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Cronicas-->Enquanto Lula e Serra debatiam eu detonei um Caballero -- 26/10/2002 - 03:08 (Athos Ronaldo Miralha da Cunha) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
São 21:30h contemplo uma garrafa de "Caballero de la Cepa", cabernet argentino safra 1993. Estava escrito no rótulo.
"Oigo decir que los amantes del vino seran condenados. No hay verdades comprobadas pero hay mentiras evidentes. Si los amantes del vino y del amor van al infierno. Vacio debe estar el paraíso."
Uma frase para ser meditada antes de começar assistir o debate presidencial. Sonho com o paraíso e gosto de vinho tinto. O Brasil precisa de mudanças e o povo de comida na mesa. Talvez um dia tomarei um Romanée-Conti. Talvez um dia o povo não passará fome.
Abro-o. O buquê se dissipa no ar. O carvalho percebe-se com evidência.
A tela da televisão mostra os candidatos na arena da Rede Globo. O histórico debate do dia 25 de outubro está prestes a iniciar. No centro Lula e Serra, como dois gladiadores, prontos para esse embate final. Um dos dois será o governante do Brasil nos próximos quatro anos.
Rodo o cálice e sorvo o primeiro gole do cabernet de Mendoza.
O cumprimento entre Serra e Lula é frio, mas cordial. Sorridentes, fazem o "V" da vitória.
O debate flui normalmente. Perguntas da platéia. Respostas, réplicas, tréplicas e comentários paralelos. No auditório, olhos atentos e silêncio sepulcral.
Lula sorri. Abre os braços. Serra não modifica um músculo do rosto. Aponta para Lula e fala alguma coisa do PT do Rio Grande do Sul.
A conversa flui no vídeo e eu sorvo lentamente o "Caballero de la Cepa".
Até o presente momento saboreei dois cálices de vinho e contei dezessete vezes o nome de Lula dito por Serra. Ou será que foram sete? Confesso que não lembro.
Uma professora de Minas diz "poblema" no meio de sua pergunta. Por ter ouvido mal, boto a culpa no vinho. Ah! O tinto argentino.
E lá estão as duas feras no picadeiro. Incontidas, caminham de um lugar para outro. Olhares incisivos. Gestos calmos. Não se cruzam e não se agridem. As feras estão amistosas. Apenas sorriem para os cinquenta e três indecisos presentes naquele embate.
Quando Lula encerra suas considerações finais, sorvo o último cálice do tinto argentino. Finda o debate, finda o vinho. Vou para a cama, ébrio de democracia e embriagado com vinho.
Na tela da Globo havia uma arena sem conflito físico. Um combate sem sangue. Uma briga sem luxações. Apenas disputa de idéias. Propostas e compromissos com o Brasil.

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