Chega a ser engraçado como os torvelinhos da manhã se enredam em nossas pernas, tentando nos manter presos ao labirinto do sono que nos confundiu na noite recém terminada. Na escuridão, os segredos da impermanência nos atingiram e na imobilidade que imita a morte, nossos olhos se abriram para outras visões, outros segredos que nunca haviam sido revelados antes e só nós os conhecemos.
Temos de tomar cuidado. Podemos tropeçar nos fiapos que ainda ressumam nos cantos escondidos da casa. Podemos cair de novo na escada imaginária, podemos olhar de novo o espelho que nos tragará Ã superfície do Eterno ou, quem sabe, ouvir as palavras das meninas que brincavam de corda puxando um cão de cinco patas.
Eu, de minha parte, já aprendi a fazer as pazes com o ciclo que se fecha cada manhã. Sim, porque assim que acordamos, as criaturas se escondem, se plasmam nos móveis. Um gato feroz vira uma mancha no asfalto. Um Cavalo Alado já se foi em nuvem. Uma serpente vira um rio de pouca profundidade... Quando acordamos assim, de chofre, com olhos nebulosos das caminhadas de nossa alma, de soslaio podemos conversar com a moça que nos beijou sófrega. Tentamos agarrá-la, porém ela foge, deixando no ar o perfume perfeito de seu corpo imaculado.
Todo cuidado é pouco, nos torvelinhos do rio da vida o que nos leva é a toada, o eterno pulsar de nossas melhores intenções. O segredo é saber levar, saber dividir. A questão principal é não deixar que nossos mais lindos sonhos se precipitem nas estranhas encostas do indizível.
Assim, podemos conversar com nosso eu profundo.