A nossa cultura tem mesmo algumas coisas curiosas. Uma delas é essa forma de contar a passagem da vida baseada em módulos de tempo como os segundos, as horas, as semanas, os anos. O resultado é que em alguns momentos da vida um dia pode fazer toda a diferença entre ser criança e adulto.
Vejamos o caso de quem faz sete anos. Em essência, ele é o mesmo do dia anterior, quando tinha apenas seis. No entanto, algo de mágico faz com que ele se torne infinitamente mais inteligente, ao ponto de finalmente poder frequentar uma escola. É como se até o dia anterior o seu cérebro estivesse guardado em algum armazém do corpo, e só naquela noite fatídica do seu aniversário ele fosse transferido para o seu lugar de direito, dando à pessoa uma capacidade inexistente até um dia antes.
E quando chega aos dezesseis, então, que terrível. Até o dia anterior, não passava de um moleque, sem responsabilidades. De repente, está apto a escolher o seu presidente e a trabalhar. É como se o seu senso político estivesse embotado, ou seus músculos atrofiados, e em questão de uma noite apenas estas capacidades florescessem de imediato.
Dezoito, há algo nesta vida como chegar aos dezoito? Em questão de uma noite, abrem-se todas as portas das cadeias, das auto-escolas, do funcionalismo público. Uma noite apenas. Num dia, você é menor de idade. No outro, um homem.
Mas nada há nesta nossa vida que se compare aos vinte e um anos. Nestes mistérios de transformações que necessitam de uma noite para se consumarem, chegar aos vinte e um anos é algo comparável a um planeta que de repente se converte em estrela ou buraco negro, a gosto do freguês. Até o dia anterior você circula na órbita de outro corpo celeste. Uma noite, e você brilha por conta própria, e brilha tanto, mas tanto, que pode até assinar o próprio cheque.
São todas besteiras de nossa civilização. É como quando, depois de passar um ano atolado em problemas, vemos chegar o reveillon e dizemos "Ano novo, vida nova". Como se o dia primeiro de janeiro fosse completamente diferente do 31 de dezembro. Sete, dezesseis, dezoito, vinte e um anos, são todos marcos de transformações que acontecem conosco de forma contínua. Em si, não significam muita coisa.
Na verdade, a gente só sente o peso de fazer dezoito anos aos dezenove, e dos vinte e um aos vinte e dois. Fora disso, fazer um vinte e um se resume à propaganda feita pela Ana Paula, que não é você, é a Arósio.
Mas o que estou dizendo? Que droga, você aí feliz por chegar aos vinte e um anos, e eu aqui mijando no seu chopp. Quer saber, deixe de lado essas digressões, trágicas, de quem fica procurando pelo em ovo. Feliz aniversário, curta os seus vinte e um anos, e pau na jaca. Afinal de contas, este é o tipo de coisa que só acontece uma vez na vida.