Ela não era o que se poderia chamar de "avião", mas não havia dúvida de possuir o talento em seduzir e encantar os homens; aliás, um talento que faz de algumas mulheres verdadeiras deusas. E como um pássaro livre, não se prendia a nenhum homem. Necessitava deles e inclusive os procurava, mas só quando o instinto e a ocasião se fazia necessário.
Eles, por sua vez, cegos de paixão, sentimento que na mais das vezes impede os apaixonados de ver o que está diante dos olhos, acreditavam não só naquele amor correspondido como também na fidelidade, pois o amor é quase sinónimo de fidelidade. Ela porém não tinha escrúpulos em enganá-los.
E mesmo quando era surpreendida na mentira, embora soubesse mentir como poucas, ainda sim conseguia reverter a situação a seu favor. Mas o amante enganado mais cedo ou mais tarde acaba caindo na real, e nessas horas o ciúme o dominava de tal forma que inevitavelmente acabava por cometer uma besteira; Ã s vezes tão grande que o desgraçava a vida.
Romildinho, o mais jovens de seus atuais "namorados", aquele rapaz que procurava sempre conter o ciúme, certo dia não foi convidado para uma festa e para a qual sabia que ela tinha sido. Não fosse a ausência de comentários por parte dela, talvez não houvesse estranhado o fato. Mas não quis indagá-la para não confessar-lhe o ciúme, o que muito a desagradaria.
Tarde da noite, não a encontrando em casa, decidiu ir buscá-la na dita festa para que não viesse sozinha para casa. Foi inclusive antevendo um retorno de mãos dadas e troca de carícias ao longo do trajeto.
Mas eis que a vê, a poucos metros dali, recostada a um muro, nos braços de outro rapaz. Talvez se estivesse tão somente abraçada com outro homem, isto não teria feito o ciúme possuí-lo feito um espírito maligno, mas como suportar aqueles beijos tão impudicos? Como conter a fervura do sangue ao deparar com carícias que amiúde só se faz entre quatro paredes e que em público são, quase sempre, praticados por prostitutas? Então aquela jovem por quem estava perdidamente apaixonado, na verdade, era uma vadia? Dir-se-ia uma cadela?
Arrancou do bolso o pequeno canivete usado como chaveiro e avançou sobre o casal feito um animal possuído. Espetou-o primeiramente várias vezes nas costas e pescoço de seu oponente, depois no abdómen e pescoço da amante, até que ambos caíram inconscientes na calçada.
Quando finalmente se deu conta do que fizera, era tarde. O casal agonizava e esvaiam-se em sangue. No entanto, não se desesperou: sentia-se vingado. Fechou o canivete, recolocou no bolso e virando as costas disse:
-- Que fiquem juntos eternamente!
Voltou para casa, apanhou seus pertences mais importantes e desapareceu.
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