade quàntica que nada mais somos, não viemos de lugar algum e iremos dormir um dia, mas não para sempre. Na xícara repousam os momentos de uma vida, de todas as vidas que são os grãos, da planta que os originou e que, ancestral, rouba do solo os segredos das vidas derramadas, as nervuras da humanidade mortal.

Tudo isto num átimo, num segundo, num piscar de teus olhos de brilho diamantino, tudo isto num piscar luzes, tudo em momentos de divina presença, como uma alucinação. Dos grãos que eu olho, da xícara que é o continente, de teus braços longos e estranhos quando assim, soltos no ar, sem vida própria. Quem somos, para onde vamos, de onde viemos?

Deixo escorrer os grãos em minhas mãos, suaves mãos de um lavrador de campos de sonho, mãos de obreiro de tantas formas de viver que até penso, tantas foram minhas vidas, tantos são os grãos que revolvo, tantas as possibilidades que resolvo, equaciono, penso, mas na verdade, como nos espelhos, reflito e reverbero, num momentum de luz etérea, e lá ao fundo os grãos do café, aromático, retirado do pé há pouco, esperam minha leitura, minha decifração, qual pequenos segredos de luz coagulada, como se possível fosse solidificá-la (assim não propós o físico?); em vão. Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?

Na música, nas esculturas, na arte, nos livros clássicos as mesmas indagações, as mesmas questões do fundo da xícara, simples e puída de tempo e uso. Sempre as mesmas questões, indefiníveis, metafóricas, perenes.O aroma me sobe as narinas, sommelier, degustador de sabores, das vidas que tenho, das diversidades possíveis de meus sentidos que se esvaem, eu percebo que nada mais sou que uma lenda de mim mesmo.
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