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Cronicas-->Ser piloto -- 24/02/2011 - 16:48 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ser piloto

Por Francis Gary Powers, famoso piloto da USAF, derrubado na Rússia em 1960.

Existem dois tipos de pilotos, aqueles que levam em seu sangue a necessidade de voar, pelas mesmas razões que precisam dormir, comer ou respirar, e aqueles que o fazem apenas pela tarefa, por obrigação ou por não ter outra alternativa. Esses últimos normalmente chegam à profissão por acaso ou outra forma não planejada. Os primeiros frequentemente tem a inquietude desde pequenos, quando viam nos aviões algo notável, místico, sublime, talvez muitos destes começaram desde pequenos a construir modelos de aeroplanos, ou acumulando fotos e pósteres ou qualquer outra coleção com motivos aéreos. Conheciam as especificações e dados de qualquer avião com riqueza de detalhes.

Quando crescem e têm a sorte de realizar seu sonho de criança, desfrutam plenamente do seu trabalho e sentem-se os homens mais sortudos do planeta.

Os pilotos são uma classe à parte de humanos, eles abandonam todo o mundano para purificar seu espirito no céu, e somente voltam à terra depois de receber a comunicação do infinito. Esse grupo conhece a diferença entre voar para sobreviver e sobreviver para voar. A Aviação os ensina orgulho como também humildade e apesar de que voar é uma magia, eles caem voluntariamente vítimas de seu feitiço. Quando estão na terra, durante dias ensolarados, observam continuamente o firmamento com saudades de estar ali, durante dias chuvosos e nublados revêem os procedimentos de voo em suas mentes. O piloto sabe que o melhor simulador de voo esta em si mesmo, em sua imaginação, em sua atitude, porque a mente do piloto esta sempre acessível a elementos novos e compreende que para voar é preciso acreditar no desconhecido.

No mais, os pilotos são homens lógicos, calmos e disciplinados, que pela necessidade precisam pensar claramente, de outra maneira se arriscam a perder violentamente a vida ao sentar-se na cabine. O verdadeiro piloto não amarra seu corpo ao avião, pelo contrário, através do arnês ele amarra o avião em suas costas, em todo seu corpo. Os comandos da aeronave passam a ser uma extensão de sua personalidade, essa simples ação une o homem ao aparelho na simetria de uma só entidade, numa mistura única e indecifrável, cada vibração, cada som, cada cheiro tem sentido e o piloto os interpreta apropriadamente.

Não há duvida de que o motor é o coração do avião, mais o piloto é a alma que o governa. Os pilotos não vêem seus objetos de afeição como máquinas, ao contrário, são formas vivas que respiram e possuem diferentes personalidades, em alguns momentos falam e até riem com eles.

Esses seduzidos mortais percebem os aviões com uma beleza incondicional, porque nada estimula mais os sentidos de um Aviador que a forma esquisita de uma aeronave, não podem evitar, estão infectados pelo feitiço, e viverão o resto de suas vidas contemplados pela magia de sua beleza.

Para o piloto perceber um avião é como encontrar um familiar perdido, uma e outra vez.

Quando o destino trágico mostra sua inexorável presença e vidas se perdem em acidentes a essência do piloto se entristece pelo acontecido, mais não poderá evitar, talvez por infinitesimal segundo, que a sombra de seu pensamento volte aos aparelhos, e um golpe de afeição pelo amigo caído seja inevitável.

Para o Aviador o som dos pistões é uma bela sinfonia, o som de um jato a síntese da força. Aviões perigosos não existem, somente não são pilotados adequadamente, para eles os aeroportos são altares ao talento humano. Ali se realizam diariamente os desafios e os milagres frente às energias da natureza e a força da gravidade. São lugares sagrados, onde o ritual de voar se exalta e se glorifica, de onde caminhos e fronteiras se encontram e o mundo fica pequeno, nos que se chora de alegria e também de tristeza, onde nascem esperanças e sucumbem ideais, onde o som do silêncio habitam as lembranças.

No ar o piloto esta em seu elemento, em sua casa, ao que pertence, é ali que ele se liberta da escravidão que o sujeitam na terra. É um dom de Deus que ele aceita com respeito e alegria. Este privilégio lhe permite escalar as prodigiosas montanhas do espaço, e alcançar dimensões no firmamento que outros mortais não alcançarão. Este presente permite apreciar a perfeição do criador e o absurdamente pequeno humano.

Permite-lhe igualmente reconhecer que ninguém há visto a montanha dali, como sua sombra do céu. Distinguir uma pessoa que deu sua alma à Aviação é fácil, em meio à multidão quando um avião passa seu olhar volta-se imediatamente ao firmamento buscando-o e não descansará até que o veja. Não importa quantas vezes haja visto o mesmo avião, é preciso vê-lo novamente, é algo inconsciente e espontàneo. Os pilotos talvez possam explorar os elementos físicos do voo, mas descrever o que ocasiona sua existência é impossível porque explicar a magia de voar esta além das palavras.


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