A boemia não se traduz etílica aos que trabalham nela, dos que tiram o seu leite da cachaça dos outros. Os trabalhadores da noite alheia são, literalmente, os primeiros a chegarem resistindo até a hora de varrer o chão, com objetos variantes entre chepas de cigarro, latas de cerveja e uns papeis não identificáveis molhados pelo sereno e outras urinas. Certamente sempre ficam uns bêbados insistindo em chutar as latas resistentes à vassoura. Heis a diversão da noite que está terminando.
Perdida a última carona o destino é o Terminal Urbano, à s 4 e alguma coisa da manhã. Lá sobrevive o vendedor de cachorro-quente, enquanto os feirantes já montam suas bancas com tudo fresco. O cenário confuso é o da espera pelo ónibus, onde passam bêbados, putas e putos bêbados. O relógio parece estar travado, como a temperatura marcando os 10 graus, ainda mais sabendo que a primeira condução parte à s 6h, horas depois.
Não só cachaceiros e outros vagabundos esquecidos do mundo fazem ponto ali, mas trabalhadores caminham rumo ao trabalho, espantados com os que parecem estar há dias se embriagando na insónia da noite sem fim. A garota-de-programa gasta seu salário com as baboseiras vendidas por ali, garantindo um presente à filha que dorme em casa, e outros também compram, compram e se vendem.
Descongelado o relógio circulam os primeiros ónibus, para a sorte dos que vem e vão. E se vão: as putas, os bêbados e os putos bêbados. Chegam também os trabalhadores, a velhinha cheia de sacolas duma outra crónica, o policial e outros engravatados. Dá-se um bom-dia aqui e uma boa-noite lá, na aurora que para uns parece ser o fim do dia do dia sem fim. E boa noite! E bom dia! Já não sabemos o que começa e onde termina essa crónica.