Olhando o mundo, me olho a mim. Dentro do espelho, onde me olho, se encontra o mundo inteiro. E vejo-me também em faces alheias, em fachadas, semáforos, garrafas, retrovisores de carros, monitores tela plana, bitucas de cigarro. Sinto uma sensação de culpa, de artificialidade, de desperdício, como se tudo fosse de plástico, descartável, retorcido, como se faltasse algo, algo que sempre me escorre à s mãos. Algo que de tão perto de mim se encontra exatamente onde estou, e por isso não consigo vê-lo porque acaba se misturando comigo mesmo. Eu queria tanto sentir menos, me importar menos, dizer um "foda-se tudo" convicto, sem medo de arrependimentos. Mas não sei porque cargas d´água, há muitos anos atrás, decidi que só esse caminho que estou agora valeria a pena. Esses rompantes de romantismo juvenil que fode o esquema todo, que desanda a bagaça. Aposto que Maluf nunca teve um. Poucos se importam. Poucos direcionam seu olhar que não á seu próprio umbigo. Mas as vezes me pergunto, será que vale a pena? Já nem sei mais a resposta. Talvez nunca tenha sabido e me perguntava só pra pensar que eu buscava alguma resposta e assim me ocupava pensando que pensava. Será que buscamos algo além do já imposto, do já compactuado, contratado, assinado embaixo? A sociedade nos impõe condutas, regrinhas, manuais de comportamento que ninguém segue, mas mesmo assim apontam o dedo à quem também não segue. A hipocrisia em sua forma mais latente. O que não falta é dedo apontado pra dedo, sendo assim, no final das contas apontam para si mesmos, como se apontassem o dedo pro espelho, mas olhassem pro lado. E o relógio a tic-taquear impiedosa, fria e burocraticamente seus segundos em direção á nossa morte, em direção ao infinito que não nos pertence. Nem sequer sabemos como é sua aparência, sua forma, seu tamanho imensurável quando pensado através dos números e medidas criados por nós, seres tão rasos. Nos limitamos a nascer, crescer, perder a virgindade, fazer faculdade, comer o máximo de garotas possíveis, trabalhar pra algum filho da puta, se casar, ter filhos, casa própria, aposentadoria, dominó na praça e morte supostamente digna. Por essa vidinha vivida? Seria demais querer mais que isso? Seria demais abrir caminhos no meio do caminho ofiicial e arriscar uma caminhada fora dele? Será que essa sequência nefasta deve ser tida como o caminho correto, o caminho mais seguro? Correto e seguro pra quem? Quem me garante isso com absoluta certeza? E o tempo corre, voa, e eu simplesmente enterrado nesse instante, preso nesse momento, petrificando pensamentos tolos. Tantas coisas poderiam ser feitas mas não fazemos. E quando indagados do porque, não respondemos pelo singelo fato de não sabermos o porque do porque. Apenas mudamos de assunto, como se com isso matássemos um deles. Não, ele só entra num sono profundo até quando solicitado novamente. Todo dia ele dorme e acorda conosco, como se fosse parte de nosso sono, como se tivesse preso a nossos tornozelos. Uma instantanealidade se faz presente, se faz constante, perde-se o controle e entramos num estado de deriva, em que a vida se amortece, se anestesia com morfina ilusória e apenas vemos, sem força de reação, o tic-tac seguir em frente e a vida a cada tic e a cada tac ir morrendo homeopaticamente, a conta gotas. Tic-tac tic-tac tic-tac tic-tac. Enquanto a morte não chega vamos costurando a vida com linha de pesca. Quantos tics e quantos tacs já desperdiçamos fazendo coisas que não vão de encontro unicamente a nossa felicidade, a felicidade alheia, ao bem estar comum, ao próximo? Será que eternamente seguiremos conjugando verbos na primeira pessoa do singular, fazendo de conta que nunca ouvimos falar dela no plural? Será que cada centavo ganho sozinho vale mais que o ganho entre todos, assim como os sorrisos? Será que ficar milhonário sozinho vale mais que ver milhares com um mínimo digno? O que vale mais pra você te envergonha? Se não; pense nisso, se sim; idem, se não quiser; foda-se também...
T.S.H.