Deixei de tomar o café da manhã e, Ã s onze e meia, parti para o almoço. Aos sábados, o restaurante vegetariano a quilo perto de casa serve feijoada. Comecei de mansinho, pegando leve no arroz. Sabe como é. Arroz engorda. Uma colherada de farofa de milho, com pedaços de... carne vegetal? Cumprimentei-me mentalmente pela brilhante decisão de ir a esse tipo de restaurante sem óculos. Dizem que o que os olhos não vêem o coração não sente.
A generosa porção de couve mineira ficou confortável, debruçada sobre os legumes cozidos e os brotos de feijão. Com a colher parada no ar e a fila inquieta atrás de mim, encarei a travessa da maionese, que piscava maliciosamente. Ela tinha maçã e passas e o ser humano precisa de frutas diariamente, racionalizei, enquanto me servia de uma generosa porção. Preenchi com molho tártaro o espaço entre a couve e a omelete de couve-flor. Um pouco de molho vinagrete e pimenta sobre as carnes vegetais da feijoada deram o toque final.
Caminhei para a balança sentindo-me um tanto embaraçada pelo tamanho do prato de comida e acabei fazendo um comentário bobo à mocinha, daqueles que denunciam o nosso mal-estar. Optei por sentar-se lá longe, de costas para o movimento. Quanto menos testemunhas, melhor. Entretida com a refeição, tomei um susto quando o garçom surgiu do nada, perguntou o que eu gostaria de beber e, apressado, iniciou o caminho de volta, mesmo sem a resposta. "Um suco natural de laranja, com gelo e açúcar, por favor", apressei-me em dizer, com a voz e o pescoço tentando acompanhar os passos do sisudo rapaz.
Mal direcionei novamente a atenção à comida e tomei outro susto. O jovem estava de volta e, tombando o torso, colocara a cabeça bem diante do meu rosto, invadindo o caminho das garfadas. "A senhora pediu suco natural", começou ele. "Mas quer que ponha gelo. Se é natural, é sem gelo", sentenciou, enquanto cruzava os braços na frente do peito e me encarava, olhos nos olhos. Em décadas de pedidos de sucos naturais com gelo, país afora, esta era a primeira vez que alguém vinha com aquilo.
O diálogo que se seguiu foi surreal. Difícil de acreditar que ambos falássemos o mesmo idioma. Por fim, o tal suco que era "espremido na hora" levou menos de dois minutos para estar à mesa. Com gelo. Mas sem açúcar. Chamar o garçom de volta? Nem pensar. Num rápido balanço mental, conclui que ter conseguido o suco gelado estava de bom tamanho. Mesmo que "espremido" sabe-se lá quando. De quebra, ainda havia economizado algumas calorias, pela ausência do açúcar. Na saída, no caixa, peguei um brigadeiro imenso e o comi com a boca melhor do mundo. Afinal, estava com alguns créditos calóricos, oras.