Ontem estive na feira. Do Paraguai, é claro!
Não poderia perder aquela oportunidade derradeira.
O governador, em oposição ao antecessor, prometeu inaugurar uma placa alusiva à sua fundação. Nela deverá está escrito: AQUI JAZ.
Comprei algumas bugigangas e uma novidade do além mar. No fundo do apetrecho doméstico li em pequenas letras: MADE IN BRAZIL.
Que avanço tecnológico! Possuía compartimentos com letreiro e destinação específica. Coisa de cinema. Uma cava para o sabão e outra para a esponja. Duplex.
Dei a jóia de presente para a dona da casa. (A empregada, é claro.)
Sorridente e agradecida, ela acomodou o relicário sobre a pia desnuda.
Ficou soberbo! Os letreiros de cor azul néon piscavam ritmicamente: SABÃO, ESPONJA... SABÃO, ESPONJA... SABÃO ESPONJA.
Apressei-me a assistir os compartimentos serem preenchidos pelos seus respectivos produtos: o sabão e a esponja.
Que obra de arte! Era uma verdadeira obra prima. Uma pintura de Miquelangelo! Só faltava falar.
A luz tingia a retina do meu olho de alegria e movimento: Sabão... Esponja, Sabão... Esponja, Sabão... Esponja.
Deixei-me hipnotizar com o frescor daquela cena luxuriante. Mirava a esponja e depois o sabão; a esponja e depois o sabão.
Os letreiros piscavam, piscavam insistente; alucinados e me alucinando: Sabão...Esponja, Sabão...Esponja, Sabão...Esponja.
Estático, eu mirava os dois quadriláteros incrustados no recipiente. Pareciam duas pérolas num para de brincos: a esponja e o sabão; a esponja e depois o sabão.
A cena enfadonha afastou os menos curiosos e, os letreiros começaram a piscar intensamente. Protegidos por minha cumplicidade, deixaram se levar pelo vai e vem da emoção e começaram a fazer bolinhas de sabão.
Sabão, Esponja; Sabão, Esponja; Sabão, Esponja.
Cansei-me daquela orgia eletrónica. Desliguei o fio da tomada e fui dormir.