Quando saí das montanhas de Minas, no longínquo ano de 1959, fui aportar em Barra do Piraí, uma hospitaleira cidade do interior do Estado do Rio, ancorada à s margens pedregosas do rio Paraíba do Sul. Antes passei pelo Rio de Janeiro para ver as ondas e provar o sabor salgado do mar pela primeira vez. Em Barra do Piraí morei por nove anos, conheci uma mulher santa, a professora Concessa Pires Teixeira, com quem retomei os estudos, fui garçon de restaurante, fui ao cinema pela primeira vez, assisti ao filme "Os dez mandamentos", fiz muitos amigos e tive a primeira namorada.
Para mim, um caipira que chegava do interior, Barra do Piraí era a melhor cidade do mundo. Ali, os becos têm nome de avenidas, o rio Paraíba é largo e abraça ilhas enormes, perenes e urbanizadas. Há dezenas de pontes cruzando o rio, os habitantes locais a chamam com orgulho de a "Veneza Brasileira". Gostei muito da cidade, porém num certo dia, tangido pela bússola do destino, peguei o trem de aço e vim para Taubaté. Apenas o meu irmão, o João, sempre ele com a sua bondade infinita, foi despedir-se de mim na estação. Lembro como se fosse hoje: antes de o trem sumir na curva da Medianeira, olhei para trás e o vi na plataforma, acenando em meio a um rastro de vento, dando adeus para mim. Era o seu irmão fugitivo que mais uma vez escapava para longe.
Passaram-se muitos anos, uns quarenta anos talvez, sem que eu nunca mais ouvisse falar de Barra do Piraí. E pensar que o trem de aço hoje nem existe mais, nenhuma notícia no jornal, nenhuma inundação, nenhum freguês do Baú, nenhum ganhador da loteria, nenhum assalto, nada! Parece que a minha antiga e querida cidade de Barra do Piraí só existia no meu imaginário, era uma cidade de sonho.
De repente o milagre se deu. Aleluia!... Barra do Piraí ainda existe! Em meio à s conversas banais no nosso encontro diário no "Café Bundinha", alguém pronunciou as palavras mágicas que eu esperava há tanto tempo. O meu amigo, Daves Ortiz Batalha, o popularíssimo X-9, tinha ido fazer uma seresta em Conservatória, confundiu-se no trevo da rodovia e, sem querer, acabou entrando na minha fabulosa e esquecida cidade. Foi a minha maior alegria. Agora está confirmado, não foi um sonho que eu tive: Barra do Piraí existe de verdade. O Daves esteve lá e viu! Agora sou mais feliz e tenho uma testemunha. Deus lhe pague!...