Olhar fundo no infinito, a moça de cabelos vermelhos causava espanto por onde passava; sua pele branca feito nuvem de prata, olhos cinza-esverdeados, mãos longuíssimas de unhas idem e andando feito anjo que cai de uma primeira instància do Paraíso. Uma bolsa leve, tipo dessas que têm algumas luminosidades, ornava-lhe o ombro direito. Dali saiu um cigarro fino, daí ela o acendeu e, lànguida, fumou e sorveu com prazer mais uma nuvem que se formou em redondos lábios que de vermelhos se destacavam em um rosto proporcionado e enigmático.
Parou numa esquina e se viu em uma janela de loja espelhada, onde se duplicou um milagre divino. Era ela e mais ela, dupla via invertida, uma mão que leva à outra. E a nuvem tingia os seus cantos de azul, carmim e rosa. Quem passou por mim foi ela, não eu. E aquela moça, por princípio, não devia ser uma qualquer, porque além de bela, tinha preciosidade. Percebe-se o valor da jóia pelo brilho que escapa num reflexo solitário. E ali, quem reverberava era tal que ninguém que se passasse de cego ficaria sem a ver de longe.
Viram quanta flor no jardim? Viram passarinho de papo amarelo? Talvez um galho caísse ali, mas se ela estivesse perto, milagre se faria. E ela atravessou a avenida, movimentada de pó e fuligem, fumaça e sonhos perdidos.