Sou alguém que vê a chuva com bons olhos.
E a chuva da madrugada é diferente das outras chuvas.
Não; não escapo da insatisfação humana que emerge de repente
A se ver impotente diante daquela água que despenca sem aviso,
Pegando-nos desprevenidos e estragando qualquer coisa que tenhamos planejado.
Falo da chuva da madrugada!
Ela é diferente! Ela é mais carinho que incómodo!
Olhamos a chuva, quando devíamos escutá-la.
E a chuva da madrugada é boa para isso.
Seja forte ou fraca, a chuva apenas grita ou sussurra.
Percebo humanidade nela.
Percebo a mágoa ao seu cair monótono, como um choro contido.
Percebo sua fúria quando achata o chão, como uma cascata majestosa.
Imagino que ela pense que nós a desprezamos por vários motivos:
Pelas enchentes, por estragar um passeio, por deixar o dia triste...
E, no entanto, quando não nos visita com regularidade, sentimos-lhe a falta,
Em ausência de água que nos conforta a vida.
Que desprezo mesquinho pela chuva! Nosso patinho feio dos fenómenos da natureza.
Pois agora, escute melhor a chuva da madrugada.
Verá que ela é chuva confidente, pois você irá ouvir seus lamentos nela.
Sentirá que ela é chuva boa, pois tocará seu íntimo solitário.
A chuva da madrugada vai-lhe trazer cheiros antigos, cheiros novos.
Ela vai lhe dar a querência do sol, não porque não a deseja,
Mas porque o sol a completará e a você também.
Ela vai-lhe integrar mais no mundo; vai-lhe ser oásis em deserto.
Ela vai-lhe dar música no ritmo de seu pisar o solo.
Rock, valsa, rap, clássico... Deixa-a tocar em você aquilo que deseja ouvir.
E por mais nebuloso possa estar o céu,
A chuva da madrugada será apenas as estrelas liquefeitas
A estar mais perto de você; a transformar-lhe, por instantes,
Em um pequeno céu na terra.
