Pelas janelas do meu apartamento eu vejo os transeuntes na rua, vejo pessoas na calçada, vejo os pobres na esquina, batalhando os trocados do seu dia a dia. Pelas janelas eu vejo a vida dobrar a esquina e passar por mim sem eu querer. Eu vejo a pracinha vazia.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo tudo o que acontece na rua, vejo os funcionários do estado, aparando a grama verde e grande que impedia a circulação das formigas. Pela janela eu vejo a rua toda, vejo os carros que passam a toda velocidade, vejo os espítritos da luz do meio-dia.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo as cores do dia e o branco da noite, vejo as esquinas vazias. Vejo os moleques jogando bola, vejo o padre rezando a missa, enquanto os cachorros ladram no pátio da igreja.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo os carros estacionados ao relento, sem nenhuma proteção contra as influências climáticas. Vejo o vizinho que sai pra comprar seu jornal em plena tarde de domingo, sem saber se a banca esgotou seu exemplar. Vejo aquele personagem que passeia com seus cachorros, vejo a velha que sempre passa por aqui chutando coquinhos.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo o carrinho da pamonha, uma pamonha por oitenta centavos e duas por um e cinquenta. Vejo o menino que carrega em sua bicicleta, um alto falante maior que o mundo, trazendo reclames inoportunos as dez da manhã. Vejo também a kombi azul, da banana prata e outras frutas e legumes. Vejo os supermercados batendo de porta em porta, anunciando suas ofertas.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo a chuva ir e vir, o sol chegar e se esbaldar, saindo depois sem cerimónia. Vejo os postes acendendo no cair da tarde, vejo as luzes apagando no raiar do dia. Vejo o enorme placar de anúncio obstruindo minha visão do além. Vejo o movimento dos carros.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo os arruaceiros fazendo fuzarca em plena praça. Vejo as crianças brincando no parquinho, vejo as mamães passeando com os filhos, e até mesmo à s vezes, me vejo ali, na mesma praça em que observei tantas outras pessoas. Eu me vejo passeando por ali com meu filho, fumando um cigarro, lendo um jornal, bebendo uma coca-cola, ou mesmo, esfregando a fralda suja de cocó do meu filho, no mesmo banco da praça onde os arruaceiros sentaram-se na noite anterior, e que eu sei que pra lá voltarão nesta noite.
Pelas janelas do meu apartamento eu vejo tudo que eu sempre quis, só não vi o assaltante passar e levar o meu tão querido carrinho, o qual eu suei muito pra pagar e ainda nem terminei. Pela janela do meu apartamento eu confesso que não vi nada disso.