É um cara comum, daqueles que veio do litoral para pegar emprego na cidade. Conheceu a mulher num arrasta-pé, casou e, depois de alguns anos, conseguiu comprar uma casinha na periferia.
Tem um Chevette 90 lindão. Aos domingos de manhã, sai para dar uma voltinha com a gaiola do curió na palma da mão. Para numa rodinha de amigos e toma um copo de cerveja enquanto todos admiram o bichinho, que solta o trinado.
Toda semana, isso é sagrado, vai bater uma bolinha na associação. Depois toma umas e outras e vai pra casa leve, alegrão.
Às sextas-feiras, Ã noite, pega a frau e vai se sacudir num bailão gauchesco. Vez em quando faz uma extravagància: reúne a família, mulher e dois filhos, mais a filha casada e o genro, e vão enfrentar um rodízio de carne. Passa um pouco da conta na cervejinha e fica meio chato. A mulher dá um puxão em sua camisa: calma, Osvaldo, fala mais baixo!
É uma negação para a leitura. Diz: pra que perder tempo com livros? É preferível gastar o tempo no dominó com os amigos, jogando conversa fora. Começou a leitura de um Paulo Coelho, mas não passou das primeiras páginas. Cinema, só uma vez ou outra, quando passa filme do Van Damme.
No verão, mete a família no Chevette e vão passar o domingo na praia. Quando não levam o farnel pronto, almoçam em algum bufê, a preços módicos. Sempre tenta negociar meio bufê para o filho menor, a mulher o recrimina envergonhada. Enquanto, Ã tarde, a família se torra no sol, permanece no bar bebendo caipirinha. Segunda-feira informa aos colegas de trabalho: a praia estava ótima! No carnaval coloca uma roupa da mulher, a peruca loura, e sai pra desfilar no bloco das escandalosas, abraçado com um cara magrinho, com o rosto lambuzado de baton. A bebida rola solta, ninguém conhece mais ninguém. Diz que se diverte pelo ano todo.
Pode ser pouco, mas é um cara feliz. Para ser assim daria toda minha coleção de livros, e ainda a velha Olivetti, que pertenceu ao meu avó.
