Sentado em seu banquinho, meditava sobre o passado recente, pois nem idade tinha para tê-lo distante,e sonhava com o longo futuro que certamente o esperava, o poeta olhou para o lado e começou a dialogar com o louco, abrindo a conversa:
- Veja só, onde estava escondida esta gata, obra prima da natureza? Aposto que se escondia para não ofuscar a luz do sol e, que é por inveja que a lua não vai pintar hoje!
- Podes crer, também deve ser para vê-la que surgiram todos aqueles pivetes, famintos revirando lixo em busca do que comer! Espantalhos que não se espantam com a beleza inacessível, indígnos que não se indignam com a miséria. Sabe cara, tenho visto gente fina aparecer de vez em quando, mas quando isso aqui se alaga nem essas beldades os trazem. - Para manó, você só fala de coisa feia, pó! Em vez de pensar em enchentes, alagamentos e miséria, aprecie o que a vida tem de belo, pense nas gatinhas, no pantanal com seus jacarés, suas capivaras, suas aves exóticas espalhadas naquele paraíso alagado e vivendo em plena harmonia. Não falta alimentos, sabe manó,tudo isso faz parte do sistema, naõ é assim que deveria ser, mas é assim que é, bicho come bicho e só o mais forte sobrevive, olhe como esses pombos batalham seu rango, olha lá, nenhum deles está reclamando!
- Pó cara cai na real, o louco aqui sou eu, sei que você não é alienado,tu és poeta e tem feito coisas que não parece nada com este discurso babaca, vai lá cara, abra os olhos, veja tudo isso aí, tu acha que há justiça? Faça como eu, trepe em um banquinho e continue denunciando com sua poesia, dê uma de louco, dizem que de poeta e louco todo mundo tem um pouco.
Horas se passaram, a noite caiu e nem perceberam, que a bela se foi, outras crianças chegaram com fome, mais alguna velhos, outros nem tanto,
mas com o mesmo intuito, quando de repente:
- Passe a carteira maluco! O poeta olhou para o lado como se pedisse socorro para o louco do seu lado. Mas foi inútil, estava só com seu algós, assim como estivera o tempo todo, seu lado louco nesse momento estava com tanto medo quanto o lado poeta, atendeu o pivete e solitário partiu carregando seu único campanheiro, o banquinho.