Na cabeça um gorro e um rádio pendurado no ouvido. O corpo balança, com ritmo de tremores e espasmos. A boca torta e fina tenta um esgar de sorriso. Lá vai o espantalho. Todos o vêem, todos o querem longe; nunca esteve tão perto. Lá vai o pobre, sentindo que se veste mas, meio desnudo, expõe sua bunda como veio ao mundo. O ritmo das taperas e das gangues, do medo da morte rápida, das frias paradas. O medo das rajadas, de vento de balas e catacumbas. Ele corre nas penumbras como uma galinha depenada ou uma avestruz desossada. Ele é nada, é ninguém. Se vê que puxa uma perna, se diz que foi tiro de marido corno, se viu que ele ficou coxo. Mas diz sua mulher que ele é mocho, não sabe mais de nada e ganha uns trocados quando não está zonzo e carrega uma papeleira e tal. Ele vive nas frinchas da terra seca da cidade fria. vê passarem os bacanas e murmura, eles se afastam de seu mau cheiro. Ele nunca esteve tão perto, não. Ele corre dos homens que chegam berrando, mão no coldre e mãos pesadas que batem e emudecem. Uns e outros esperneiam mas entram exaustos de lutas e caganeira mesmo. Ele não, é o cara. Sai gingando seu esqueleto de bunda murcha com as mesmices do rádio pendurado no ouvido, a boca torta de tanta quizumba, a guimba de cigarro colada ao cantinho, a baba que sai de sua língua não tem mais gosto não. Lá vai o galo louco, o peru que não morre nunca, mesmo se seja bebedeira o seu ponto crucial, ele éo tal do rap que mexe com as madeiras, o do funk das despojadas. Ele é o nó das fogueteiras e dos rojões apaixonados. Lá vai a boca torta, segue o rumo, erra a porta, chegou. Vem uma moça, velhinha de tanto ajudar, e aninha sua cabeça em seu peito... Numa caudalosa canção de ninar....