A História do Cinema em Araras-SP (1 de 3)
Belle Époque, a Sétima Arte de volta ao passado
Alcyr Matthiesen
A lanterna mágica em tempos idos iluminou as noites ararenses e deixou muita lembrança na mente tanto dos mais idosos, como nas últimas gerações. Como as brumas do passado apagaram os primórdios de um século do cinema em Araras, vamos reavivar a nossa memória a partir do saudoso Theatro Apollo, que por mais de 20 anos ainda é lembrança para os mais idosos. O saudoso jornalista e radialista Cardoso Silva, numa antiga publicação do século passado detalhava as noites ararenses da famosa casa de espetáculos, quando seu último proprietário, Clementino Zacharias, Ã s 19h30, soltava três rojões para avisar que a sessão ia começar.
O Theatro Apollo exibia a pompa das grandes casas de espetáculos da Capital, pois as artes estavam na fase de ouro da Belle Époque. Uma grande porta dava entrada ao salão e as janelas laterais todas enfeitadas nas bordas das molduras com làmpadas, uma ao lado da outra, já eram um convite para os espetáculos. O salão tinha 26 frisas e 400 cadeiras voltadas para a tela grande e alva, onde o Juca França molhava com um balde antes do início da sessão. Os músicos ficavam na frente, logo abaixo da tela e formavam a Orchestra do Theatro Apollo, enquanto os rolos de filmes mudos eram projetados sobe a regência do maestro Francisco Paulo Russo, o qual hoje empresta seu nome para o nosso Teatro Estadual. Cardoso cita alguns nomes dos que tocavam na orquestra: Albertina Quenzer, Odete Quenzer, Isaura Scian, Noêmia Luz e Ângelo Consentino tocavam violino e Rosa Chagas piano. Manuel Mathias Figueiredo (Manéco), tocava violoncelo.
No saxofone, Eugênio Ruegger e, no clarinete, João Russolo; meu tio Oswaldo da Luz tocava piano, mas à s vezes revezava no pistom com seu irmão Aristides Luz e um músico chamado Anselmo. Na bateria, Paulo Américo Russo e, mais tarde, seu irmão Aldo Russo. O pai Francisco Paulo Russo, também era mestre do contrabaixo e fazia as vezes de maestro e o Adriano Lépore, conhecido por Nuche, tocava flauta. Para esticar a tela, torná-la alva, quando ia começar a fita as luzes eram apagadas e a lanterna mágica começava a projeção, inicialmente com o
cast escrito em inglês.
Durante a semana os músicos assistiam ao filme antes da projeção e ensaiavam as partituras conforme o desenrolar das cenas, pois as mesmas eram mudas. Assim, em cenas romànticas tocavam músicas lentas, como La Traviatta, por exemplo. Nas cenas de ação, as músicas eram vibrantes e rápidas, como Cavalleria Ligeira. Como as fitas vinham em partes, as luzes acendiam para um rápido intervalo, quando o projecionista fazia a troca dos rolos, pois na época só havia um projetor, mas a orquestra não parava.
Tempos depois, Oswaldo da Luz tornou-se maestro, casou-se com minha tia Áurea Dardes, de Piraju, e formou sua própria banda para tocar num grande cinema em Espírito Santo do Pinhal, levando consigo o irmão Aristides e Paulo Américo Russo.
Cardoso Silva acrescenta, ainda, que o Clementino Zacharias era pluriapto, uma vez que abria o cinema, soltava os rojões, vendia os ingressos e fechava o prédio após o término da exibição. Diz, ainda, que era o último cinéfilo a deixar o salão, quando acompanhado da esposa voltava a pé para casa, levando uma valise com o dinheiro e os ingressos que sobraram. Os idosos de Araras e região ainda se lembram dos galãs Rodolfo Valentino, Ramon Navarro, Theda Bara, Póla Negri, Tom Mix, Me West, Arold Loyd e muitos outros. Os velhos saudosistas devem se lembrar de Valentino em Sangue e Areia, Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse e muitos outros de Chaplin O Garoto, Vida de Cachorro etc.
Mas o Theatro Apollo, mesmo fechado em 1929, com a chegada do cinema sonoro não parou suas atividades. O maestro Francisco Paulo Russo era incessante tanto na regência de orquestras e bandas, atuava também em teatro amador, companhias de revistas, eventos solenes etc. Continuou trazendo público para o velho cinema com bailes que marcaram época. Bem mais tarde, foi rinque de patinação e o Restaurante Tio Patinhas.
Os músicos do Apollo foram embora e a maioria mudou-se de cidade para tocar em bailes e saraus. Agora, todo mundo só comentava sobre em cinema falado e com a falta das exibições do Apollo o público aguardava a conclusão do grande cinema chamado Theatro Santa Helena, que estava com as obras no final, graças ao empresário Gerólamo Gaino. Sua inauguração ocorreu no ano de 1930, mesmo com o mundo passando por uma grave recessão que abalou a economia em 1929. Contudo, um novo tempo estava começando e muita novidade estava por vir na sétima arte.
Alcyr Matthiesen é biólogo, professor universitário aposentado e historiador de Araras, nossa cidade natal.
Fonte: OPINIÃO JORNAL, Araras (SP), Sábado, 10/10/2009, Página 1B.
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LUIZ ROBERTO TURATTI.