Ah, os olhos, a bela dama de olhos enxutos e fina voz, a pele pêssego, florida em perfumes esparsos. A bela da tarde. Eu que me imagino em pêlo, desnudo, em meio ao bosque, sátiro moderno e desavergonhado sendo que ela dá sua risada que desanuvia:
--Pára com isso!
Não é de se admirar? Eu aqui, no parque, do jeito que vim ao mundo e ela me vem com essa história de 'parar com isso'. É de matar o ânimo de qualquer criatura.
--Mas como? Estamos aqui, reunidos em praça pública, mais explícitamente possível! Olhe só o que você me arranja!
--Não fui eu que tive a idéia; veja bem, minha intenção era passear no parque, mas...
--Como assim? Eu vim, vi e venci.
--Notei, ou melhor, não notei nada. Foi você que quis ficar assim, explícito; eu sou uma dama, prefiro mais as coisas veladas. Não sou de sair por aí, expondo minhas vergonhas em público.
--Mas ninguém está vendo!
--...Você é que pensa.
E dá a gargalhada, a tal dama dos infernos. Também, quem manda? Vou lá é saber? Devo ser disléxico, ou coisa que o valha. Ela disse: 'venha à vontade' e eu interpretei cegamente o convite. Quem não o faria? Ela, toda pudica no parque. Vai ver lá na hora do aconchego! É uma maluca.
--Maluca, eu? Aquelas freiras ali estão achando que quem é o maluco é você!
É isso que dá, esse é o problema de se apaixonar assim de repente. Hoje está tudo muito rápido, em meio segundo se abrem as comportas, em uma hora se está à porta, em sete minutos se está correndo em pelo no parque. As freirinhas, sete ao todo, olham e riem, escondendo as carinhas de vergonha. Eu, com o vento a me refrescar. Meu carro está longe; a decantada dama da tarde pediu que assim fosse, eu fui. E agora?
--Ouça as sirenes. Vai que são para você, doido de guerra.
--Eu sou doido é?
...E lhe tasco o beijo que eu posso, dadas as circunstâncias; o vento faz seu trabalho, a doida se remexe de lado, levo um tapa na orelha, alguém levanta a voz atrás:
--Levanta daí!
--Mãos à vista.
A desavergonhada quase estourando de rir. Saio de cima da moça, se é que demônio tem sexo.
--Veste aí, descarado!
E ponho uns trapos que me servem. E eu estou cambaio, até agora não me achei, e sento no chão desaguando meu pranto, foi por ti que chorei, sua vagabunda infame e imunda!
--Pára com isso!
Eu juro que parei. Até hoje moro no tal pedaço de terra. E junto meus trapos e cuspo no chão que ela pisou, a danada.
E choro.
|