Tem coisas que vão desaparecendo sem que a gente se dê conta.
Dia desses fui à padaria e me deu uma vontade louca de comer um pão bengala. Lembra-se dele? Aquele pão, da mesma espessura que o francês, mas com o comprimento de uma baguette (alguns chegavam a Ter meio metro).
O bengala era um pão único. Sozinho, era capaz de saciar cinco, seis pessoas. E satisfazia gostos diferentes também. Quem quisesse manter a forma, poderia comer apenas uma fatiazinha, de poucos centímetros. Os mais famintos cortavam logo uma "tora" de uns cinco centímetros e recheavam-na com tudo o que tinham direito. Ah, e o bengala ainda tinha os "cotovelos". Era assim que em casa denominávamos as duas extremidades do pão. Sempre mais torradinhos e mais crocantes, os cotovelos eram disputados por todos.
Devido ao seu tamanho o bengala vinha embrulhado ao centro por um pedaço de papel., o velho papel de pão (coisa que também já não existe mais). Utilíssimo, aquele papel. Servia para rascunho da tarefa escolar, para fazer lista de compras, para fazer pipa, encapar caderno, enrolar cigarro (aquele feito de fumo de rolo) e tudo o que a imaginação (ou a necessidade) pedisse.
Lembro da imagem do menino sujo de tanto brincar, vizinho da casa de minha infància, descendo a ladeira à s três da tarde com um bengala debaixo do braço. Sempre achei aquilo meio nojento, o suor molhando o papel em contato com o pão. Mas o que importava era a merenda.
Naquele tempo havia a merenda. Era uma espécie de segundo almoço. Por volta de três da tarde, uma farta mesa com queijo, doces, quitutes e, claro, pão bengala, nos fazia mais gordos.
Sei que ainda sou jovem para tantas reminiscências, mas prefiro lembrá-las agora, antes que minha memória necessite de uma bengala que a ampare.