Aeronáutica receia onda de indisciplina na tropa
Chinaglia quer levar Juniti Saito à Câmara
Alan Marques/Folha Imagem
O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), reuniu os líderes partidários em sua casa, na noite desta segunda-feira (2), para discutir a CPI do Apagão Aéreo e a crise militar desencadeada pela decisão do governo de negociar com sargentos amotinados. Ele fez aos líderes um resumo de uma conversa que teve com o brigadeiro Juniti Saito, comandante da Aeronáutica.
Mais cedo, Chinaglia almoçara com Saito. Levara consigo o líder da minoria na Câmara, deputado Júlio Redecker (PSDB-RS). No relato que fez aos líderes, o presidente da Câmara revelou ter encontrado um comandante da Aeronáutica receoso dos efeitos danosos que os benefícios salariais aos controladores de vôo militares desencadearão na tropa.
De acordo com o informe que Chinaglia fez aos líderes, Saito teme que a negociação com os sargentos amotinados gere um movimento de indisciplina nas Forças Armadas. Saito disse que, a exemplo dos controladores de vôo- cerca de 2.400, dos quais 80% são militares— há nas Forças Armadas (Aeronáutica, Exército e Marinha) algo entre 12.000 e 13.000 “sargentos especialistas”.
Para Saito, a concessão de gratificações aos sargentos que cuidam do controle de vôo pode disseminar nesse naco da tropa, que não se restringe à Aeronáutica e cujos contracheques encontram-se igualmente reprimidos, um movimento por melhorias salariais que os comandos militares terão dificuldades para conter. Mencionou, por exemplo, o caso de operadores de rádio, alguns deles trabalhando em condições adversas na região Amazônica.
Chinaglia informou aos líderes que vai telefonar para Lula nesta terça-feira (3). Solicitará do presidente que Saito e o ministro Waldir Pires (Defesa) compareçam à Câmara para prestar informações. Sua idéia é a de que os dois participem de uma reunião reservada com o colégio de líderes, que reúne deputados governistas e oposicionistas.
Os líderes do PSDB, Antonio Carlos Pannunzio (SP); do PFL, Onyx Lorenzoni (RS); e do PPS, Fernando Coruja (SC) insistiram no encontro realizado na residência oficial do presidente da Câmara na tese de que o agravamento da crise justifica a instalação imediata da CPI do caos Aéreo. Foram contraditados, porém, pelos líderes governistas.
José Múcio (PTB-PE), líder da bancada do governo, repetiu na reunião o que dissera mais cedo. Acha que, em vez de justificar a CPI, a crise desencadeada na sexta-feira demonstra a desnecessidade de uma investigação parlamentar. Avalia que restou demonstrado que o problema se restringe a um movimento sindical dos controladores. O líder do PDT, Miro Teixeira (RJ), antes favorável à CPI, disse que os contornos militares que a crise assumiu requerem que o Legislativo dê suporte a Lula.
Mantido o impasse, Chinaglia voltou a dizer aos líderes que não instalará a CPI antes da manifestação final do STF. Acha, porém, que, a despeito do desencontro em relação à CPI, a visita de Saito e Pires à Câmara servirá para munir os líderes de informações úteis acerca dos detalhes da crise. Ficou de procurar novamente os representantes dos partidos depois de se acertar com Lula.
Escrito por Josias de Souza às 03h11
Para acalmar militares, Lula não recebe amotinados
Presidente apóia IPM para punir sargentos insurretos
Antônio Cruz/ABr
Num esforço para tranqüilizar os comandantes militares, Lula decidiu que não irá receber no Planalto representantes dos sargentos que promoveram, na última sexta-feira (30), o motim que paralisou os aeroportos brasileiros. A audiência fora prometida aos sublevados pelo ministro Paulo Bernardo (Planejamento), destacado pelo próprio presidente para negociar o fim da paralisação, obtido no início da madrugada de sábado (31).
