Usina de Letras
Usina de Letras
19 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 


Artigos ( 63092 )
Cartas ( 21348)
Contos (13299)
Cordel (10354)
Crônicas (22576)
Discursos (3247)
Ensaios - (10631)
Erótico (13587)
Frases (51540)
Humor (20164)
Infantil (5580)
Infanto Juvenil (4924)
Letras de Música (5465)
Peça de Teatro (1386)
Poesias (141235)
Redação (3356)
Roteiro de Filme ou Novela (1065)
Teses / Monologos (2441)
Textos Jurídicos (1965)
Textos Religiosos/Sermões (6341)

 

LEGENDAS
( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )
( ! )- Texto com Comentários

 

Nossa Proposta
Nota Legal
Fale Conosco

 



Cronicas-->O efeito de vinte anos -- 02/11/2017 - 18:25 (LEANDRO TAVARES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O efeito de vinte anos

 

Vinte anos depois nos encontramos. Avistei-a de dentro do ônibus, no interior da padaria da esquina. Decidi descer na parada seguinte — que não era o meu ponto final. Ao vê-la, lembrei-me da época do ginasial, em que nossas carteiras eram vizinhas: conversávamos de tudo, éramos, até certo ponto, confidentes assíduos.

Era uma menina alegre, de olhar esperançoso e brilhante. Foram essas memórias que me convenceram a descer do ônibus antes da hora. Queria abraçá-la, reviver alguns daqueles momentos, e tirar algumas pérolas de dentro do baú velho e empoeirado.

Todavia, vinte anos não são vinte dias. Nascemos límpidos, transparentes — como uma bola de cristal. Mas o vento do tempo atua em nós, depositando grãos de poeira sobre nossa superfície e, ao longo dos anos, a poeira acaba ofuscando o brilho que tínhamos no cristal de nosso olhar.

Abordei-a por trás, por meio de um belisco macio na cintura. Disse-me “Oi”, sem dizer meu nome; “talvez nem lembre mais de mim”, pensei. Mal me olhou — conversava com uma senhora que comprava torradas.

Me fez poucas perguntas — protocolares: “Como vai?”, “Tudo bem?”.  Uma expressão austera maquiava-lhe o rosto. Pouco restava: poucas palavras, sorrisos escassos; no cristal do olhar — pouco brilho, um brilho fosco, sem vida.

Friamente, despediu-se: “Um abraço” — sem abraço.

“Tchau!”

Não vi mais nela a menina do olhar brilhante, mas tão somente o efeito corrosivo do tempo, o efeito de vinte anos que, aparentemente, tinham depositado espessas crostas de amargura e frustação sobre seu cristal.

E ganhei, de gorjeta, um longo trecho de caminhada — por nada. Aliás, por uma coisa: pela consciência do efeito do tempo sobre nosso cristal.  

 

Rio de Janeiro, 02 de novembro de 2017.

 

Por Leandro Tavares.

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui