O ruído se esvai aos poucos, assim como o oxigênio. Mas o tenho em quantidade suficiente em meus pulmões para sobreviver, durante alguns segundos, na imensidão da água. Meu corpo se move em càmera lenta; o tempo aqui é diferente, mais devagar e silencioso... Viro peixe, golfinho, arraia, coral, sereia... Só não sei cantar como ela! E lá embaixo, bem lá embaixo, vislumbro destroços de uma embarcação que naufragou. Será que houve sobreviventes? Ou passaram a viver, definitivamente, nas profundezas do mar? Tudo é mistério e maravilha nesse mundo inexplorado... O som é um convite a um delicioso não pensar, e a um esplêndido sentir, tão somente. Dizem que de cá viemos, que todos fomos seres marinhos um dia. E que, por isso, há mais água em nosso corpo do que qualquer outro elemento. Por isso ela nos é tão vital.
Mergulho um pouco mais fundo: vejo uma barbatana a poucos metros de distància. É ele, o temível tubarão, mas nada de pànico: ele acabou de almoçar e estou longe de ser seu prato predileto! Aproximou-se de mim e seguiu seu caminho. As algas verdes e marrons, lànguidas, acariciam minha pele, mas logo se despedem. Um pouco mais fundo e consigo tatear a areia, apanho um montinho que rapidamente se esvaece entre meus dedos. Fecho os olhos por uns instantes e escuto o barulho ancestral e eterno... O ar, porém, me falta e tenho de voltar à superfície, ao meu mundo, à minha realidade, à quele ruído de sempre.
Quando eu for embora de vez, por favor não me tranquem dentro de um caixão debaixo da terra: das águas do mar eu vim e é para lá que quero voltar, livre, muda, diáfana...
Fernanda Cordeiro Gazola
BH, 07 de fevereiro de 2010.
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"Fora da VERDADE não existe CARIDADE nem, muito menos, SALVAÇÃO!"