Nesta segunda-feira (2), Lula passou o dia tentando contornar o mal-estar que se disseminou entre os militares. Em conversas com seus auxiliares, o presidente concluiu que o problema administrativo do setor aéreo derivara para uma crise militar. O comandante da Aeronáutica, Juniti Saito (foto) sentira-se desautorizada pelo presidente. E obtivera a solidariedade dos colegas do Exército, Enzo Peri, e da da Marinha, Júlio Soares de Moura Neto. Lula concluiu que precisava dar sinais de prestígio aos três comandantes, sob pena de agravar a crise.
Foi nesse contexto que o presidente avaliou que, recebendo os sargentos que se sublevaram, sinalizaria desapreço à hierarquia. Decidiu fazer o contrário. Logo cedo, no programa semanal de rádio, afirmou que a greve dos controladores militares fora “uma irresponsabilidade.” Depois, em encontros com Saito, pela manhã, e com os três comandantes militares, à tarde, explicou a decisão que tomara na sexta-feira, a caminho dos EUA.
Lula disse aos comandantes que sua intenção não foi a de subverter a hierarquia militar. Afirmou que decidira desautorizar a prisão dos sargentos amotinados com base nas informações que recebera no instante em que voava para os EUA. Considerou, então, mais importante resolver o tumulto nos aeroportos. Repetiu aos comandantes algo parecido com o que dissera pela manhã, no rádio: "O país não pode ficar refém dos movimentos irresponsáveis.”
De resto, num claro recuo em relação à disposição do governo no final de semana, Lula assegurou ao comandante Juniti Saito que a desmilitarização do controle do tráfego aéreo civil não será feito à revelia da Aeronáutica. Ao contrário. Pediu a Saito que a Aeronáutica contribua com a redação do texto da medida provisória que instituirá o novo modelo. E atenuou um dos compromissos que Paulo Bernardo assumira com os sargentos insurretos: o de rever as sanções disciplinares impostas aos controladores de vôo. Afirmou que a revisão será feita no limite do que a Aeronáutica considerar razoável. Algo que não fora mencionado aos amotinados.
Saito ainda obteve de Lula o compromisso de que, doravante, os controladores poderão sofrer novas punições caso voltem a se insurgir contra ordens de seus superiores. E o presidente comprometeu-se com os comandantes militares a não interferir no inquérito policial aberto nesta segunda-feira (2), por determinação do Ministério Público Militar, para punir os sargentos amotinados. Para o presidente, os procuradores estão cumprindo a obrigação deles. E não cabe ao governo se meter. Acha, de resto, que a ação do Ministério Público, festejada pela Aeronáutica como um meio de restaurar os valores hierárquicos, é uma novidade que não está contemplada na pauta de negociação firmada com os controladores de vôo.
Numa das reuniões que promoveu ao longo do dia, Lula discutiu com Saito e com os ministros Waldir Pires (Defesa), Paulo Bernardo (Planejamento) e Dilma Rousseff (Casa Civil) os termos do entendimento que será proposto aos controladores de vôo. O governo confirmou para esta terça-feira (3) a reunião de Paulo Bernardo com representantes da categoria.
Afora a audiência com Lula, que será negada, e a revisão das punições, agora condicionada à palavra final da Aeronáutica, serão respeitados os termos do entendimento firmado com os sargentos amotinados na noite de sexta. Inclui a desmilitarização do controle de vôo. Há também a concessão de gratificações salariais. Os valores não foram revelados. Mas devem ficar aquém da reivindicação dos controladores.
No encontro que terão com Paulo Bernardo, os representantes dos controladores de vôo militares tentarão obter do governo o compromisso de uma anistia de Lula, em caso de condenações judiciais. O ministro não está, porém, autorizado a assumir tal compromisso. Em privado, Lula até admite anistiar, no futuro, os sargentos eventualmente condenados por indisciplina. Mas condiciona o gesto à normalização do tráfego aéreo.