...O quanto te amava; Ã s vezes acho que te amava o suficiente, mas ainda assim, mesmo nos momentos mais íntimos, negava a mim mesmo que já te amava antes de te conhecer. Mesmo antes, já se definia o sentimento, porque puro, desde o momento em que cruzamos nossos olhos num bistró, ou num bar, ou numa padaria. Tanto faz. Mas eu já te amava mesmo sem o saber. Conhece aquela resistência ao amor, aquela racionalizaçao que precede toda paixão?
--Não pode ser. Não, vai dar encrenca. Espere, foi só um olhar...!"
...Olhar? Foi é uma barafunda, um consentimento com os olhos enternecidos, um brilho na boca suavemente vermelha, um balanço leve do pescoço. Tudo é suave quando se iniciam os jogos do amor. Eros é esperto, faz da Natureza sua cúmplice. Esse danado Deus grego que espeta os corações faz mais vítimas do que supõe. Há as vítimas que nunca souberam das flechas. Há os que, flechados, não são correspondidos, daí a eterna dor que sentem. Estes são os poetas, músicos...Há os que mesmo flechados, se negam a reconhecer o que lhes vai na alma. Esses são os infelizes, os amargurados eternos, que jamais conheceram a amplitude de estar na esfera do campo iluminado da paixão.
"--Mas, eu? Por quê eu?"
Foi um só olhar, que iluminava através das luzes lindas de um Natal mágico. Foi só uma foto. Mas, porque tinha de olhá-la? Que direito tenho a este voyerismo, que direitos eu tenho de...
"--Quanta luz!"
E lá se foi um anjo. E o Deus das flechas rindo lá em cima, esquinado num telhado, enquanto uma multidão de corações pulsa pela musa das luzes multicores.